Autobiografia picada

“Minha poesia e minha vida têm transcorrido como um rio americano, como uma torrente de águas do Chile, nascidas na profundidade secreta das montanhas austrais, dirigindo sem cessar até uma saída marinha o movimento de suas correntes. Minha poesia não rejeitou nada do que pode trazer em seu caudal; aceitou a paixão, desenvolveu o mistério e abriu caminho entre os corações do povo.” Pablo Neruda. Confesso que vivi (p. 173).

Como um rio! Como o Amazonas, como o Mampituba em curvas, ora poluído, ora cristalino, como o Sena. Tolos! Crentes! Escondidos no amor amado. Sucumbir ingênuo. Feliz. Levado… Estes encontros voltam, e se voltam congelam. Prematura consciência. Saudade, inaptidão! Dose dupla…

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BRASIL

 

“ E o Amazonas? O maior rio do mundo. Mas só em volume de águas. Economicamente, não vale o Mississipi, não vale o Nilo. ” Vianna Moog – Bandeirantes e Pioneiros, p.29

“De acordo. Mas embora não valha, em termos econômicos, nem o Mississipi, nem o Nilo, é o que temos. Se não chega a ter a excelência do rio que mereceu na antiguidade o elogio de Heródoto, e se em torno dele não se criaram as riquezas que margeiam o rio que Mark Twain singrou nas suas aventuras – não é este motivo suficiente para que lhe voltemos as costas – como se, fartos de tanto espaço inútil, nós pudéssemos dar o luxo de continuar ignorando aquele trato imenso de território nacional. O ponto é justamente este: não é realmente de interesse econômico imediato a ocupação efetiva da Amazônia…mas se não a promovermos, logo, alguém o fará, alguém terá de fazê-lo.  O mundo mudou um bocado nestes últimos anos e não será a bula de um novo Bonifácio que nos irá assegurar a posse de uma terra que é nossa apenas no mapa. “ Mário de Almeida Lima – Só aos Domingos, p. 41

Problemas, os mesmos. E nós? Não vemos. Mário de Almeida Lima reuniu estes Ensaios jornalísticos sem Cabresto de editais de Domingo da Zero Hora, este foi escrito em 18 de janeiro, 1970. Estranhamente não nos apossamos do que nos pertence.

Medo? Medo de lutar, ou tornar a vida apenas imediata… Mais mansa? Viver é entrar na guerra.

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Bilhete

Escuta. Vai passar o tempo, o nosso tempo. Esta hora, esta dor, esta saudade. A culpa não é tua. Nem dele tampouco, criança. É assim o tempo. Dores, mágoa, este vazio que não é teu, mas nosso. Aquieta-te. Segura, e segue. Vai passar a dor, a saudade. Cuida-te. Olha o mar, a terra, esta cidade linda! O Rio de Janeiro, olha meu pequeno…Elizabeth M.B. Mattos – junho 1914 – Porto Alegre

Como Popeye

A dor se multiplica se lamentamos o tempo, o desencontro. Dia arrastado deste domingo! É preciso acordar no cinza, mas desenhar e colorir. Zelar pelo corpo, beber leite, frutas, comer espinafre como Popeye. E não descuidar da alegria. Que se abram todas as portas desta casa sem frestas, imediatamente. Novo sol. Vento, chuva. Nova hora com muito espinafre. É preciso sorrir, arrastar, reconstruir, e sair das vitrines feitas, abusivas, consumistas. Recomeçar. Um pé diante do outro. Enfiar os dedos na terra, escutar a música que sai do gramado. Não seja feio o terno, nem desconfortável o sapato, mas que nos canteiros as flores semeadas perfumem o sol. O aperto das mãos no sorriso… Popeye

O penoso

Concentrado no trabalho, o homem erra menos. A beleza rouba o penoso do esforço. Entrega-se, fácil, a conquista. É como burlar, enganar o seu eu interior, e entrar na velocidade inexplicável do tempo. Produz com a mesma finalidade? Este movimento se explica por dentro, ou por fora? Aquieta?  Por que é mesmo que acordo de manhã? Por que não durmo durante toda a noite? E o que digo, importa mesmo? Dançam, comem, jogam! Consomem. O mesmo vinho, aquele chocolate, as roupas da vitrine, e voam de um lado para outro, voam estes homens. Depois…Tantas vezes o mesmo campo de futebol. Os novos campos de futebol. Lesão, fratura, dor, prazer. Arena e gritos, excesso, lucro, dor e prazer. É tudo? O excesso, e a perfeição física. Por que é mesmo que estamos aqui, e agora? Vamos assistir aos jogos paralisados, obcecados pela bola, pela velocidade, suados. O grito, o ganho, a perda. A bandeira! O grito outra vez. É o jogo.