Salvo para quem trabalha, e trabalha… Ou tem projetos e empilha sonhos bafejantes, possíveis, envelhecer é muito, muito chato, limitado, traiçoeiro até… Morrer antes de envelhecer, pior. Ou seja: viver é mesmo desviar-se das armadilhas. Tantas! Caçar cupins. Varrer e limpar, polir e ventilar. Agarrar o vento das ventanias. Detalhes, recortes. Desviar do tempo. Afinal, pensar e conformar-se com beijos, afagos, abraços e confissões. Quando ouvimos o outro, escutamos a voz e a alma, duplicamos a vida. Talvez o segredo seja as confissões e palavras… Caçamos borboletas antes de se transformarem. É isso? Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres num dia tomado de aventuras.
O luto é o tempo costurando o rasgo da perda. O que desaparece, a perda, o sentimento dilacerado da dor não se explica na morte ela mesma. Perder alguém amado, perder a casa, o jardim ou o jacarandá da infância, o vestido, o carinho, a luz… Perder é um susto. De repente, completamente nus, expostos. Memória é o requinte da alta costura – da roupa sob medida. O guarda roupa necessário, escolhido, refeito. Renovado. É preciso apreender a se desfazer para organizar o armário, a gaveta. Os afetos precisam ser dedilhados como o som de um piano… Olhar / sentir / a percepção precisa passar por dentro. Amar o sono, o recolhimento e as próprias vontades. É zelar pela própria vida. Reconciliar-se com o gozo. Gosto de botões e abotoar é um bom jeito de enfeitar a vida. Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres
De toda / qualquer / definida ou não, é a fragilidade amorosa, a que mais aflige e preocupa. Esta fragilidade amorosa estrangula. Independe de cuidado possível, de resolver ou não / não depende apenas de nós mesmos… Estou pensando uma bobagem? Talvez… Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres
Lugar / terra / espaço não tem adjetivo, como descrever? Por onde passamos, lá deixamos pedacinhos, lá estamos. Projetamos / lançamos um ‘pedaço’ de nós mesmos: uma partícula, um sentimento, um gosto fica moleculando por lá… Quer dizer, estive ali. E este ali eu carrego comigo. Quando bebo um suco de laranja, tomo leite ou como um pedaço de carne… Se o vento assobia, ele me conta. Viver é deixar estes pedacinhos por aí… Nas calçadas, na cama de lençóis desfeitos, ou na risada, até quando a lágrima se liberta. Sou eu. Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres
Vou citando, e sigo a conversar contigo. Estou acompanhada entre minhas quatro paredes, ou são cinco? O vento parou. Ensolarou o dia meu amigo.
“Procurei um canto tranquilo para ler o que você escreveu. Os cachorros me acompanham como sempre. Li e reli algumas vezes procurando o que não estava escrito. Sua conversa era fluida e agradável, mas ela se sentia um pouco perdida, pois parecia falar não tanto para dizer e sim para ocultar. Estava escrito mas invisível, entre linhas, nunca óbvio, nunca claro mas transparente, invisível entre as linhas. Eu escrevi? Eu citei, Paulo? E segues: Esse vento que não para? Dias e meses a fio sem dar trégua, sopra como música de filmes de terror nas frestas das janelas. E essas pessoas na beira da praia? Acumuladas e espremidas no meio do lixo. O vento leva a areia aos olhos e a elas não permite ver. E elas insistem em se divertir, todo ano a mesma coisa: sol, sal, sul e… vento, muito vento. Corpos queimados, tostados, torrados, cobertos de areia e sal. E elas insistem em se divertir, lixo por todos os cantos e a areia nos olhos que não lhes deixa ver…” Paulo Biurrum
Eu não resisti. Transcrevo tua mensagem, e releio. Releio. Penso o mesmo, sem audácia de dizer. Ah! Estes amigos! Obrigada. Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres
sinto saudade apertada, fora do eixo. descabelada saudade, estranha e esquisita. pedaço? era inteiro, ou o que exatamente era? estranheza. não se trata de sentimento, talvez uma loucura maior… não consigo desabafar. escondo no silêncio atordoado de uma fala sem fim, falar pode ser o som… escutar o silêncio correto. seria isso. o bom silêncio. Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres
Se eu pudesse, verdadeiramente, me libertar do medo eu voaria. Não como Ícaro, acreditando em asas… Eu voaria pelos sentimentos, atravessaria os beijos e os abraços. Seria Eu na minha máxima potencialidade. Talvez, de volta a rua Vitor Hugo, 229 – e o gramado, jacarandás e ciprestes devolveriam minha alegria. Todos nós reunidos, meninas e meninos preocupados em dançar e flertar. Das memórias a vida real. Ontem imaginei que poderia voltar para casa, o apartamento da Avenida Independência e recriar o que chamaria minha vida, meu espaço. Ainda sinto uma dor enorme por ter perdido a minha peludinha Ônix como um aperto de culpa, de negligência, inconveniência da minha parte. EU responsável, ela tirana, mas dependente. Outra vez culpa e castigo como a literatura tantas vezes explicita. A vida contada como deve ser, em detalhes ou sopros, nunca real. Escrever tem este alívio, exala a particularidade da vida, ao mesmo tempo toda a artificialidade do esforço. Viver deveria ser natural. O bebê grita, e estranha. O útero, o conforto e o abrigo certo… Não podemos voltar. É preciso enfrentar. Cultivar a vida, ou o jardim importa. Sozinhos ou acompanhados. Os sons, as vozes, o movimento das calçadas, as bicicletas. Árvores. Pássaros e a água importam. Como seria entre quatro paredes com o vislumbre do céu, sem céu.
Lavar a roupa. Pendurar a roupa. Estar Em Paris, na Normandia, a França, o francês. As janelas. O entusiasmo. Sim, tens razão, viver é apenas um punhado de entusiasmo necessário, e saúde. Escuto o piano – a música responde. Elizabeth M. B. Mattos – janeiro de 2025 – Torres entre nublado e sol, sem chuva, sem calor, apenas o silêncio da Lagoa do Violão.