pelo menos sonhar

[…] este dia de sol traz / arrasta o calor da estação. O vento escabela e salpica de sal meu rosto. Os olhos ardem, mas o nublado é interno, na alma. Esfrego / reviro o tempo acovardada. Acomodada na memória com  a preguiça e a gentileza que a idade permite. Inteligência desmaiada inquietude curiosa  e infantil. A juventude arrasta evidências, fatos e se acomoda nas pequenas realizações transparentes. Enumero o prazer de trabalhar atrás das câmaras, de escrever para a Revista Globo. Colar figurinhas, brincar com moda em bonecas de papel, e correr …, eu pensava ser eu por inteiro, era metade. Sombra  diminuta. Tanto sol e vontade alegre! Desta alegria tenho saudade. E de Torres da Tatuíra e da Marisco. Das cartas. Das mesas espalhadas pelo SAPT a nos acolher nas férias de verão. Dos filmes e das cadeiras soltas no salão. Dançar. E tudo a rimar com coração. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018 TORRES azul.

[…] a atmosfera é de um azul-marinho muito escuro; as cortinas se agitam; nos quartos. as lâmpadas se acendem para serem apagadas logo depois, deixando atrás de si um rastro alaranjado que brilha nas reminiscências da melancólicas, misturadas a um sentimento de culpa que esse rastro acabará despertando na memória, quando ela retornar  a essas mesmas janelas e essas mesmas imagens … Nossas vidas são muito curtas, nunca vemos muita coisa, e sabemos menos ainda. Pelo menos, então, devemos sonhar.(p.243)  Orhan Pamuk O Livro Negro

jasmimmm na ruaaaaaa

Marina e SUZANA

Não consigo festejar, nem carregar o bolo, nem levar balões! De repente não sei fazer nada …, mas quero que o meu carinho e a minha festa chegue logo! Parabéns! Feliz aniversário! Atrasado. O dia 28 de outubro com enorme significado: minha mãe Anita, minha irmã Suzana, e meu sobrinho neto, o EDUARDO, e até meu sogro, o Vianna Moog. Todos no dia vinte e oito de outubro! A MARINA, minha sobrinha, afilhada  chega no dia seguinte, no dia 29 de outubro para segurar/coroar os aniversários com alegria, bom gosto, charme e amorosidade! Feliz aniversário! Parabéns aos meus queridos! Elizabeth M.B. Mattos

quando eles viajam

Penso no que fiz e o que deixei de fazer, nas escolhas. Surpresa pelo caminho. O acontecido …, os desvios, os percalços. Livre outra vez de paixões. Isso descreve o envelhecer, o avesso? Eu de natureza tão inquieta …, agora silenciosa. Cartas da Luiza, cartões da Joana e a correspondência da Ana Maria e do Pedro. E fotos. Em séries, em blocos. Sempre viajo na viagem deles. A lembrança de cada filho a particular aventura pessoal carrego na memória. Vou até Berlim pedalar. A Worms para recomeçar, internalizar, crescer e aventurar. Alemanha importa. Não deixarei de caminhar em Roma, e nem de passar pela costa italiana.  Ir a Modena visitar o Marco, e fazer compras em Milão. Com a Joana para a África do Sul e estarei absolutamente, completamente, colorida. Nos Estados Unidos de passagem, nem tão pouco assim, mas certamente New York Washington. Aonde foi mesmo que a Luiza morou? Não irei a Califórnia. Depois, estarei/ficarei apaixonada pela Escócia. E vou querer não voltar para casa. Limoges e Paris e estudos e amigos. Então penso no Francisco Antônio e na Itamara. Na Garagem de Arte, no Stockinger. Sempre vou dizer obrigada por ter voltado a França. Iremos rumo ao Mont – Saint -Michel e Dinard e Dinan, … a viagem foi corajosa. Claro, estaremos no 31 décembre  2001 em Paris. Dormiremos uma noite em Chambord, e vou esquecer meu chapéu.  Provarei o meu primeiro boeuf bourguignon em Versalhes a convite de Claude. Engraçado não saber geografia. Atrapalhada e distraída. Memória afetiva ajuda, tristezas desaparecem …, mas não esqueço Limoges e o Dourado daquele verão. E nem de Juliette, e seu enorme cão amarelo. Fotos, onde estão? Tirei poucas fotos! Vive muito muito e muito. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018

Menue

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criança

“Saudade e solidão. Saudade, solidão e desejo de uma vida de aventuras. É melhor nascer na África, onde há leões, canibais e tâmaras. Por que as pessoas vivem amontoadas? Há tantos espaços vazios no mundo, e todos ficam se apertando na cidade. Seria bom morar um pouco no meio dos esquimós, dos negros ou dos índios.[…] Também seria bom cada um ter um pequeno jardim na frente de sua casa. Para plantar canteiro de flores, regá – las, vê – las crescer. Voltou a pensar  em Malhado. ‘ O que vou dizer a Roberto?’ Já não tenho tanta vontade de ficar com ele. Vai me dar dores de cabeça. […] É uma responsabilidade grande demais ficar tomando conta de uma criatura viva.” (p.159-160) Janusz Korczak Quando eu voltar a ser criança

  • Tu es seul à Hiroshima? …ta femme, òu elle est? (Tu estás sozinho a Hiroshima? … tua mulher, onde ela está?)
  •  Elle est à Unzen, à la montagne. Je suis seul. (Ela está em Unzen, na montanha. Eu estou sozinho.)
  •  Elle revient quand? (Ela volta quando?)
  • Ces jours ci. (Nestes/ por estes dias agora.)
  • Comme elle est ta femme? (Como ela é, a tua mulher?)
  • Belle. Je suis un homme qui est heureux avec sa femme. (Bela/bonita. Eu sou um homem feliz com sua mulher.)
  • Moi aussi je suis une femme qui est heureuse avec son mari. (Eu também sou uma mulher feliz com seu marido.)

Marguerite Duras –  HIROSHIMA MON AMOUR

Como adultos perdemos o rumo da verdade absoluta, de dizer o que é como é, e nos enredamos em pequenas omissões, ou mentiras insinuantes porque fáceis, e se apresentam justas, objetivas e claras. Depois de muito tempo …, muito tempo eu me encontrei com uma pessoa que poderia fazer a diferença, então, nós nos dissemos a verdade. E foi um alívio! Porque as pessoas existem/são independentes de amarras e de outros elos. Nós somos e temos o direito de ir, voltar, ficar. Reafirmar ou negar. Não há motivo para esconder. E um beijo, pode ser apenas um beijo. Um amigo é para toda a vida. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018 – logo vai fazer dois anos que ele morreu, mas eu ainda estou aqui. Absolutamente livre, completamente comprometida comigo mesma. Mas, talvez se passe muitos anos para que eu possa dizer, outra vez, a verdade …. e não precise insinuar ou representar ou …

o passado agora – manequins

Num passado distante, todos juntos, tinham vivido uma vida que fazia sentido – mas depois, por algum motivo desconhecido, tinham perdido aquele norte, da mesma forma como perderam a memória. Toda vez que tentavam recuperar aquele sentimento, perdiam -se nos labirintos da memória, infestados de teias de aranha, e vagavam pelas vielas escuras de suas mentes procurando em vão o caminho de volta, sem jamais encontrar a chave de uma vida nova, perdida no poço sem fundo das lembranças; sentiam os tormentos que padecem aqueles que perdem sua casa, seu país, seu passado, sua história. A dor que sentiam por se encontrarem ali perdidos e longe de casa era tão intensa, e tão difícil de suportar, que preferiam desistir de lembrar – se do mistério, do sentido perdido que tinham vindo procurar, e resignavam -se a esperar a passagem da eternidade num silêncio paciente.” (p.226)  Orhan Pamuk  O livro negro

E hoje a verdade se dilui na juventude de amar:

Não queres parceiros viáveis, queres manhãs sedutoras cheias de perigo. 

Não é verdade. Espero/busco o companheiro/amigo que me traga a leveza das manhãs.  Que seja o que não consigo ser. Que me devolva a ordem, o metódico, algumas certezas pequenas, outras inteiras. E me faça rir. No entanto, é verdade: estou habituada a levantar na minha madrugada, dormir no entardecer. Abrir as janela de noite.  Escutar música. Espero tão apenas um carinho, uma voz, uma história, tudo o mais eu já tenho -, que exagero! Claro que não tenho tudo, tenho o necessário, o mínimo e falta tanta coisa, ou nada …, mas não é o caso de enumerar o que não tenho. Ou o que falta. Responsabilidade pendurada de ter ou não ter, acertar ou errar, ter permitido ficar, ou ter fugido. Responsabilidade minha, a vida. Esta vida do jeito que tenho. O necessário cinzento, outras colorido. Sou eu. Quero repartir/dividir a alegria de ser hoje quem sou /  ou rir do que não foi, chorar nos teus olhos. Por que não posso? Sem queixas, com queixas, amuada ou feliz. Ninguém deveria se permitir parar. Vou investigar. Seguir teu conselho. Vou trabalhar. Ousar. Beth Mattos – assim, quando novembro chegar esquecerei a idade de envelhecer, e vou brincar de ciranda. Outubro de 2018

encurtamento do elo

A fraqueza de um homem que está envelhecendo é o encurtamento do elo que liga as palavras em sua cabeça e as que estão em sua língua. O que parece fácil objetivo se complica, alonga. E a mistura com palavras maldosas insinuantes, aparentemente, corajosas, é o sopro do lobo. O desencontro tem feitiço invejoso, eu me dei conta que o afastamento não foi erro meu, exposição minha, inclinação acessiva, absolutamente. Uma  conversa telefônica maluca a me contar traições e …, e falar falar falar, nem saberia repetir,  me deixou súbito mansa e boba …e, confessei  interesse descuidado por A. o que resultou temporal e impossibilidade, indiscrição … excesso de exposição, ou mínima exposição, o fel da inveja risonha! Bem, confesso. Não me interesso mais nem por ela nem por ele, nem por eles. Logo será o verão, e apenas os amigos amigos importam, não projetos. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018 – Torres

ainda preso amarrado intenso

Tu ainda estás comigo. Visitas noturnas, diurnas, sombreadas esmaecidas para soar e rimar.  A mão na minha mão. Este jeito ajeitado e desajeito que escolheste para pular a muralha do tempo …, ainda estás comigo. Vou te segredar a verdade. Aquela escondida. Eu não me importo nadinha de nada que me fujas, que me escapes, porque estou contigo. volto contigo na tua pequena viagem, escondida para te espiar nos teus fazeres. Vou volto contigo. Em Torres nos banhamos e ficamos quietos ao sol. Gosto do beijo da areia e do teu jeito de olhar, pelo lado. Acabamos voltando para o quarto. Vou usar o teu nome e desenhar o despedaço desejo de acordar no teu sorriso, na hora que me escapas do travesseiro porque amanheceu… bruxarias feitiços e a boa cozinha, tuas risadas puídas, amorosas. Dois dias juntos sonata valsa canção e silêncio, só beijo. De manhã o perfume das rosas e dos cravos transformados em jasmins nos fazem chorar. Não te importa, meu querido. Sou tua. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018 – Torres

“Durante toda a noite pesadelos circulam pela minha cabeça como a água pelas guelras de um peixe. Quase de madrugada acordo para descobrir que a casa não foi reduzida a cinzas nem fui abandonado em minha cama como um doente incurável. ” (p.251) Philip Roth in O professor do desejo –  o que mais gosto de nós dois é o desastre do desencontro a cada prazer: tudo novo, inventado, resgatado e engraçado, apenas de nós os dois, sem cartilha: ” a beleza, agora, reina no escuro” e somos o “artesanal pueril gostoso e insperado”. Tuas falas se aprofundam no meu silêncio curioso …, tudo é ainda aprendizagem contigo.

 

nova esta vida lenta laboriosa e quieta

Deves perfumar limpar catalogar a beleza do espaço-casa que definiste/idealizaste como teu. Posse completa com sabor/gosto de mel. De modo estranho/vago, fico a pensar na minha na tua e na dela …, vidas. Complementar. O tempo de viver se esfarela neste é meu, é teu, é nosso, era. Foi meu, não será mais, ainda é …, ou não. Lamentável! Não serei/será. Nem teu, meu nem nosso. Imaginação, quase um equívoco. Finalmente chegaste/voltaste para dentro da vontade gulosa de querer e possuir. Eu posso. Poder tem raízes, floração e desdobramento. Absolutamente eu. Por que te escrevo estas coisas? Pura e absurda inveja. Simples assim. Eu, eu te invejo tanto, e muito, desarrazoadamente. Ás vezes saio de dentro da minha desordem tão particular e absoluta, quase que absurda e fico a imaginar como seria ser outra pessoa noutro lugar, e feliz do jeito e maneira que és feliz. Com esta alegria toda eu te vejo debaixo do toldo, regando plantas, abrindo e fechando venezianas para o céu, arejando o perfumado refúgio que escolheste para envelhecer. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018 – Torres

um dia

viu pelo rabo do olho, uma sombra passando. Não era nenhuma sombra, ele logo viu, ” (p. 75) Virginia Woolf ORLANDO 

E isso acontece todo dia quando me distraio e volto a pensar em ti. Sim, e não te conheço. Todos os dias um exercício, e a memória vai e deixa de me perseguir. Caminho. E vinte anos se diluem… Descompasso. Elizabeth M.B. Mattos – Torres – 2018