Um deserto árido

 

Através da janela espraiam-se as luzes da cidade na chuva, e das avenidas iluminadas com um brilho nevoento. Sobre a escrivaninha, pastas abarrotadas de papéis, livros diversos abertos diante deles, cartões de várias cores, talvez um copo de uíque entre os papéis, e rascunhos, e vários bilhetes e anotações, tudo espalhado à luz da luminária de grife que projeta um agradável círculo de uma luz silenciosa e quente. E dos cantos do aposento, de entre as prateleiras carregadas,flui uma música suave. Lá está um homem debruçado sobre sua escrivaninha, estende a mão quando quer e toma um gole do uisque, enche um cachimbo quando quer, com energia e vivacidade preenche uma folha atrás da outra, escreve, apaga, se anima, se arrepende, amarrota e joga no chão, por trás dele, a folha rejeitada. Tenta de novo, o som de uma sirene distante ou o repicar abafado de sinos se ouve lá de fora, finalmente vem a inspiração e com ela a alegria e o homem atinge seu alvo. Então suspira aliviado, lento e cansado, de olhos fechados em sua bela cadeira. Só ergue a voz um pouco, e uma mulher de roupão ou de quimono se apressa a entrar no quarto. Essas são as coisas simples e fortes que se deve fazer acontecer, porque sem elas a vida mais parece um deserto árido. (68-69) Uma certa Paz / Amós Oz

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