pequenas histórias sem livro nem som… trancadas

Depois dos cinco anos no cárcere com possibilidade aberta aos grandes sonos e constantes sonolências eu me habituo aos comprimidinhos de sono induzido, transformo os dias em noites e as noites em espelhos do passado: silenciosas e minhas. Perfeitamente minhas.

Envelhecer tem peculiaridades: posso observar / ver / acompanhar detalhes do meu corpo. Eu sinto que pode acontecer hoje ou amanhã, percebo a finitude. Um estranhamento ativo.

Ainda entra água pelas janelas, todas as madeiras incham e choram por fora e por dentro, derramam a chuva. De alguma forma acompanham meus desânimos. Lavam tudo: as possibilidades, as tristezas. Talvez não tirem a esperança, porque a chuva e este choro forte renova.

2.

Esta coisa de vingar ou lembrar o porquê disso ou daquilo é um daqueles cálices inúteis, não preserva o bom cianureto, nem resolve a sede. Aquele esforço necessário para tocar a beirada da piscina por capricho, numa braçada, porque, verdade seja dita, é tão rasa, que posso ir caminhando com a água pela cintura.

Talvez ir / tomar um avião / ou trem, ou ônibus e voltar para casa / voltar para o jardim. Plantar novos / outros cinamomos… Acreditar que o jardim poderia /deveria ser meu: camélias brancas e rosadas, beleza… E tu saberias. Acreditar que o trabalho, no bom e certo tamanho, produz alegria e traz paz.

O tiro que marcou a porta do quarto. Não atravessou a madeira. Guardou a bala. A história e o tempo foi no desespero dos sonhos findos. Cronologicamente a vida era começo, embalo e saúde. Algumas traições são feitas no escuro das verdades, no completo breu. Sem alcance. A percepção do alvo não existe. Como sair metralhando numa guerra com medo de acertar… E nenhuma maturidade, nenhum sol ou lua, ou holofote ilumina o suficiente.

As pequenas e silenciosas frases apagadas nas dobras das cartas, explicam o inexplicável, o desconhecido. A isso chamamos de histórias de terror. Vomitar não resolve a doença, não cura, por um momento dá um certo alívio e sono. Estas pequenas e grandes insônias que se transformam em prazer… Depois, eu posso escrever. Depois do sono. Elizabeth M. B. Mattos – novembro de 2023 – Torres

Foto: Pedro Moog

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