sei lá?! sem receita. vou a esticar a corda com ânimo, ou desânimo, firme, ou nem tanto… acredito, ou espero, como posso dizer? a surpresa de um abraço, o olhar sorridente da calçada, o trabalho, o ciclista, o empenho… não tem receita, mas desafio. eu comigo mesma, solta e fixa num remoto desejo, ou vontade, ou coisa de nascer com a pessoa, vontade de viver… como bebê: do conforto encara a coisa de respirar, de sugar, e faz acontecer. sei lá. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Porto Alegre
talvez a vida seja o meio termo. não voltar ao passado. o sorriso da memória. um quase nada, a risada. não posso voltar a ser, sim, sou passagem…
Acorda o sol. A noite se acalma. Ah! O desastre da chuva intensa. Silêncio agora.
As leituras se agitam, querem se aproximar, mas a rapidez e a labuta do dia impedem a quietude necessária / desloco o jeito de estar, sou outra. E os dias passam acelerados, posso dizer frenéticos? Fujo das palavras / das letras e vou derrubando o tempo com ansiedade. Preciso cozinhar, sentir o cheiro das frutas, comer o feijão e temperar o fazer, vês, não sei descrever o que sinto, não sinto, desisto.
As vitrines me encantam, mas lojas fechadas, tantas. Escasso movimento nas calçadas / assim mesmo um certo charme reage, segura o passado… Outros tempos! Reconheço, visito alguns lugares perdidos: a padaria, o restaurante heroico, o supermercado enorme (canso), aquela farmácia, lojas de móveis. E vou correndo os olhos: imagino.
Tenho que voltar a escrever, forçar o tempo, reagir. Reconhecer. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Porto Alegre
Passou o aniversário, aventura apenas começou… Evento / estória se entendem/conversam com a chuvarada do Rio Grande do Sul. As lavouras agradecem, talvez não. Exercício do cinzento… Haja espanto alagado e rua a transbordar. E susto querendo sol. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Porto Alegre se movimenta.
La vieillesse renouvelle la terreur a l’infini. Elle ramene l’ être sans finir au commencemet. […] La terreur au bord de la tombe est divine et je m’enfonce dans la terreur dont je suis enfant.
Morrer é infinito. Morrer é para sempre / nascemos morremos no infinito sem limite da maternidade: envelhecer renova / fortifica / esclarece / se faz entender o terror desta maternidade e da morte. Georges Bataille Ma mère
Pressa para assimilar ou passar ou ler / reter / esmiuçar o sentimento de cada palavra, a orgia dos parágrafos, os desenhos obsessivos de sentimentos contraditórios ou alucinatórios. A ideia de viver do eterno e desta maternidade imposta / necessária. Eu nado, eu existo, eu cresço, quero ser eu, quero mundo aberto. Na verdade, a vida presa ameaça, esbravejo, fujo. Agarro os pincéis, os lápis: escorrego pelas cares. Desenhos corações abertos, raízes, flores, as pedras interferem… Este gosto de morte em cada passo explica o eterno / o absoluto do túmulo. O sorriso interfere. Não adianta morrer, estará mediando a lembrança. Não sei se é meu ou se tem dono, ou solto, a disposição, existe para os outros… Solto respira. Enquanto respira se faz mão, corta o umbigo / serão dois, ou parte de três / ou cada um , cada um…o mundo.
Empilho desordenada mil livros, mil possibilidades, serias as conversar sobrepostas? informações, ou vou deixar descer o fel, a incerteza, o azul do céu amanhecendo, o tempo. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Torres
Sempre que encontro o livro na estante, lembro de ti. Memórias visuais, costuradas pelas leituras… Quando estiveste hospedado em Torres, depois da nossa ida a França. Leste, lá em casa, naquelas semanas de mar na rua José Picoral A flor da Inglaterra de George Orwell. E com ênfase sublinhaste que eu gostaria da leitura. Estavas ainda hóspede, ou em Bagé. Ou foi quando terminaste de escrever teu livro (que nunca me deste para ler)? Sem precisão. Talvez a bebericar um uísque, fim de tarde, na galeria quando as leituras iluminavam os quadros. Em várias ocasiões mencionaste o livro. Não este volume que tenho nas mãos. Este novo, sem riscos, sem meu nome, edição recente, editora Companhia das Letras, devo ter encomendado para resgatar as conversas e adivinhar o ‘vais gostar de ler’. A curiosidade de saber /adivinhar o que o outro pensa ou adivinha… A ideia de compartilhar o gostar. Exatamente qual volume, qual livro esteve nas tuas mãos? Deves tê-lo guardado. Em qual estante? Memória…memória, ou vivência, ou estar perto… Conversas inacabadas aconteciam em jantares, vernissages, naqueles churrascos de boa carne na tua casa, retomamos o assunto, “se leres, vais gostar”. Deveria ter te perguntado o porquê. Eu, escorregadia, sem perguntas diretas, escorregava numa libidinosa história, e me escondia no medo, no envolvimento labiríntico da intimidade… Bem! Que bobagem colorida!
Estou a te escrever porque comecei a ler o livro. Vou ler. Estou gostando. Estás comigo a rir e satisfeito porque estou lendo. Se ainda lembrares o motivo / tua lembrança diz / conta desta certeza afirmada. Saudades tuas. Oxalá escrevas. Um beijo. Vou ler e pensar em ti, pensar no que possivelmente você pensou. Elizabeth M. B. Mattos – setembro de 2023 – Torres
Escuro / claro entre frestas: obscuridade. Obscuridade cinza, larga e livre. A obscuridade deixa o medo seguir sem impedimentos, então, eu vou, eu sigo. Inconsciente do certo ou do errado, vou fazer acontecer o outro dia, e caminhar… Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Torres
Amor e aconchego! Solavanco na estrada, na curva, e o susto. Segurar a gritaria… Olhar outra vez. Pacificar. Como e por quê? Explicações rolam. Agitação também, não vejo o semáforo. Como eram / o que diziam as placas? Não enxerguei. Tão cheia de lágrimas! Rio, oceano, ou lagoa, não sei mais… Elizabeth M. B. Mattos – setembro – Torres
Dormir o sono do sonho. Sonhar a estranheza do corpo. Entender a expectativa estranhada… De vagar, com vagar: vida. Os caminhos atropelados, duvidosos, precários. Sem medo, forço o sonho e a realidade cruza a verdade e a mentira. Não posso interromper. Sonho outra vez… Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2023 – Torres