“Quem de nós, ao caminhar pelo campo, não foi tomado pelo súbito desejo de habitar ‘ a casa dos contraventos’? Por que a página de Rousseau é tão popular, tão psicologicamente verdadeira? Nosso devaneio deseja sua casa de retiro e a deseja pobre e tranquila, isolado no pequeno vale. Esse devaneio habitante adota tudo o que o real lhe oferece, mas logo adapta a pequena morada real a um sonho arcaico. É a este sonho fundamental que chamamos a casa onírica. […] Uma das provas da realidade da casa imaginária é a confiança que tem um escritor de nos interessar pela recordação de uma casa da própria infância. […]
A casa oniricamente completa é a única onde se pode viver os devaneios de intimidade em toda a sua variedade. Nela se vive só, ou a dois, ou em família, mas sobretudo só. E em nossos sonhos da noite, há sempre uma casa onde vivemos só. […} todo sonhador tem necessidade de retornar à sua célula, é chamado por uma vida verdadeiramente celular:
Era cubículo apenas ? Mas ali eu dormia sem ninguém. /…………………………../ Ali eu me abrigava. …………………../Sentia como que um calafrio /Quando ouvia meu alento. / Foi lá que eu conheci? O verdadeiro gosto de mim mesmo. / Foi lá que eu fui só eu, / Sem nada conceder. (Jules Ramains, Odes et prières, p.19)
Às vezes alguns degraus bastam para escavar oniricamente uma casa, para dar um ar de gravidade a um quarto, para convidar o inconsciente a sonhos de profundidade.” (p.78-82) Gaston Bachelard – A casa natal e a casa onírica – capítulo IV
A leitura me devolve a infância e vai abrindo o caminho da rua Vitor Hugo em Petrópolis, depois me carrega para os lados da rua André Poente, até a rua Santo Inácio. No devaneio encontrei Santa Cruz do Sul e Rio Pardo e a Fazenda Santa Branca, o definitivo, o completo. Explicar Torres? Torres se abre em todos os verões / verões de devaneio e de certezas certas / aquela alegria de acordar pro dia / tomar banho de mar, caminhar, areia nos pés – espiar o rio Mampituba como se o verão fosse a única estação do ano onde/quando eu dançava. E a casa onírica foi certamente na rua José Picoral, 117 – o Edifício Alvorada – e o desejo que fosse para sempre aquela posse! Elizabeth M.B. Mattos – julho de 2022 – e, eu voltei para ficar. Eu sou Torres.