O QUARTETO de Alexandria

Alcancei um agora e uma força que me prende e me transforma. Não estou sendo racional, perco referências. Estou confusa. O sentimentos se mistura e cobre o que falta a ser entendido. Território perigoso, arenoso. As bifurcações do amor. Os atalhos. Talho. Elizabeth M.B. Mattos  –  outubro de 2017 – Torres

sofá ótima

Percebi então algo que não deveria constituir nenhuma surpresa: nossa amizade alcançara o ponto em que, de certo modo, nos tornáramos parcialmente donos um do outro.” Lawrence Durrell – Justine(p.47)

Este livro, O Quarteto de Alexandria, tão estranhamente perturbador, bem feito, intimista revelador de sentimentos indescritíveis remexe com as lembranças. Não consigo descrever/ nem contar um dia do meus dias! O tempo está passando e a memória um fatiamento de emoções: os fatos as ações elas mesmas parecem todas tão igual! E são particulares.

“- Ela não pode ser julgada de forma abrangente até que o pensamento em si possa ser julgado, pois nossos pensamentos também são ações. É a tentativa de estabelecer juízos parciais sobre ambos que nos conduzem à  dúvida.” (p.40) Lawrence Durrell

deveria ser mais simples

Deveria ser a melhor hora a do amanhecer. Deveria ser bom um dia depois do outro porque a carroça anda, as abóboras se acomodam, os cães festejam latindo. A estrada se transforma, e se ilumina ao amanhecer. As árvores conversam com a passarinhada que acorda. As flores abrem porque o sol está ali, ao amanhecer. Deveria ser a melhor hora quando o mundo se apresenta passado a limpo, liso. Perfeito. Mas nesta manhã está tudo diferente. É a história. Nem sempre o fio condutor da manhã é o melhor tempo. Nem sempre as noticia são boas, nem sempre podemos apenas seguir e sorrir. Tem dia que amanhecemos assim, estremecidos com o que vai acontecer, ou já aconteceu. Nem todas as manhãs são produtivas, nem todas as tardes nos adormecem, nem todas as noites são cúmplices. Existe o tempo de chorar. O tempo de lamentar. De festejar, e há (gosto deste verbo antigo, o haver no sentido de existir porque está no Eclesiástico, na Bíblia, e a Bíblia é o livro dos livros) também o tempo do perdão que se espreme aflito entre alívio e raiva.

A história está começando, e como todas estas estórias de vontade de escrever, não devem terminar porque o tempo de passar tem esta gota importante da exaustão, esvaziamento. O que se está pensando neste momento, pronto, completo, feito para nascer e sair de jorro já se esgota num outro segundo. Esquecer pode ser triste também, como esvaziar, como choramingar, como se queixar, como toda coisa que se coloca na balança do apagado. E a história se prepara avolumada para explodir, eclodir, nascer, e pronto, num repente termina. Ou sei lá, quem sabe se completa no imaginário do leitor. Se for a história de um menino, se pensa na menina. Tinha-se avó, se imagina o avô, se pretendia explicar abandono, se imagina liberdade. E a independência flutua sobe as ruas como festa, e era para ser solitária. Estar só pode ser mais completo do que estar com o Outro se este Outro não nos vê. Estranha história de olhar… Esta diferença, esta incógnita do olhar, do desejo de compartilhar, pode ser tão frustrante! E por isso nos dizem que estar bonito ao amanhecer, pentear, perfumar, frisar a roupa, desenhar os olhos tem que ser alguma coisa pessoal de nós para nós mesmos. Assim, todas as estórias, ou histórias se completam no leitor que atento e ativo se retrata, se pinta, se desenha, e se enxerga em cada letra. Não vou explicar porque hoje é um dia triste. Elizabeth M.B. Mattos  – maio de 2016 – sempre Torres

martelo e objetos

absolutamente feliz

…, coisa de escrever. Estou atordoada com os ventos da primavera que cantam o dia inteiro. Queria parar de fazer, queria férias, férias de mim mesma, das vozes, da respiração, deste lavar passar (eu gosto de lençóis perfumados e lisos), de cozinhar, limpar, esfregar, do vento, do sol, De suprir. Resolver, escutar, ser feliz. Sorrir, entender. Hoje deu vontade de chorar, ser triste, resmungar, deixar de fazer. Ser livre, completamente livre de todos os ranços escondidos. Não quero responder. Não quero cuidar. Houve um tempo que eu fazia tudo isso, e respirava. Hoje é diferente. Houve um tempo que eu tinha três cães, jardim, flores nos jarros, fogo na lareira, árvores, gramado, groselha e doces. Hoje é diferente.

Estou num daqueles dias que o cheiro da comida, o cheiro do pó, o cheiro do sabão, das flores, das pessoas, o cheiro da vida… Pois é, a vida tem cheiro (risos). Tudo demais. É o vento. É o vento que entra pelas frestas e fala diz canta sem parar. É a primavera resmungando. É ser feliz sem merecer. É amar sem compreender. É falar e falar sem entender. É estar o dia inteiro apenas enfiada no dia de estar contigo. E não estar. É o medo do tempo passar, medo de envelhecer depressa demais, medo de não voltar, do fim do caminho. Medo de estar tão absolutamente feliz sem compreender. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2017 – Torres

casa dois

engasgada na lembrança

Retomei o meu escrito no teu escrito. Uma dor saudade, ou foi um nada Tu és o texto maior, e eu sempre me apequenei encolhida. Agora enciumada? Não faz sentido. Amei tanto e tanto e amo ainda no depois…  Saudade do que não fiz, talvez do que perdi de mim mesma,… tu seguiste em frente, ergueste a vida. Eu larguei o amor de te amar, e era tanto meu querido! Agora fico a espiar. Não adianta espiar. A vida engolimos, ou ela nos devora. Eu preciso acordar deste torpor/dor que sinto e não defino…. Tão pouco de nós dois, mas foi muito, sempre muito… foi muito, querido. Tornei-me esquizofrênica da memória de mim mesma: o que quero e desejo agora me impacienta em seguida me cansa e já me aborrece. Eu amo este amor enfurecido de beijos e abraços que ocupa todo o meu tempo e a minha memória. Tu/o meu você.

Não sei em qual lugar esqueci larguei deixei de amar, ou de valorizar o que escrevo. Transborda agora. Ao reler teu livro, o livro que guardaste entre os teus… Eu me dou conta que a generosidade existe / se adianta / se impõe, ou se ergue acima de qualquer outro sentimento. E eu te amo. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2017 – Torres ( o período de te inventar na minha vida…JCKCAA

dois gigantes

El Misterioso, lógico fin

El veinticinco de deciembre de 1920 el curpo de Monk Eastman amaneció en una de las calles centrales de Nueva York. Había recebido cinco balazos. Desconocedor feliz de la muerte, un gato de lo más ordinario lo rondaba con cierta perplejidad. (p. 63)  Jorge Luís Borges – História Universal de la Infamia – Emecé Editores, Buenos Aires, 1954Camargo_Ibere_Signos I

Iberê Camargo

bilhete de amor

Por que escrevo bilhetes de amor? Porque me apaixono, abençoadamente, eu me apaixono, inexplicavelmente, eu me apaixono. O amor sacode pensamento estremece ciúme, acorda prazer, dá tranquilidade desesperança, e também paz. Sei que estás lá … Do lado de fora estou a envelhecer inquieta, dentro estás a te estabanar animado. Agradeço a juventude que se inclina e me abraça. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2017 – Porto Alegre

cogmelo na janela linda a foto

Ler fora sempre o seu maior prazer, e agora, na narrativa dos triunfos e derrotas dos outros, das dores e alegrias alheias, encontrava refúgio contra o espectro obsedante do próprio insucesso”. (p.73) Irving Stone – A vida trágica de Van Gogh – José Olympio Editora – 1945

sapato preto rasteiro

…., calça de malha blusa com mangas echarpe preta e sapato rasteiro. Cabelo curto, preso. Caminhei pela avenida, pela rua Padre Chagas e entrei no Moinhos, almocei. Não encontrei na Saraiva os lançamentos esperados. E o pão do Armazém me surpreendeu.

Não vi os jardins do hospital, como te prometi. Não desci pelos arrendondados caminhos. Olhei lá de cima, do quarto do recém nascido Eduardo, o Guaíba, a cidade … pensei que podias estar a ver comigo aquele céu, o lago, as ilhas. Grande perfeito o menino: aquietou o choramingo nos meus braços. O envidraçado em ângulo oferece à majestade o visual do amanhecer. No abraço prolongado de boas vindas pensei no amor. Aquele bebê chegou coroado. Olhos fechados de sono, boca solta de prazer.

…, do dia 28 de outubro de 2017, meu sogro o escritor Vianna Moog, minha mãe Anita,  minha irmã Suzana (a avó) e o menino Eduardo: todos sob o mesmo signo, … gaúchos. Elizabeth M.B.Mattos – outubro de 2017 – Torres

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Hospital Moinhos de Vento, décimo andar. Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

poeira doméstica

 

CAMILLE CLAUDEL com VERMELHO

Em 1913 Camille Claudel vai para o Hospital Psiquiátrico de Ville -Evrard – 16 de abril conselho de família.

1920 Visita de Paul Claudel à irmã. Uma carta do médico constata a nítida melhora de Camille e sugere que volte para junto dos seus. A mãe recusa categoricamente: (…)

1942 – 24 de fevereiro: Paul Claudel é nomeado tutor e administrador dos bens da irmã.

1943  – 19 de outubro: Camille Claudel falece longe dos se

CAMILLECAMILLE O BEIJO O ABRAÇO

Esculturas de Camille Claudel :

O ensinamento precioso de Rodin só despertou o que já sabia, revelando – lhe a própria originalidade […] A ciência da modelagem é igual, tanto num quanto no outro. Minha irmã não somente ás custas de um trabalho obstinado com a natureza, mas por meses de estudos anatômicos e dissecações.” (p.25)  Paul Claudel

“Eles se chamam L´Âge mûr ( A Idade Madura). Ambos têm uma uma força tal, uma tal sinceridade que beiram o terrível, ao mesmo tempo de amor, de desespero e de raiva, que ultrapassam os limites da arte onde foram realizados. O espirito, no supremo clarão que os concebeu, só podia se apagar.”(p,28) Paul Claudel

CARTA RODIN CAMILLECARTA DE AUGUSTE RODIN para CAMILLE

[…] Minha muito querida amiga, como tens sido boa e como tua inteligência me agrada. Todos […] têm algo de novo […] não é insignificante, nada de […] nem de cópia de tua ama que sinto tão bela. Por que dor estou marcado e quanto o meu erro foi grande, mas sinto que ao te ver havia uma fatalidade da qual eu não podia fugir. Ah minha divina amiga, serás feliz, tenhas paciência, tudo aqui se paga. Fui pago pelo meu trabalho, pago meus erros e minha dor contínua é um exemplo extraordinário da justiça […]“(p. 51) fragmento e carta de Auguste Rodin à  Camille Claudel 1895

o amor se explica por ele

Em qual pedaço/parte/momento,ou jeito eu me encontro comigo mesma pelos teus olhos – poetas, … tão particularmente linda a imagem que vejo de mim! Encontrar este você que és tu … um presente de doçura esquecida, afinal, existe/está em ti  … um agora para lembrar depois/ ou ainda amanhã neste amanhecer da manhã de te beijar, acarinhar. Estar na lembrança de sentir tu e você no amor de amar. Aquieto o corpo no piano, na sonata, neste lustro de tempo de viver tu e você. Elizabeth M.B. Mattos outubro de 2017 – Torres

Observando o calor benigno nos  olhos de Nessim e lembrando de todos os boatos escandalosos sobre Justine, percebi que tudo que ela supostamente fizera, de certo modo, havia feito por ele – mesmo aquilo que parecia cruel ou prejudicial aos olhos do mundo.  Seu amor era como uma pele no interior da qual Nessim se abrigava, como Hércules quando criança; e os esforços  de Justine por encontrar a si mesma, em vez de afastá -la  dele, sempre aproximaram – na ainda mais. Sei  que ao mundo não interessa tal sorte de paradoxo; mas tive a impressão de que Nessim conhecia e aceitava a esposa de uma forma impossível de explicar a alguém que ainda confunda  amor com posse.” (p.32) Lawrence Durrell JUSTINE O Quarteto de Alexandriano-chao-pouco-nitida

sofá ótima

fora do contexto

Eu te disse que às vezes sou feito trator arando … norma sem rumo ou diretriz ou regra que restringem atam … distorcem, não aguento. Pensei no amor físico na entrega, e fico imaginando que este é o lugar que não é teu/meu, mas nosso porque sem o outro não existe prazer entrega … O silêncio novo a comida nova um ar novo. O que eu faria? Leria mais, escreveria mais e olharia melhor para o verde e para o azul. Entenderia o nada, apenas olharia …veria/ enxergaria. Como no amor. Eu te escrevi para te convidar ao nada. Lúcidos não fazemos amor. Gosto de nos pensar embriagados de paixão. Loucos. Então o porquê de beber, beber até o fim até o fundo da garrafa (ler Bukowiski dá nisso) …, não eu comigo, mas nós dois. Não quero o agora que enrijece. Nunca estou num agora  … perco a vida porque sonho o sonho e quero o que passou ou o que imagino que pode ser …  Sonhos e paixão.   Gosto do artista que se debruça.

Fora do contexto, mas ainda no contexto … o corpo, o sexo, o visceral, o intenso. Tudo o mais é desordem numa aparente ordem e pacífica rigidez.

Pretendia comer camarões na beira do rio … beber uma cerveja gelada. Olhar o  outro lado  … sentir este peculiar de Torres com rio, com os molhes e o mar e as pedras e a areia … Preguiça e languidez de amar o amor. Preguiça de olhar  no olhar. Pretendia. Não fui a lugar nenhum. Comi feijão com arroz, farofa e carne desfiada …uma prosaica latinha de cerveja  … e … outro dia de ficar em casa. Nem a chuva chegou. Tudo assim desmedidamente, prosaicamente comum. Lavei os pratos, limpei o fogão, estendi os lençois aspirei o tapete. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2017 – Torres

Assim mesmo dentro do contexto e da vida. “É interessante a mudança que o amor físico opera no corpo dos homens e das mulheres: a mulher floresce em sua plástica, arredonda -se, perde as asperezas, adquire uma expressão ansiosa ou triunfante; o homem torna se muito mais tranquilo, mais interior.”(p.13) Davis Hebert Lawrence – O Amante de Lady Chatterley – Volume 33 Os Imortais Editora Abril

 

CORPO INTEIRO DESENHO

“Sem dinheiro não podemos sequer pensar …”  e “A vida interior  necessita de casa confortável e boa cozinha”. (p.40)

“Um ar de canseira nas coisas”(p.59)

“O inesperado é sempre uma ameaça”(p.81)