Where is a will, there is a way

Máxima de Hudson: Onde há uma vontade, há um caminho.

A vontade brinca e sofre, ela nos dá tarefas e dificuldades, devaneios de heroísmo e de medos. Mas, por mais diversa que seja em seus impulsos e em suas façanhas, vemos que ela se anima a partir de imagens espantosamente simples e vivas. (p.185) Gaston Bachelard A Terra e os Devaneios do Repouso

Devaneio / vontade de repouso, terra: paz. Espirito estufado de encanto, de vontades e labirintos. Uauuu! Importa estar vivo e o amor brota dentro de uma visita amiga / de um sonho de estar sempre junto, este nunca ir (já tendo ido) -, este voltar e verificar. Beijar, abraçar, e sonhar numa conversa comprida, sem hora e cheia de expectativa… Coisas da vida de um verão quente! De uma noite bonita e dias alegres. É isso respirar! Elizabeth M.B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres (expectativas) Um feliz aniversário, balões e vontades coloridas, eu desejo, meu querido. Ainda em tempo, arrastando o tempo, antecipando. Um beijo.

TEMPOS MODERNOS

A travessia foi longa. Ninguém indaga de onde veio. Mal sabe os nomes do pai e da mãe. A história individual é uma mancha inexpressiva na paisagem do cotidiano. Somos todos narcisos. Vestidos de jeans, de camisetas que trazem inscrições estrangeiras. Cada qual um deus banal com andrajos, a pregar beleza e exigir aplausos. O mundo é o nosso espelho d’água. Refletidos na poça de lama, excedemo-nos na avaliação dos nossos méritos e perguntamos:

– Afinal, espelho meu, quem é mais belo do que eu?

A cada dia há que dar provas de engenho. Ao amanhecer livramo-nos dos farrapos, a que a vida nos condena, sem esmorecer. Ando pelas ruas com o coração em sobressaltos. Em busca daqueles arranjos humanos que denunciam o esforço feito e vencido. Para isso dispenso a tirania da estética, da absorção de modelos oriundos de uma visão fetichista dos objetos. Entrego-me modestamente ao difícil paraíso da emoção. [p.106] Nélida Piñon o pão de cada dia fragmentos

coisas ditas e pensadas / reconhecimento, encontro. paz de certeza

COMO ENSINAR É NÃO ENSINAR

Viver é ter consciência sem regras ou condicionamentos, nem deverias ou não deverias.

Escrevo apressada, mas envolvida. Prendo os cabelos com dois grampos. Molho as plantas no fresco da manhã. Entreabro as persianas. Dou uma espiadinha no mar… Gosto de estar em Torres e ter vida própria. A cerâmica vermelha encerada, o cheiro bom de limpeza. O gosto… Difícil entender as regras, condicionamento e pensamento que se interpõe entre um EU e um TU, entre um Eu e um Eu Mesmo. As coisas variam / mudam de lugar para lugar, de tempo para tempo. Romper elos, sujeita a cair em outra cilada. Reagir a convenção é ainda estar ligado a ela. Passando de uma opinião para outra, ainda estou no emaranhado: volto ao ‘deveria’, ‘não deveria.’ Consciência de ter, de fato opinião, é consciência: resultado do ato convencional, mas esquecido, de pensar. Atenção! Se tenho uma opinião fechada a respeito disso, estou, de novo, ainda presa, sem consciência ‘a música está alta e está me cansando’. Não é opinião, mas observação. Quero dançar abraçada, agarrada, colada em ti. É apenas uma ideia. Pensar é transitar entre ideias, opiniões: ouvir, ponderar, assimilar, vomitar, devolver a ideia fermentada, fazer nascer outra. É estranho! Viver com os fatos é mutável – viver com ilusão se torna monótono, repetitivo e tolo, confortável. Perder a ilusão é estar na realidade. Estranho! Viver com ilusão na esperança, na expectativa de que em algum momento, no futuro, amanhã não sinta mais tanto tédio. Outro caminho. Não está no mapa, e não pode ser colocado em mapa nenhum. O mapa é um caminho errado, caminho antigo. Pois é, não sei o que te digo. Queria tanto explicar! E conseguir chegar mais perto. O que importa? O lugar aonde seremos nós mesmos, sem pressões externas… Assim, venço barreiras, passo fronteiras, sem excesso, apenas sendo eu mesma.

Livros abertos ao acaso. Leitura vício. Não o que me adormece, mas o que me desperta… Através do teu olhar, troquei o excesso dos vestidos, pelo sapato. O essencial engolido pelo superficial: vida de vitrine, sem cheiro, sem suor: limpa e lisa. O problema é que o valor máximo, o dinheiro, corrompe e deteriora. Abafa. Não permite saborear ou pensar, ou ter ou entender o que significa o interior. Eu te amo. E constatar o amor muda tudo. Elizabeth M. B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres se despedindo.

sonho

aquele sonho? sonho muitas vezes o mesmo. pequena história enrolada no desejo. faço a noite e arrumo o dia tomada de ternura. não estás aqui, mas vieste… vieste e vi teus olhos verdes serem azuis. amar foi natural. ser amada… desconfiada. sim. sempre um pouco desconfiada das palavras, das promessas, assim mesmo viajei no teu sonho, no meu. tanta felicidade! transborda para este magro hoje confuso, atordoado. alguém pergunta por ti…não sei aonde estás. estás. eu ainda te espero para o chá. Elizabeth M. B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres

será que me esqueceste? segues sedutor, eu sei. saudade

quanto tempo!

do passado

Do passado este presente da inquietude. Esquisitice agitada. Quanto espanto! Eu me perco de mim mesma, de repente volto a mim -, o que se rompe não sei. Cômico, triste, sempre extremamente ansioso este sentir. Um rastro antigo, ressequido, pulverizado, um rastro de mim mesma. No momento em que toco não consigo espantar nem agarrar, continua a me espiar ali, intoleravelmente forte e… Estas coisas do passado, presentes, agora, por quê? Estas ansiedades. Este medo que tenho que algo aconteça e eu já não posso fazer nada. Nem socorrer, nem sarar.

Os livros, as intermináveis leituras e releituras que se movem… as citações importam, sempre vão existir. São trilhas importantes.

” Sempre me alegro ao ver sua juventude, beleza e força, e depois a escuto dizer que não tem energia nenhuma! nossa época de qualquer modo transborda de energia. Não quer mais pensamentos, somente ações. Essa terrível energia nasce apenas do fato de não termos nada a fazer. Interiormente, quero dizer. Mas afinal, exteriormente, qualquer pessoa repete a vida inteira uma única ação: entra numa profissão e avança dentro dela Acho que chegamos novamente à pergunta que você me fez a pouco, lá fora. É tão simples ter energia e tão difícil procurar um sentido no emprego dela! Hoje, pouquíssimas pessoas percebem isso. Por isso, os homens de ação parecem jogadores de boliche, que, com gestos napoleônicos, conseguem derrubar nove pedaços de pau. Eu nem me admiraria se no fim caíssem violentamente uns por cima dos outros, apenas porque não entendem essa incompreensível verdade de que todas as ações do mundo não bastam!… […] Na verdade, não deveríamos exigir ações uns dos outros, mas primeiro criar pressupostos: é isso que eu sinto.” (p.527) Robert Musil O homem sem qualidades

Robert Musil 1880- 1942

Penso! Pensar importa embora seja um ciclo / não, não é um ciclo, mas o pensamento é ação, quando a gente se põe a observar, pensar ou ler, faz acontecer…

não, ela não se importa

na verdade ela não se importa com ele, com o destino, nem quer saber como e de que forma, definitivamente, poderia ajudar. atende as urgências, mas não consegue fazer com que seja prazer ou alegria, ou conquista… pesa como um castigo, uma dor, um fracasso.

estas medidas de fazer, de querer, de ser alguém para alguém atravessam mistérios de amor… algumas pessoas conseguem outras não.

o amor, o sentimento de pertencimento, de gratidão, de doar-se são caminhos pedregosos… e consomem o que a média das pessoas entende por boa vida: sem responsabilidades pesadas, bastante dinheiro, leveza, e ócio. beijos e abraços, muitos beijos… sucesso, beleza. como se definiria amor? como amar de verdade um alguém que deseja / precisa de amor e de entendimento de vida. e de quem o faça renascer. quanta confusão no que se entende por ser feliz. uma maratona de equívocos e ausências, engodo. e eu não sei explicar. qual foi meu caminho nesta vida… afinal, eu vejo a pedra rolar, eu vejo…, e não estou fazendo nada. não consigo sair do lugar. Elizabeth M. B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres

amor novo

“Perguntem a alguns que é o amor e será nada mais do que uma brisa murmurando entre as rosas e se desvanecendo depois. Mas também é muitas vezes como um selo inviolável que dura a vida inteira, dura até a morte.” (p.120) Knut Hamsun – Vitória

Knut Hamsun (nome real Knut Pedersen), nasceu na no vale Gudbrand na Noruega, em 4 de agosto de 1859.

“Ah, que era o Amor? Uma brisa sussurrando nas rosas; não, uma fosforescência amarela no sangue. Amor era música quente como o inferno, que impele até os corações dos velhos a dançar. Era como a margarida que se abre à chegada da noite, e era como a anêmona que se fecha a um sopro e morre a um toque.” (p.41)

Anêmonas lembram meus dezoito, ou dezesseis, ou eram dezessete anos? Recebia flores e mimos, era fácil, alegre. Tão bom viver! Tão natural e doce. Margaridas me lembram de ti -, deste agora no sítio, com os cães, com teu jeito distraído de ir e vir. Das corridas do teu amor. De ti… Elizabeth M.B. Mattos – dezembro de 2024- Torres

surpresa

Surpresa, susto! de repente! Dia de empacotar, passar as fitas, escrever bilhetes. Comer bolo de chocolate, gostosuras. Depois, depois me surpreender. A velhice é mesmo muito velha: esquisito constatar. Então, eu converso contigo! Tu me olhas sem surpresa e falas, e falas. Escutar o que dizes acalma o passado, organiza o dia. Eu te ofereço um cálice de vinho. Rimos os dois. Este agora é um presente cheio de guizos e com nossas expectativas de meninos. Quase Natal! Elizabeth M. B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres

amor possível

[…] o que será uma viagem à beira do possível, passando e talvez nem sempre apenas passando pelos perigos do impossível e ante natural, ‘um caso limite’ de validade limitada e especial, lembrando a liberdade com que a matemática, por vezes, se serve do absurdo para chegar a verdade. (p.541) Robert Musil – O homem sem qualidades

Assim eu posso ir ao teu encontro, esquecer que o tempo, o bom tempo passou, com ele a beleza, mas estamos vivos, tu e eu. Depois, amar tem mesmo a perda definitiva, passos silenciosos, e aquele vazio. O desejo saciado. A volta ao nada de ser apenas eu. Sim, estaríamos deitados, silenciosos e quentes. Elizabeth M. B. Mattos – dezembro de 2024 – Torres

Tudo isso estamos a viver, tu e eu…