Uma ventania, um uivo. As árvores se dobram, a água da lagoa se agita crespa. Pelas frestas da janela entra o vento. A luz treme como se fosse apagar… Os aparelhos fora das tomadas, menos a geladeira. Sinto a ventania entrando no meu corpo, e fico inquieta. Como se a tempestade pudesse estar mais perto, e o vento levasse muito mais. Não vejo o mar. Pressinto. E queria estar no meio de um tempo diferente…
Volto aos dias mansos da fazenda: dias compridos, amigos, com cheiro de terra, feijão com arroz e sonhos. E dentro do vento o silêncio da felicidade mansa de estarmos todos no abrigo. Acendíamos o fogo no galpão, as velas iluminavam o banho aquecido nos tachos, e as conversas se misturavam com as risadas das crianças. O chão de terra batida… E o galpão de concreto armado. O dia seguinte era apenas o outro dia de afazeres, e café forte. Gostávamos de jogar cartas. Apostávamos o amor a cada partida. Dormíamos logo, acordávamos no vermelho do amanhecer. A cerca pequena dividindo a casa do campo. Os cinamomos, os eucaliptos, os açudes a serem feitos, as curvas de nível. O risco do pomar. A sesta. A rede. Os cavalos. Labuta com bombachas.
O vento que sopra aqui chega lavado em Miguel Pereira… Vocês duas vestem os casacos, e se enroscam nas mantas tricotadas de azul. Aquecem a sopa, conversam baixo, enquanto a televisão conversa com teu pai. A voz deste vento que grita assusta minhas meninas. Penso que ainda queria estar com todos juntos, na serra carioca. Não, quero o Rio Grande do Sul: a casa perto do açude. O marido. Penso nas ovelhas, cães e frutas maduras. Engraçado! As tranças do casamento se torcem! E todos nós estamos de mãos dadas neste tempo de ser feliz! Todos! Os namorados perdidos, os maridos, os filhos deles, os nossos. Estamos protegidos no sonho desta luz de lembrança… O vento que sopra forte, meu, teu, nosso congela os dias. Vou deitar logo porque nesta hora o sono me agarra traiçoeiro, e já está escuro. Apago as velas, acendo a lamparina e começo a contar aquela história de fazer vocês dormirem. A minha história na Fazenda Santa Branca. Elizabeth M.B. Mattos – Porto Alegre – 2012
Amoras Azuis como uma brincadeira séria. Platon assimile ainsi la philosophie à une sorte de jeux sérieux ( par exemple jeu sérieux au livre III des Lois). Tu n’est pas seulement poète, tu es aussi philosophe de toi même. JMG
