Pensei: um dia a gente deixa de dizer / falar / não escreves, não escrevo, simples assim… Vai desaparecendo o sol, o gosto. Já estás a desafiar outro lado da vida: a sobrevivência. Eu a cantar pela casa, distraída, sem vontade. O som dos novos / velhos tempos se acomodam… Olho no espelho, não me reconheço, mas ainda sou eu, não sou? É a pele. Não, são os olhos. O cabelo? Não sei. O tempo se esparrama também pelo corpo. O sono! Ah! Aqueles prazeres todos do sono, aonde estarão?
“Mes vingt premières années, il y a longtemps que je désirais me les raconter; je n’ai jamais oublié les appels que j’adressais, adolescente, à la femme qui allait me résober en ele, corps et âme: il ne resterait rien de moi, pas même une pincée de cendres; je la conjurais de m’arracher un jour ce néant où ele m’aurait plongée.
Peut-être mês livres n’ont ils été que pour me permettre exaucer cette anciènne prière. À cinquante ans, j’ai jugé que le moment est vénu: j’ai prêté ma conscience à l’ enfant, à la jeune fille abandonnée au fond du temps perdu, et perdues avec lui. Je les ai fait exister en noir et blanc sur du papier.” (La force de l’âge, ed Gallimard, coll. ‘Follio’,’ Prologue’, p.11. Simone de Beauvoir)
Nesta lembrança picadas de esquecimentos, o desejo de contar/dizer o que de fato restou ou fez sentido, ou se destacou. Vida arrastada ou atropelada (estupidamente simultâneo) penso estás viva . Preciso seguir, fazer, e tecer o tear… Fazer a manta, costurar as bordas e te aquecer. Será isso escrever memórias lembradas? Caos: respirar, espirrar, doer e dançar, sou eu? Publicado o que disse/ escrevi, não sei. Repito o sentimento, canso. Repito o texto. Penso. Transbordo. Ou pensei? Foi tua carta disposta que me deixou assim reticente, desfocada? Desviei o sentimento para beleza, a urgência do limpo / belo / composto. A certeza / a importância do belo. Tanta gente descansada em cima dela, a beleza… Também tu estás? Vaidade e beleza. Se persegue a beleza como solução / prazer / estabilidade / alegria e felicidade, mas ELA é uma ponta incerta e perigosa, aquela armadilha de todos os dias, de sempre. Um fardo pesado, inútil e também perigoso. Útil, mas perigoso porque estimula a tal aparência. Estante de livros não são livros lidos. Ah! Estou mal humorada, a tal chatice de ser gente, embrulhada no faz de conta de ser feliz / mas a gente é ilha mesmo, atrás, procurando um arquipélago. E só se sente feliz no outro, aos olhos do outro, pelo abraço do outro, atenção do outro, cuidado do outro. Somos felizes pendurados no outro… Cansa a vida, cansa o outro, cansa a beleza, por que é mesmo que empurro a máquina? Não sei. Elizabeth M. B. Mattos – setembro de 2025 – Torres