já 29 de outubro

De outubro enfeitado de coisa boa

Fico a pensar / ou quero assim, entrar na caixa como a Valentina, espiar pela janelinha, ou inventar um mundo dentro da caixa – caixas festas: grandes ou pequenas, festas. Esta coisa de 80 anos parece esquisitice imposta. Foi assim que Isabel resolveu não se ocupar mais da casa, das panelas e das podas, nem de roupas / qualquer roupa seria a boa. Enfiou uma calça bem larga, e ficou confortável, foi o que me disse sem susto. Resolvi o problema. Eu estava encolhida no canto, ainda tricotando, sem entusiasmo e pensando no tédio dos oitenta anos espichados. Precisava escutar o que ela dizia. Viajou para me dizer: trouxe flores, bolo e a lógica. Acertar os pontos. Sem comentar absolutamente nada de política. Sinto a cabeça rodopiando, um aperto no peito, as costelas se apertando, um sono ardido e complicado. Troco de cama. Sinto falta dos teus beijos que escaparam faz já uma semana.

Peguei as xicaras do chá / pinguei o leite. De fato, não sei que dizer pode ser acrescentar, colocar os pontos e as vírgulas, ou passar o pano… doem as contas, os olhos estão ardidos, a cabeça aperta. Um tumor, uma hora marcada para morrer, mas a droga disto tudo é que não quero morrer. Nem as fotos… quero é não morrer, mas, minhas decisões são insignificantes. Tenho rezado, mas rezar não altera, traz paz? Sei lá, ver / olhar pessoas. Uma pequena viagem para um hotel de repouso…talvez. Um hotel que tenha festa e dança. E eu dançarei com ssssssssssss sem pressa.

Preciso entender a janela, a porta fechada e as limitações / comer pão doce / um copo de leite com chocolate e um aconchego de vozes. Não vou descrever a sala, nem a estampa da minha blusa, nem as minhas sinistras intenções. Vou beber mais água / uma secura que pode ser diabete / ou um corpo novo no meu corpo assusta, estou com medo. O medo grita / fica sem voz, depois encolhe e logo quer se esparramar na maior cama…

Já 29 de outubro de 2024 – terça-feira ensolarada – ou sem penumbra melhor dizer. E eu abrindo os olhos atrasada, mas em tempo para festejar o aniversário da Marina, ontem foi o da Suzana. Conversas matutinas, hoje espreguiçado dia. Quero pensar e escrever e dizer, ou fazer alguma coisa. Talvez faça panquecas ou sonhos! Sim, nós fazíamos aqueles açucarados! E as montanhas desapareciam com o café com leite! Que bom comer as fantasias! Bananas fritas com açúcar e canela! Estas gostosuras não eram interditadas e perfumavam as manhãs, também as tardes. Ainda estou devagar, ainda estou atordoada e sem orientação. E quero respirar. Quero caminhar. Quero estar. Hoje eu vou escrever um pouco, sobre nada. Escrever para chegar em mim. Aquela coisa de criança e de tempo, dos rabiscos. Aliás, vou usar todos os lápis de cor. Depois (pra não esquecer) arrumar as gavetas. Vontade de fantasiar a fantasia com camisetas novas, um vestido estampado solto, um colar de contas coloridas penduradas nas pérolas descascadas. Tem tantas velhas histórias penduradas no frescor da lembrança! Sim, hoje (pra não esquecer) vou limpar a casa e escrever pro meu amado. Tem mania de ficar longe / longe… Tudo mentirinha de esconder. Perto. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2024 – Torres

Deixe um comentário