Estupefação

O que vou fazer diante de ti. Pesa a turbulência de ser apenas eu. Onde estou? Aonde não cheguei? É preciso entrar na roda sem medo. Do exercício ao nada, ao muito pouco… Olhar, um compromisso. Ver o movimento. Dar-se conta do esforço. Deste não fazer. Vontade de entrar, falar, dizer, interromper, explicar, justificar. Depois, mais baixo, timidamente, perguntar, e agora? O que eu faço agora? Fazer exatamente o quê?

“Penso, deitado aqui à sombra deste monte de feno… O lugar que ocupo é tão minúsculo em comparação com o resto do espaço, onde não estou e onde ninguém se importa comigo! A parcela do tempo que hei de viver é tão ridícula em face da eternidade, onde nunca estive e nem estarei… Neste átomo, neste ponto matemático, o sangue circula, o cérebro trabalha e quer alguma coisa… Que estupidez! Que inutilidade! Deixe-me dizer-lhe que tudo isso se aplica ao gênero humano em geral…” (p.153)

Pais e Filhos, Ivan Turgueniev. Abril Cultural, 1971.

Imobilidade

A idade não importa. Era menina- criança. Sentia o tempo lento. Medo imobiliza.  Encolhida no fundo da cadeira. As brasas se espalham acesas no jornal. Fogo. Estupefação diante das riscas brilhando no tapete. Não era mais cinza, nem cinzas! Ao lado, sob o mármore, a grande tigela com água… O silêncio na casa. Apenas a biblioteca atenta ao soluço preso que desdobra manso em lágrimas, depois gemido desespero, e, por fim, o espanto da casa inteira acordando… Consolo no abraço. Brasas apagadas, tristeza grudada, sem explicação, sem palavra, presa na menina. Como na história do Bambi… Os álbuns de colar figurinhas se transformavam em histórias. O tesouro completo manuseado. Histórias conhecidas, ansiosamente esperadas. A cada envelope, quatro figurinhas. Já era hora de dormir, não dormia. E, de repente, solta o soluço. E já um gemido inconsolável. A mãe do Bambi morreu, a mãe do Bambi morreu! Choro largo, grosso. Verdadeiro, difícil, e trágico. Histórias violentas. Amorosas. Felizes. Naquele incêndio da floresta, com a morte da mãe do Bambi, compreendeu que os homens perseguem, e matam inocentes. Queimam a terra, sangram a vida, impiedosos. Eles, os homens, inconscientemente cruéis?

Exercito a memória. Não sem dificuldade. Relembrei a imobilidade do não fazer, das lágrimas. Quantas vezes recomeçar sem reagir na hora de agir? Imóvel diante do fogo. Num balanço de ir e vir, indefinidamente. Elizabeth M. B. Mattos – abril de 2014 – Porto Alegre

Refém

imagem004 (2)O tempo, não apenas nosso, mas da casa inteira. Do lugar. Do homem que atravessa a rua. De quem nos chama ao telefone. Do jogo de futebol. Não basta limpar, arrumar, ordenar, desejar fazer para reter, segurar, agarrar o movimento. Como posso prender tudo dentro do balão? A esfera sob a cabeça… Como nas revistas em quadrinhos. Um quadrinho depois do outro.

As horas vão se desmanchar no dia. Na noite. No vento, e também nas trovoadas. O sol esquenta a terra, e o balão suspenso espera a hora de explodir. Por que não consigo parar de pensar que o relógio amarelo deixou de funcionar? E o menino, olhos abertos, inverte o tempo. E o tempo não volta. Dói estar a espera do vazio, imóvel. Ele não grita. Espera. E está triste. Sei que o relógio não vai funcionar, e porque sei sinto a vontade azul, aquela vontade que faz chorar. Elizabeth M. B. Mattos – abril de 2014 – Porto Alegre

Todos envolvidos

Todos Envolvidos com Moda no Mundano no detalhe. Prazer

Estamos num tempo visivelmente acelerado, consumista, e pateticamente igual. Ditadura ou democracia? O patético fica por conta daquilo que parece, mas não é. Sim, tentamos seguir o fio condutor dos bons costumes, da elegância, do corretamente correto, não acertamos. Por quê? Pautamos nossa vida em modelo conhecido, ou aprendido, apreendido com nosso olhar, inteligência, meio ambiente, formação, etc., etc.. Seguidamente tropeçamos. Degraus não são uniformes, nem o gosto, nem os valores, nem o dito olhar. Hoje mais rápido, ontem preguiçoso, e assim sucessivamente, sem uniforme. Como fixar, fazer, reproduzir na mesma velocidade em que tudo acontece? E a moda? Esta indústria que nos atinge profunda e exaustivamente? Como seguir a moda? Como zelar pela imagem, e mostrar o corpo, estar, ser, ter tudo ao mesmo tempo. É preciso fechar os olhos. Necessário assumir limites. Estar adequadamente bem vestido exige enorme esforço. Regionalmente distinto! A beira-mar, eu me permito. Na capital, ouso menos. Isto tudo embrulhado em Rio Grande do Sul onde as estações existem (e já existiram sangrentas batalhas), ou existiam estações e bom senso definidos… (O mundo se agita em mutações esquisitíssimas, atualmente!) Sandálias para o excessivo calor, botas no inverno. Tênis nas duas estações se freqüentar academias. Ah! No entanto vestir, vestir sendo carioca é mais difícil! O pacote é bem diferente. As fitas importam mais do que a etiqueta da loja X ou Y. Não em alta escala, carioca sofisticada será como gaúcha sofisticada, paulista, ou parisiense, ou londrina. Italiana, ou russa. Americana? Existe o que está acima de, de um salário razoável. Acima dos limites impostos por ser apenas pessoa circulando na rua porque trabalha, porque vai ao cinema como todo mundo, não frequenta apenas camarotes. Circula. Vestir carioca tem que ter malhação diária, corpo sarado para tantas alcinhas, tantos biquínis. E pernas apressadas com saias soltas, ou justas, bronzeadas! Qualquer floral, seja algodão, seda, ou algodão, ou seda mista, ou… Casaquinho de malha em dias ventosos! Botas em julho fazendo estilo, não frio. Será assim a carioca das calçadas? A gaúcha enfrenta  pesados casacos, saias de lã, malhas grossas, o corpo escondido! As botas, as meias de lá, os solados pesados. Então o corpo não aparece, nem importa. Transparente no inverno, no outono, até numa primavera ventosa se esconde. Lenços coloridos, echarpes, luvas? Consome sopas, chocolates, massas e molhos, churrasco, vinhos encorpados. Chocolate amargo ou não, muito chocolate. A exigência se esconde em baixo das cobertas. Na frente do fogo, embaixo das mantas. E a moda? Moda carrasco, madrasta. Ser elegante com tantos panos exige muito, muito mais.  Nós nos submetemos. Sofremos em baixo de tanta roupa, ou de tão pouca roupa. Quando diremos um basta? Nunca. O segredo? A moda somos nós como nós somos. Tapar o corpo sim, desfilar o corpo não. Desnudar, sim. A moda no limite da nossa vontade sem nos exigir vitrine imposta. Não somos manequins, não precisamos de passarelas.  Precisamos de olhos a desejar… Graças! Nós respiramos. E a moda frequenta crianças, bebês. Sem exclusividade. Será que a moda é democrática? Ou exerce a ditadura. Bem, agora estamos todos envolvidos. Os homens adoram a moda. Elizabeth M.B. Mattos – abril de 2014

objetos, moda e espelho, e documento

Na ponta do fio

Nem sempre conseguimos dizer o que realmente pensamos…

Nem falar o que importa. Difícil escrever, expressar. Em se tratando de amor o tropeço é banal, igual, comum. O espelho reflete, esconde menos. Ou, é no silêncio, na sequencia lenta que apreendemos.

Do fundo da memória pequenos fragmentos tomados como banalidades se erguem poderosos, e descrevem o amor.

A beleza transborda nesta memória…

Eu queria poder estar na ponta do fio, e saber que estás lá segurando a outra ponta.

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