Roland Barthes

“Vejo fotos por toda a parte, como todo mundo hoje em dia; elas vêm do mundo para mim, sem que eu peça; não passam de ‘imagens’, e seu modo de aparição é o tudo-o-que-vier (vou-tudo-o-que-for). Todavia, entre as que foram escolhidas, avaliadas, apreciadas, reunidas em álbuns ou revistas, e que assim passaram pelo filtro da cultura, eu constatava que algumas provocavam em mim pequenos júbilos, como se estas remetessem a um centro silenciado, um bem erótico ou dilacerante enterrado em mim mesmo […] e que outras, me eram de tal modo indiferentes, que a força de vê-las se multiplicarem, como erva daninha, eu sentia, em relação a elas uma espécie de aversão, de irritação mesmo; (p.31-32)” Roland Barthes A Câmara Clara

Fotos intrigam… Viagem longa e cheia de percalços! Bom seria a lucidez, mas ninguém tem clareza. Oscilamos e nos surpreendemos… Busca -se a tal beleza, o tal momento, a tal memória, o passado. Ou um instantâneo feliz… talvez trágico? Um rótulo. E hoje, mesmo as fotos, são raios de luz efêmeros. Olhamos no mesmo momento e a imagem saturada de sugestões se dilui… Ah! as milhões e milhões de caixas se tivessem nascido para existir, mas são um jogo que acende e apaga alucinada fugacidade… O que são fotografias? Elizabeth M. B. Mattos – maio de 2024- Torres

leal inofensivo

Tudo misturado: cólera, amor, desprezo, nobreza e grosseria. Sentimento machucado. Em todos os lados, motivos. É tão forte! Não há como explicar o sentimento, ao caminhar eu espalho pelas calçadas, no gramado, no asfalto… O que exatamente? Como posso explicar ou responder ao carinho, entender. Escutar a voz. Não vejo o sorriso… Volto desanimada para o esconderijo, espio pela fresta. As frestas definem tanto!

Escutei tua voz. Reli tua carta. Eu me emocionei. Chorar não resolve. Endurece ainda mais? Estender a mão e aceitar teu socorro. Agradecer a dedicação… E tu não desistes de mim. Porque te amo não poderia desistir. E depois o dia estava cheio de sol, o sol do inverno, aquela luz que traduz… Estou assim, travada, trágica. Como eu reagi? Comecei a limpar a casa, encontrar o perdido, lavar a roupa, esticar os lençóis, e pensar no dia seguinte, existe este amanhã – o dia seguinte mais gentil. A tal gentileza que deixei escorregar, vou correr e agarrar, segurar melhor para poder olhar nos teus olhos e dizer, obrigada. Obrigada. Elizabeth M. B. Mattos – maio – 2024 – Torres – um beijo

treme

de tempos em tempos a terra treme / e /não se sabe o significado nem do que dizemos: todos falam e gritam ao mesmo tempo… somos a estrela no fundo num poço / o brilho da terra. nem sempre se pode ver. eu corro, mentalmente, ao teu encontro. estico minha mão… ah! estes amados amores! Elizabeth M.B. Mattos -maio de 2024 – Torres

vestígiosssssss

passados tantos anos, viramos vestígios do que um dia fomos / a gente até se reconhece na rua (às vezes) – mas a surpresa dos (nos) olhares dizem (falam), mostram que o reconhecimento é duvidoso. muitas vezes não temos certeza / afinal, se passaram, no mínimo, dez anos ou vinte anos… engraçado isso. comprado pão, eu apressada, como sempre (embora não tenha hora marcada, e ninguém a me esperar) ele com o pão já na sacola. um olhar surpresa, será? Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2024 – Torres

se quebra

Como se explica um poderoso sentimento – amor, uma forte relação, cheia de certezas, como pode, de repente, quebrar… Quebra pelo gasto, abuso, ou apenas termina. Sentimento pisoteado atravessa um desvio aqui, um empurrão ali, um esquecimento, uma deixa ver como fica… uma decepção. Um nada que a gente não explica. Se fosse água seria a última gota. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2024 – Torres

joelhos

joelhos, fresta de janela, louça empilhadas, nariz gelado: lista de estranhezas e presenças. maio e as noivas choramingam, onde estão as flores perfumadas das laranjeiras? eu só penso em joelhos, frestas, frio e louça empilhada. Elizabeth M. B. Mattos – maio de 2024 – Torres