É o texto, ou as alusões que desbravam o escritor? Como não sublinhar “apesar disso agita um poço de escuro sentimento dentro dele”? Cito, retomo, penso, divago. Como não pensar neste poço de sentimento que cada um carrega, incomunicável… E logo remexer no meu próprio poço, nos meus próprios sentimentos! “Não é bonito, mas fala como beleza, imperiosamente.” Quando a beleza é imperiosa? Quando me debruço numa emoção fervente, quando através dela tudo de melhor aflora, conversa e se manifesta? Por que eu me encanto com os olhos negros, profundos daquela pessoa, e ou desdenho os luzeiros de um olhar azul? O que estou a dizer ao sentir a beleza como força imperiosa? Como explicar J. M. COETZEE sem devorar, e devorando os livros recortar como se fosse um quebra cabeça a ser refeito? A leitura tem este lúdico dentro da gravidade. Embarcamos. Sem passaporte, com toda a bagagem permitida. Volto a casa com bagagem mais volumosa ainda. Mais pesados volumes porque retorno com as minhas coisas, as dele, e toda a África do Sul empacotada. Todos os livros indicados a outras leituras. É preciso ajuda de muitos homens para que eu consiga colocar os fardos em casa, e muitas horas, dias para abrir todos os caixotes. Assim é a leitura. Uma viagem surpreendente, que se alonga por tantos anos! Queria vê-lo… Queria ter autógrafos, mas estou aqui, sentada, longe, imóvel… Amontoo saudade, e já releio, aos pulos… Ele estará tão perto! Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, hoje. Conversando com quem estiver lá, o COETZEE. Como mencioná-lo sem exibir duas palavras, três ou quatro? Como visitá-lo sem ler, e lendo esquecer, e assim recomeçar a ler por um motivo pessoal, mas também por todos os motivos que existem palpáveis? E eu diria: “Será que a sombra dela já está guardada em seu escuro interior? Quanto tempo mais até ela se revelar? Quando se revelar, estará preparado?”
“De onde vem esta força, esta forma amorfa que não tem nenhuma semelhança com a Espanha nem com nada, mas apesar disso agita um poço de escuro sentimento dentro dele? Não e bonito, mas fala como beleza, imperiosamente. Por que Motherwel tem esse poder e não Pollock, nem Van Gogh, nem Rembrandt? Será o mesmo poder que faz seu coração saltar à vista de uma mulher e não de outra? Será que ‘Homenagem a República Espanhola’ corresponde a alguma forma interna de sua alma? E a mulher que estará em seu destino? Será que a sombra dela já está guardada em seu escuro interior? Quanto tempo mais até ela se revelar? Quando se revelar, estará preparado?” (p.104) – JUVENTUDE –
J.M. COETZEE nasceu na Cidade do Cabo, na África do Sul, em 1940. Prêmio Nobel, 2003 – e, caso único – dois Book Prize, em 1983, por Vida e época de Michael K, e em 1999, por Desonra.
Como estará o meu poço?
A paixão move. Porque você não vem?
Vou te escrever longamente! Bom te ver…Pois é!!!!!!