memória certa

Não sei qual memória enquadra melhor o sentimento. Eu me agarro numa lembrança de correria, noutra de ficar olhando as formigas trabalharem, infância com jacarandá, agito do mar. Se penso Rio de Janeiro encontro o fervor, alegria constante da idade. Seria a idade? Vinte anos explode. Não permite, não quer tristeza. A risada vem se arrastando, mas chega e desfaz o nó. A rua Viúva Lacerda é coração. Um dia foi a Vitor Hugo, outro tempo vibrante era feito das fitas do uniforme das cônegas. Indisciplinada comportada. Existe? Gostava de entrar no mato para colher as pitangas, de ler livro na hora de conversar. De correr ladeira acima pra não fazer as costuras daquelas aulas com bainhas e bordados. Era tanta coisa escondida e ao mesmo tempo comparada. Um capítulo longo este. Ambígua pessoa, escorregadia e pacífica. Será que os adjetivos se encaixam? Ajudar sempre, mas nada que segure por muito tempo, infernizar também. Relações fluídas, divertidas e tanta intimidade! Fico cavando e fazendo morrinhos ao longo da pesquisa. Uns se ajustam bem, outros viram castelos e vou atrás da minha amiga Ana Maria. Correta, séria, reclusa. Então eram as cartas usávamos para montar castelos / cresciam poderosos em baixo do piano – grande e suntuoso piano! E nossos reis e rainhas, protegidos. Nós imaginávamos / éramos reis e rainhas. Nós e todas as meninas. Outros dias, prosaicas. Um passeio pelo jardim, como mães de bonecas fui atacada pelo Jeff, o cão pastor amarelo, mesmo na corrente, saltou no meu braço e cravou os dentes. Estragou nosso espanto e nos assustou com sangue e correria. Não queríamos das travessuras. Por quê? Talvez devêssemos estar estudando e não brincando. Lavamos bem o braço e colocamos pasta de dente / não contamos, recorremos ao dentifrício. Imagino que era arteiro o que fazíamos. Tenho a cicatriz… Aquela infância vivida! A dela, com proibições. A gente guarda no corpo os boléus que levamos. Escondidos misteriosos, mágicos. É pensar na infância, na meninice, mais do que a adolescência a sacolejar. Das danças e correrias na calçada esta amiga nunca participou. Sempre esteve atrás dos portões e dos muros. Mas todas as outras amigas / amigos eram da correria, das árvores e do pingue-pongue. Campeonatos. Adorávamos. O Beto, era o campeão. E a turma suava nas disputas. Era verão? Inverno? Férias? Não sei. Éramos um agito. Isso eu lembro. Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2024 – Torres

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