30 de novembro 2022

algumas alegrias são incompartilháveis-, incompartilháveis porque o espaço entre uma hora e outra, ora, ora,…não há minuto ou segundo desocupado = sou /estou feliz!, e a chuva lava qualquer possibilidade de amuo ou tristeza. ah! a vida tem estas certezas certas! Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2022 – Torres com bastante, muita chuva a molhar os gramados, encher a lagoa e o mar…

diferençasssssssss

Entusiasmada, ou sei lá o sentimento, o de conexão, ou desjo de se aproximar, isso, conexão e desejo. Desejo de compartilhar, entender, ou apenas me queixar. sim, várias vezes quero compartilhar um desacerto, um incomodo…sei lá! Ser alguém que diz para alguém que escuta. De repente, descrevo o cotidiano disso e daquilo, positivo, engajado, ou reclamo disso ou daquilo, mas / e surpresa!, a outra pessoa responde, mais fala do que escuta: também eu faço, o mesmo, igual, como um jato de água fria, acordo…. o mesmo do mesmo pode ser assim diferente? Arrumar a cama, tirar o pó, fazer a comida, levar, e limpar… Não, não é o mesmo. Penso, pense nos espaços… Espaços definem o fazer, não apenas a rotina descrita, o intenso envolvimento define o fazer… Energias diferentes. Não estou sabendo explicar, o silêncio que existe entre duas pessoas, não é o mesmo, então, mesmo sentadas, lado a lado, olhando para o mesmo jardim de margaridas, vemos diferente. Esquisitas diferenças! Não, não se encaixa o teu fazer com o meu fazer, as percepções são tão, absurdamente, distantes! Conversar / falar com outro também pode ser assim, um diz X e o outro escuta Y… Conversar é / pode ser, uma esquisitice se… se, se, e, porque somos diferentes, o fazer das mesmas coisas pesa tão diferente! Diferençassssss e esquisiticesssss. Perplexidade. Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2022 – Torres

P. S, Talvez eu supervalorize os meus fazeres por desejar tanto e muito e tanto ser apenas servida!

sinto

sinto tua falta

a gente passa a vida a explicar o sentimento, o remexido sentimento chamado amor / desdobramos em encantamento, nas pequenas saudades, fazemos ondas enormes, possuímos imperiosamente querendo resolver a carência, abafar as faltas, resolver matematicamente os desconconcertos… queremos, afundamos numa taça de vinho, numa cavoucação no jardim, a música entra e sai, o silêncio volta, a quietude volta, eu volto para mim. Embalo, embala, embalam… e depois, depois tudo recomeça

sinto tua falta, sinto tua falta, sinto tua falta

preciso caminhar mais, encontrar as uvas, os pêssegos, embebedar a certeza que estou bem, sempre estive, e me onvencer, não me fazes falta, é uma bobagem ! um jogo! eu vou sair. Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2022 – Torres (bom da chuva forte é a ceerteza de que as calçadas se lavam e brilham no dia seguinte)

claustro / a ideia de servir /o silêncio / Beco do Carvalho

O sonho ritual / o latim, uma certeza na tentativa das teclas do piano, a preciosa rotina e tantas certezas! o silêncio e a conversa essencial com todas as mágicas de ser apenas eu comigo, e o colorido, as possibilidades de saber um pouquinho mais dos sentimentos anigos, sentimentos mansos de apaziguar, nunca tensionar. O sonho das meninas talvez fosse mesmo São Paulo e a Filosofia. A reclusão ruidosa de servir. As aulas de Teologia. As vésperas, os rosários, as missas diárias em latim. O todo da memória: a sala de música com o piano de parede, a casa da costura, a minha tortura particular. A ida para a lavanderia duas vezes por semana, caminhada barulhenta, alegre, receber as pilhas perfumadas. Roupas cheirosas, engomadas. E no tempo das pitangas e frutinhas, das amoras a divertida colheita… Se pulássemos a cerca estaríamos no mato fechado, enfiadas no mistério.

A rotina dos estudos: o pavilhão desenhado e pintado com azulejos coloridos Des Oiseaux. E nossas salas de aula, envidraçadas, arejadas. De lá podíamos ver o jardim interno dos pavilhões. Os recreios de confraternização com as Internas, Externas e Simi-Internas ao som da CEli Campello, e a música italiana e o baião. Dançavamos entre nós e com as madres. As cartas chegavam. E os Diários iam se avolumando em detalhes, os livros lidos. Alegria da alegria. Saudade. Aos domingos podíamos almoçar em casa, antes das 17 hoas deveríamos estar de volta. Lembro das chorosas, sentiam saudade de casa, dos pais, Logo que chegavam na escola chorava,. Choravam de dia e de noite. E as Madre Maria Hermínia pedia que eu caminhasse / conversasse com as novatas, mostrasse a escola, descrevesse a beleza, adaptasse as lágrimas. E as abas do hábito se movimentavam, também elas preocupadas. Eu me envolvia com a nostalgia, com a tristeza dela. Consolava minha pequena aflição, afundava nas leituras, escondia a noite nas leituras noturnas, escancarava a janela para que a noite entrasse na minha insônia. Madre Maris Stella também sofria ter saído do Stella Maris, em Santos, lá cuidava das séries inicias – as gaúchas eram diferentes das paulistaas! Ah! As diferenças! Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2022 – Torres (repassando o passado)

no sofá

Tanto tempo não nos visitávamos! Sentei no sofá de onde posso ver os verdes e o céu. Ela trouxe um cálice de vinho, um copo com água, frutas secas. O apartamento é impecável, decoração cuidada: quadros enormes, vasos importantes, alabastros, mas estranha impessoalidade. Ninguém vive naquele salão / naquela casa. Heloisa senta, olha feliz para mim, depois inquieta, depois intrigada, num sobressalto, fala. Pensei, será que posso mudar a vida? Respondo de imediato: sempre se pode. Mas, por quê mudarias agora? Largaste tanto de tudo por este homem! Estás nos túneis da vida dele, a respirar os desvios… Já é a tua vida. Agarraste a vida dele, e assim, entre idas e vindas, já tens o livrinho de colorir completo, cheio, bonito… O mundo nas tuas mãos, sim, ou será nas mãos dele? Não é limite, minha amiga, mas escolha. Entraste. Por que sairias agora?, por capricho? Ou recomeçar? Sei lá Heloisa. Sei lá. Tens razão. A cada recomeço nova / diferente vida. Por que não? Mas, não te iludas, se tu sais, ele fica, não chora, segue… Ele não desarruma nem o fio do cabelo. Aceita tu ficares, aceita tu ires. Por que não te acomodas? E ficamos a conversar sobre recomeçar, parcerias, casar ou separar. Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2022 – Porto Alegre –

revisão novembro de 2022

Acordar assustada, no meio do caminho, significa que ela dormiu no meio do caminho, ela, simplesmente, dormiu. Há uma lacuna. Fadiga, ou alucinação.

Voltar no tempo, presa, amarrada. Assim, surpresa… No hoje, circular vaidade, ou expectativa?

Bebe o café, acalma o corpo. Enche a caneta com tinta preta, os dedos ficam levemente manchados, escreve no caderno: Colégio Nossa Denhora das Graças – Cônegas de Santo Agostinho . As Madres.

Decidido, iria para o internato, as lágrimas impressionaram Madre Paulina. Aceitaram a menina que morava em Porto Alegre, da excessão, outras vieram, como a Lala e a Zênia, Cristina, Marta. Éramos poucas portoagrenses, muitas de fora. Eu me sentia recompensada. Teria as minhas histórias de colégio como a mãe que estudou em São Leopoldo no Colégio São José. Como minhas irmãs que estiveram internas no Colégio Americano em Porto Alegre. Ah! Eu tocava / materializava a felicidade.

O enxoval incluia, além dos uniformes, camisolas: lindas! De algodão / cambraia branca, rosa, amarela e azul. Muitas! Duas abaixo dos joelhos, e, as outras, mais compridas, na altura dos pés. Chinelos de couro pintado. Tênis branco. Um sapato de verniz. O bordado inglês segue movimentos variados conforme decotes e abotoados. Lençóis macios, brancos. Dois travesseiros. Cobertores eram mantas coloridas, e uma colcha toda branca. Livros permitido: uma caixa. Entusiasmada acolhendo sugestões eu fiz a seleção acatei sugestões da mãe elucidando a importância deste ou daquele autor, essenciais. O pai sugeriu biografias, ponteiam a história e caminham na geografia. A biblioteca da nossa casa era separa das salas por um biombo precioso, pintado /desenhado em nanquim de Glauco Robrigues representando A Lenda da Salamenca do Jarou. Imponente biblioteca aquecida por uma lareira em lambri mármore. As estantes, em louro separadas e decoradas com lambri entalhado, rosáceas, iam até o teto! A pequena escada de quatro degraus me ajudava. Os livros de Direito ocupam a parede principal, e a Revista Forense com lombada vermelho, tinham letras doradas, as iniciais do pai R.M.B. Mattos. Sentiria saudade dos livros, e da aventura: Eça de queirós. Gilberto Freire, Dionélio Machado, Vianna Moog, Graça Aranha, Euclides da Cunha, Antônio Tores, o teatro de Paulo Hecker Filho, Érico Veríssimo, Alcides Maia. Enciclopédia. Dicionários, e, as revistas de decoração da mãe, em estante especial. Difícil seleçao. Na caixa foi Charles Morgan, W.Somerset Maughan, Thomas Mann, Guy de Maupassant, Georg Sand. Audaciosas leituras para uma menina, Tanto devorei livros! Muitos sem entender exatamente, atropelando, voltando. Riscando (para escândalo de minha mãe) e acertando, como dizia meu pai: faça fichas. Coloque as datas das tuas leituras. E voltes e voltes naqueles que fascinam.

A ida para o Internato, uma conquista pessoal, meio a lágrimas: teria, finalmente, um quarto só para mim, meu quarto, minhas coisa entendidas secretas, e a independência presa/pendurada nos horários obedientes. E toda a altivez das Madres francesas. Educadoras que nos preparavam para a Filosofia. Aulas de piano e solfejo, jardinagem, costura, culinária, cerâmica, desenho com Madre Santo Ambrósio. Caberiam minhas leituras…E o silêncio da mata. Os eucaliptos. ah! Eu estava/era/fui feliz. Gostava dos aventais fechados, como vestidos de verão: blusas brancas, impecáveis. E meias brancas, sapatos pretos. As saias com pregas largas de lã. As passadeiras que da cintura iam para os ombros e finalizavam atrás, permitiam identificar pelas cores a série escolar, o ano que estávamos. Verde, azul, amarelo, branco com risca vermelha, branca (acho que esqueci algumas).

o bule

O BULE

O bule de chá vermelho.

O desejo de consumir me persegue: formato, cor, o bule branco inspirado no Buda. As canecas pequenas: folhas de chá flutuam sobre escultura, reproduções de Buda. Sinto o perfume da erva…

Ontem de tarde sai com a ideia de comprá-lo: examinei, olhei e larguei. Pensei nas xícaras, onde eu beberia o chá depois da infusão? Entrei na loja ao lado… Comprei fronhas, uma vermelha outras brancas. Em casa recostei-me.

Hoje acordei pensando outra vez no bule vermelho. Contabilizei. Não posso comprar pelo simples prazer de olhar… O formato? A cor, ou o desejo de beber chá? Não sei exatamente. Pensei no bule branco com o Buda… Peça exclusiva, tu me disseste, sem te sensibilizar com o meu olhar de cobiça… Olhar aguçado para o interior do objeto. Não apenas cor, formato, utilidade, mas antes de tudo, beleza. A matéria sustenta a forma, como o olhar persegue o belo.

Os bules de chá…

Claustrofóbica, sem acalmar a sensação de peso, aborrecimento que sentia sai outra vez. Não fui buscar o bule, queria ir ao cinema. O filme francês. A sessão já tinha iniciado. Dei meia volta, entrei na livraria. Separei três livros: pensei nas contas, comprei apenas um.

De volta ao quarto. Estiquei as pernas, e comecei a folhear o livro Entre Nós de Philip Roth: conversa de um escritor com seus colegas de trabalho. Iniciei por Mary McCarthy, correspondência. Depois, Conversa em Londres com Edna O’ Brien. Mulheres. Instinto ou magnetismo? Roth inicia descrevendo a rua, o prédio e depois o lugar onde ela vive.

“No escritório há uma escrivaninha, um piano, um sofá, um tapete oriental de um tom cor-de-rosa mais escuro que o papel de parede marmorizado, e pelas janelas à francesa que dão para o jardim vê-se uma quantidade de plátanos suficientes para encher um pequeno bosque”.

Volto a visualizar o bule de chá vermelho. Mentalmente o coloquei sob uma mesa imaginária naquela sala. Na descrição Roth ainda cita a famosa foto de Virgínia Woolf. O volume de obras completas de J.M. Synge aberto no capítulo de The Aran Islandme. Menciona um volume da correspondência de Flaubert aberto numa carta para George Sand. Em seguida cita uma epígrafe escolhida pela autora:

“Antes de mais nada, quero dizer que não perdoo ninguém. Desejo a todos uma vida atroz nos fogos do gélido inferno e nas gerações execráveis que hão de vir”. Malone Morre, livro de Samuel Beckett que li neste verão em Torres… Diz ele que não encontra esta aspereza na sua obra. O’Brien justifica e explica.

“Quando tenho uma explosão, depois me sinto na obrigação de ser conciliadora. Isso tem acontecido ao longo de toda a minha vida. Não sou uma pessoa naturalmente dada ao ódio implacável, como também não sou uma pessoa naturalmente dada ao amor incondicional, e em consequência disso muitas vezes entro em choque comigo mesma e com os outros!”

Logo a seguir.

“Eu reclamo da solidão, mas ela me é tão cara quanto a ideia de me unir a um homem. Já disse muitas vezes que gostaria de dividir a minha vida em períodos alternados de penitência, gandaia e trabalho, mas como você certamente compreende isso não funcionaria muito bem num casamento convencional.”

Senti o prazer da leitura…

De forma direta a escritora irlandesa reforça sentimentos que eu conheço.

Somos todos tão iguais! Ou nos buscamos a cada nova leitura?

Esqueci por um momento o bule de chá vermelho.

Estou no escritório de Edna O’ Brien em Londres, escutando a conversa.

Volto a te escrever amanhã.

Elizabeth M. B. Mattos – 2012 – Porto Alegre