objetividade não alcançada

P.Alegre, 20 de outubro 2000.

Beth,

         que temperamento. Com tanta carta e problema, envolves o homem. Quero ver ele achar saída. Belo Horizonte não é o problema, ótimo clima. Já as cartas revelam uma incomum fluência de redigir. Mas insisto; para a literatura essa fonte deveria ser ordenada, por exemplo em contos, num diário moral como os bons diários, num romance. Para isso terias de achar um modo de te distanciar dos teus problemas e entrar na objetividade do nível literário. Quem sabe consegues fixando este projeto. Ele pede alguma estabilidade cotidiana e psicológica. Terias de saber renunciar, mas é em nome da arte,a tua querida. Ela merece, é o que o teu computador e dias não cansam de reconhecer. Se o puseres à frente, isso pode não estar tão distante como hoje soa. Um voto

        Paulo

18 anos se passaram. Sigo escrevendo escrevendo, mas  nenhuma objetividade, sem foco. Perco energia. Os papéis se colam uns aos outros. Eu me perco a espera do milagre. Imagino que vai se criar ordem, tranquilidade trabalho e paz. Um mergulho dentro de mim mesma. Que eu escreva a carta e responda, ou o diário. Tantos cadernos azuis vermelhos amarelos, anárquicos eles também. Antônio Carlos Resende conseguiu que tua correspondência/ acervo fosse armazenado na biblioteca da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Outra memória engraçada: café com leite do Carlos Lyra (nada de chopp, não importa a hora, sempre café com leite), e interminável conversa de ver o dia nascer. Velhas e maravilhosas canções. Foi na casa da Aldinha que conheci Carlinhos (e, pegar o mesmo táxi esticou o tempo). Todo conectado com a astrologia, acho que ainda tenho o livro que escreveu (vou procurar). Ideias novas liberdades amarradas. Aliança Francesa de Ipanema, e neste fio a memória do Rio de Janeiro adormecido/ cochilando durante a Ditadura Militar. Onde como andará a bossa nova? Tudo te contei em cartas meu amigo. Paulo, guardei o teu estímulo. Não parar de escrever …, não deixar de ir ao cinema, ler ao menos duas horas por dia, e principalmente não deixar de ser feliz. Tudo armazenado/ registrado. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2018

CARTA PAULO URGENTE É SER FELIZ

FLAUBERTtttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttt

Cartas Exemplas  Gustave Flaubert  – (1821 – 1851)

Na primeira foto: Olívia (lenço azul no pescoço), Aldinha e eu, Aliança Francesa de Ipanema com Willy, o professor belga. Na outra, Aliança Francesa de Copacabana, Patrick Durrand Lasserve. Festas de aniversário.

…contento -me em fazer planos, criar cenas, sonhar com situações descosturadas, imaginárias e ser convencional …, não sei o alcance que a palavra convencional adquire neste momento, nem como posso afastar/ impedir que te aproximes sendo  eu

C O N V E N C I O N A L ou o inverso, respondes: compreendo como pode parecer / ser desmedido, maluco ou duro. Mas preciso que me escutes. Não por mim, mas por ti, para encontrares o caminho. Respondo: aonde aonde aonde o atalho para este caminho iluminado? Esperando que digas. Sigo nestes longes gaúchos a ter amigos amigos daquele tempo adolescente de estar em Torres. Sempre Torres.

bonito

22 de agosto de 1978

…, gostaria muito de visitá -la. Rever sua mãe, as crianças. O tempo foge e as oportunidades se escondem nos múltiplos e cansativos quefazeres que me cercam os dias horizontais.

INTERVALO

Nossos caminhos são desiguais: você anda (ainda) por onde quer e faz (ainda) o que deseja; eu não estou (ainda) onde gostaria, nem faço (ainda) o que me agrada. Isso soa demasiadamente dramático; desconfio que seja falso … O que na realidade quero dizer é que faço quase nada do que gosto. Dramático de novo. Falso outra vez? …

EPÍLOGO

Tenho receio (algum) de me estar tornando mórbido. Tanta inverdade (na minha vida) aliada à exígua, ou inexpressiva liberdade estariam a afetar – me o temperamento (outrora) alegre.

Acho que não vou enviar-lhe esta carta …

Helio

P.S. É bom saber que gostas de ti.

FIM

 

Helio:

Guardei bilhetes e desenhos, seria bom conversar outra vez. Não sei onde estás. Desapareceste na tua história feliz, suponho. Lembro das risadas, tenho fotos do grupo: Laila Miguel e Roberto, da Suzy (esteve no Rio Grande do Sul quando morei em Santa Cruz do Sul) …, sim acho que sempre gostei de mim mesma, atualmente nostálgica embora livre/inteira. Não podes acreditar que passei a usar o tu no lugar do você, mas o Rio de Janeiro o nosso Rio de Janeiro está intacto. Os filhos tão pequenos naquela época já mais velhos do que nós (tínhamos tanta juventude!). Não estou com as fotos em mãos. Assim que encontrar acrescento. Tenho cartas manuscritas tuas, um desenho que fizeste, sentavas atrás de mim, uma figura, acho que também escrevi bilhetes. Ainda tenho contato com Roberto que casou teve dois filhos, e segue o professor/monstro/ intelectual que sempre foi. Lembras do Zé Luis? Da Olga. Estamos todos juntos nestas fotos, tenho certeza.

Na época eu assinava Elizabeth Menna Barreto Moog / grande confusão este nome! Quando me casei aqui no Sul (com o pai da minha quarta filha) deixei de ser Moog. Esta confusão de trocar nome. Agora sou Elizabeth M.B. Mattos e ponto. Outro casamento, nem pensar.

Fico te devendo as fotos na sala de aula. Perco umas, encontro outras. Estão num álbum … estás dando um abraço na Sofia, e o professor Miguel está conosco. Aparece a Laila e também a Suzy.

FOTO PARA HÉLIO daquele tempo

let me try again eu fiz do meu jeito

https://www.youtube.com/watch?v=e8TivCLOQEY

O que será de nosso passado…, que/se a gente vive tentando recuperar a maravilha perdida sob a pressão de ver/estar/ser o presente. Volto. Mesmo largado/deixado ganha/guarda majestade. Testemunho eterno: – eu estava lá, eu fiz isso e aquilo, naquela época as coisas eram assim e assadas, eu era bondade e beleza, a minha beleza. Grávida de promessas, de um belo futuro. Responde. Explica, canta e dança comigo! E.M.B. Mattos – maio de 2018 – Volta!

https://www.youtube.com/watch?time_continue=20&v=oSRk39B6QqQ

 

…, o tempo passou, e de repente, está de volta para nós. Alegria alegria pela vida.

Bonito