Certas pessoas sacolejam tua alegria, espalham pedacinhos de vontade e o dia sombrio fica ensolarado, fica bonito nos cinzentos da tarde. Eu, transbordo de alegria: deveria ter arrumado os cabelos, deveria ter colocado uma roupa melhor, pendurado uns brincos… Passado um batom. Viver tem mesmo a presença do outro… O cheiro, a gentileza, a fala, horas de conversa solta, de tempo resgatado. Quando foram embora Ônix queria, eu queria entrar no carro, seguir estrada. Eu servi apenas uma xicara de café, sem bolo, nem surpresa. E esperei na ansiedade única de esperar… Coisas de Beth que Elizabeth M.B. Mattos não explicam neste agosto de 2023 – Torres
A vida e o tal sentimento de gratidão perverso / sentimento ‘mascarado’ que prende uma pessoa à outra. De repente, ter amado/amar virou escravidão… Difícil!
A memória tem cavernas. O tempo inviabiliza revisitar. Elas estão lá. Voltar seria remexer em sentimento vivo/esquecido/precioso. Acho que consigo escrever / inventar, fantasiar apenas os acabados / derramados e cancelados… Sentimentos do passado se atravessam dentro de objetos / palpáveis… Guardo a pedra que apenas eu sei o significado, a fita, o pincel, a caneta, objetos exóticos / específicos. O martelo, a tesoura, o podão, um alicate. Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2023 – Torres
Subi com cuidado, talvez descer seguisse sendo o mais difícil. Conversa demoradas. Ritmo ou descompasso: amor.
Ao telefone, tua voz é de menina. Tão doce que (para quem te conheceu adulta e meio grandota, como eu) pode soar até como coisa preparada, açúcar fazendo as vezes de mel. Mas a verdade é que é mel mesmo. Mel, não Fel. A rima é importante na vida. Nada melhor do que os sons casando-se entre si, aquelas terminações iguais ou similares que dão música às palavras. É preciso, porém, ter cuidado com a tentação das rimas: fel não é mel, anão não é pavão, ainda que o amor seja dor, quase sempre dor. Por digo (ou escrevo) tudo isto, quase sem pé nem cabeça? Porque desde que escrevi mel, pensei em fel. Quis dizer o oposto: quis dizer exatamente que neste momento recordo tua voz mel de guriazinha ao telefone. Displicente voz de adolescente, talvez tua forma de ser a Beth de 1962 que eu esperei (em vão) à porta do Cine Ritz, após outra longa espera na esquina Protásio e Víctor Hugo.
Hoje a Luiza atendeu o telefone. Não estavas. Percebi que era voz de menina, mas fiquei em dúvida sobre se não poderias ser tu, apenas em um tom mais baixo, com voz mais comedida, sem a habitual extroversão que dá à tua doçura um tonitroar suave. Tua voz é doce mas forte ao mesmo tempo. Nesse amor telefônico a que, aparentemente, estaremos condenados (ou condicionados), tua voz é tão ou mais importante do que tu, porque é tu mesma. Tua voz é que me diz da tua tristeza, ou alegria, ou penúria, lamúria ou riso. Preparo-me para catalogar tua voz como luminosa ou em trevas, radiosa ou sombria. Tudo pelo ouvido, sem interferência do olhar, como se a luz ou a sombra – sol ou trevas – fossem sons ou ruídos. Meus novos olhos são agora o telefone junto ao mar, que só me permiti ver o mar, sem te ver. Sinto-te pela voz. Por esta suave voz de guria, desleixada ou doce. E amada. Tenho saudades de ti. De te olhar, te tocar, sentir, enrolar-me em ti. Juntar-me a ti nas conversas e, depois, prolongá-las nos corpos juntos, colados, integrados, o magro encaixando-se à gorda. Tenho saudades de te amar.
Como nos encontramos? Onde?
Nós nos encontramos no tempo de amar o amar, naquela alegria… Sem pensar em fel ou mel, nem pavão, nem ser e estar, apenas fomos…
Esperas na porta do cinema, pipocas e prolongados silêncios naquelas sessões de domingo. As esquinas permitidas. As conversas apressadas. E nós estávamos lá. Eu distraída, tu apressado, ao mesmo tempo intrigado. Olhar importava mais do que escutar. E tocar? Pura e completa magia. Nós nos encontramos no sol, aquecidos pelas tardes de domingo porque se eu flanava, tu trabalhavas de segunda adomingo, sem mencionar plantões… O que importa / importava era o prazer com palavras, com escrever e leitura, com cochichos no meio da gritaria. Eu guria, tu
Tu te dizias adulto. Eu me demorava no azul, e tu vias as tranças de menina, e a doçura tumultuada. Depois verões, sempre estão lá, os verões, o perfume da casa e das frutas… Eu te chamei com os olhos e confirmei a dor, “ainda que o amor seja dor, quase sempre seja dor” é amor. Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2023 – Torres “só nos permitimos ver o mar,” e, voltamos aos braços um do outro.
desapareceu da bancada do tanque o ursino de pelúcia marrom / área privada sem proteção… atenção! se alguém pegou ou tiver notícias… pode devolver. o ursinho pertence ao apartamento 201 / estranho acontecimento… Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2023 – Torres
Corri tanto atrás do tempo! Escrever e ou pensar, ter o “tal tempo” necessário ou possível! Querendo / desejando / pensando Paris…, não apenas a Paris, o francês, a fala… Ah! Danadas escolhas! As nossas! E os pincéis, o traço, as cores, aquele gosto de vida e viver! Escolhas soam / definem o ideal. Debruçada no sol sinto o calor. O engraçado?! Construí a tal muralha, e, forçando a entrada escalavrei as mãos, os pés. Perdi os ídolos, aos poucos, exausta, desisti. Um dia depois do outro… Um dia depois do outro. Sobrevivi, mas isso basta? Sobreviver sem descanso? Empurrar, bater, com martelo, os pregos necessários: fechar a caixa. Corri tanto atrás do tempo!/ Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2023 – Torres, minha torre, alerta, o farol acende e apaga!
Pessoal, única, mas empacotada em outras tantas ideias! Imaginei a ideia das folhagens exuberantes, vi as flores, emoldurado… O vidro limpo, claro, limpíssimo e o cartão de visitas se transforma em luxo. Naveguei na beleza da possiblidade, neste detalhe, beleza, cuidado importa. Faz a diferença. O detalhe! E a conversa se anima! É o fogo na lareira, a beleza do apartamento, a estratégia… Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2013 – Torres