Escreve bem. Vida perfumada pelo sucesso laborioso. Luxo cotidiano, lapidado. Conforto, fartura intelectual. Inchado parágrafo. Ironia. Curta narrativa.Texto dois desdobra na citações. Subjacente… Envolvida pelO brilho do bronze [um diário] de Boris Fausto. CosacNaify, 2014. Leio o bom vinho a cada detalhe. Fecho os olhos e acompanho Cynira.
“O quarto dos mortos
Há algumas semanas li o livro de Michelle Perrot Histórias dos quartos, um bom exemplo da ampliação temática produzida pela Nova História. Quando fala dos quartos, Perrot se refere a duas atitudes opostas; de um lado, a de tudo preservar; de outro, ade tudo tentar apagar, até mesmo a lembrança da voz do morto. Fico rememorando a voz da Cynira, fazendo força para não esquecê-la , temendo que isso aconteça. Por quê, nas nossas longas conversas sobre a vida que em parte reproduzi em Memórias d um historiador de domingo, não gravei alguma coisa, preferindo deixar a conversa escorrer livremente?
Michelle Perrot
Objetos
Em incontáveis memórias, passagens de livros de ficção e diários se fala da angustia ao contemplar roupas e objetos que pertenceram a alguém muito querido, Ao realizar essas tarefas incontornáveis, parece que apagamos, a cada passo, um pouco da lembrança de quem se foi. […] Se roupas e outros pertencem perturbam, não é fácil também encarar espaços vazios. Esses espaços tornam cômoda a vida de quem permaneceu e traduzem outro vazio, que não é material, deixado por quem se foi. Dramática e ironicamente, resolvi o problema da minha quantidade de livros que não tinha onde guardar, mas o sentimento não é bom, é como se ocupasse, indevidamente, espaços que não me pertencem”(p.55-56)
Boris Fausto

