Mês: fevereiro 2013
Chuva no CARNAVAL

Coisa de menina
Beijar. A melodia chegae devagar, preenche… Altera/transforma e completa o sonho de beijar. Devagar, sem jeito, assim pelos ouvidos, no tato, no ar, no embalo, na risada, na alegria de te encontrar. E pra depois de amanhã, ontem, outra vez agora beijar… Beth Mattos
A última Página
“É estranho e assustador o que se agita de novo em meu cérebro, como as letras num envelope de carta iluminam os mais obscuros recantos da memória, como detalhes intocados há cinqüenta anos ressaltam com grande nitidez. O tênue chamariz, tudo prontamente se apresenta. Sempre esteve ali – silencioso, sem uso, mas presente -, a fim de, num dado momento, pretender corrigir a trajetória de uma vida.” (p.10-11)
“Provavelmente, sempre esperei ser abordado e reconhecido. Vivia num estado de expectativa por esse momento em que, afinal, me é permitido tirar a máscara e dizer: pois bem, agora posso me mostrar.” (p.11)
Michael Krügel A Última Página
Companhia das Letras, 1995.
Inadimplência
Verão outonal. Amanhece com luz, sem sol. Tantas piscinas compradas! Condicionadores de ar! Pousadas abertas, areias limpas… E as cadeiras em gramados com cuia e bomba sem chapéu! Praças bem cheias! O calor se esconde!
Vai surpreender em março, um fevereiro partido…
O Carnaval quem sabe chuvoso! Quem sabe quente no samba sambado! Quem sabe tem cor! Espanta tristeza, sossega demônio, canta alegria, ‘sacode a poeira’, e segue o homem na crença da festa.
Sem medo da inadimplência!
Telegramas
Posso ver baleias! Dezoito ou mais, filhotes! Entre lobos marinhos, e rocha. Baleias em Torres! Penduro quadros, encero móveis. Lustro as pratas. Espaço no armário. Roupa passada, empilhada. Discos de Mozart, Brahms. Canções francesas, Violeta Parra. Marceneiro, prateleiras, eletricista, luminária! Amanhã? Não sei ao certo… Um telegrama. Depois outro…
“Só quando rapaz é melhor amar sem paz; mas já, mais tarde, como agora, quero tranqüilo comer amora pra que todos vejam Gaal me namora, menamora.”
Não me leves os pedaços -, antecipo, impregnada de ausência! Encero, limpo, lustro, espero. Compro violetas. Luz verde na fresta da janela. Venta nesta primavera.
“Quando a quem ama só resta telegrama, até mesmo o beijo escreve-se com o desejo de que o papel tenha gosto de mel; saudade aperta, mas abraço não deserta mesmo que no dia 12 não esteja aí, estarei ao teu lado, contigo, todos os momentos.”
“Para que perdure andar do amor de abraços beijos toques alma, terminantemente proibido refrigerantes, comida salgada, álcool em suas várias modalidades; além todas manualidades exclusivas vida íntima.Pretendo inspeção ocular após dia 25. Beijos, Saudade.”
“Descomunal saudade Gaal, mas não quero apurar viagem; pois necessito tentar vender imóveis agora pra não voltar rápido permanecendo eu lado todo o tempo. Mil beijos. Gafa.”
Conjugo o verbo esperar no Presente, Pretérito e no Futuro do Presente e no Futuro do Pretérito: espero, esperei, esperarei e esperaria.
“Apaga incêndios, contém emoções, evita suicídios, homicídios, afogamentos. Enfim, explica aí. Quem interessar possa que não se aflijam além limites porque poucos dias mais estarei chegando. Beijos. Saudades.”
“Difícil resolver alguns detalhes aqui. Talvez não esteja aí data pensada. Tento cumprir pé da letra, sugestão entregar tudo, mas, burocracia demora obrigando adiar. Beijos, abraços. Quero envolver Gaal. Estejas tranquila Estou sozinho.”
“Retido. Retido. Faço mil planos contigo para julho, também, depois tentando sonhar preciso Gaal pra vencer letargia tomou conta de mim; estarei aí máximo primeira semana de julho esperando até lá te cuides: corpo e alma, cabeça já que coração é ingovernável mesmo. Mil beijos, milhões de abraços.”
“Adiamentos viagem aumentam saudades. Vontade sentir-te estar contigo; demora não é desamor ao contrário. Tardo por querer ganhar tempo extraviado anos não te conheci. Beijos.”
A palavra cresce. Salta. Estanca. A veia sangra. Letargia no espanto do vazio da tua ausência. As chuvas do inverno. Os ventos… É o mar sem baleias. Estou pronta, tardas… Albertina não chora, espera…
as mudas se partiram…
O vento arrancou as mudas do pomar da Lagoa do Violão, galhos das velhas árvores, e lavou a cidade… O cinza é claro. A água espelhada. Os gritos se calaram, e a feira-livre montou as barracas, mais uma quarta-feira…
Cheiro de sal
Olhei pro rio pela porta-janela. Os ipês do jardim, as flores amarelas da trepadeira se esparramavam pelas dobras da sacada de ferro. O verde inteiro do gramado. A piscina, as cadeiras brancas volteando as duas mesas, canteiros também floridos. O jardim quintal de uma casa. A rede que se prendia nos ganchos. E perto da cerca viva a corda espichada, roupas: calça de pijama, cuecas, camisa, um vestido de alças, uma toalha branca… Roupa em varal conta história. Olhei para dentro do quarto: a mesa redonda, papéis, livros empilhados. Tudo tão rápido! Pelas lágrimas vi o mar, o meu mar! Bom aquele cheiro de sal, o gosto e o frescor… Desci as escadas e bati a porta. Os cães latiram, sacudiram o rabo festejando. Tranquei o portão, joguei a chave na caixa de correspondência e comecei a voltar pra casa…
Klimt: o passado presente
Erotismo e requinte. As linhas sinuosas da arte floral se metamorfoseiam em braços e mãos, nádegas e bustos, em corpos femininos sedutores e satânicos. Amor e morte. A herança simbolista do final do século XIX ganha vigor novo nas alegorias desenhadas com mestria e concebidas com audácia: sob for impregnadas de arcaísmo pulsa a sexualidade reprimida, que Klimt explicita em nus femininos, nos lábios e olhos plenos de desejos das mulheres que pinta. E no ouro que esplende em volta delas.
(…) da página 74 do livro de FERREIRA GULLAR: Relâmpagos [dizer e ver] da By Editora Cosac&Naif, 2003 – Klimt: o passado presente
Música e dança
A balança interna! Uma medida cada dia! A energia entra e sai… O perigo. Quem nos vê também percebe que oscilamos… E as plantas! O verde! Mexer, remexer, a conversa… Nos vasos elas estão escravizadas… Sem gramado nem floresta. Sem quintal. Como nós, domesticadas! Passamos a ser apenas o que os outros esperam? Adaptados, sobrevivemos.
Ouço a música da cidade, olho pro verde, e o movimento das folhas faz a dança…



