Rosaura e Sonia

I

Sonia penda roupas no varal. Quatro fronhas, duas toalhas de rosto, dois panos de prato desbotados. Depois os lençóis. Onde estarão os vestidos, as blusas, as saias? Nenhuma meia. Entra na casa pela porta dos fundos. Já varreu o alpendre. Lavou a louça. Escutou o rádio. Este dia não termina! No entanto, cada vez que pensa no fim, o fim necessário / fatal da vida, estremece. Não, ela não quer morrer, não hoje, nem amanhã. Pensa no Júlio, na Laura, na Vera. Na cozinha separa ingredientes para o bolo, pensa na batedeira. Descasca as frutas. E sente o cheiro gostoso do amanhã… do amanhecer.

II

Rosaura se surpreende com a chuva pesada. Fecha as janelas. E se deslumbra, atrás da vidraça, a olhar o gramado. O prazer do frescor. Pudesse esquecer aquela inesperada conversa confessional. Sem sofrimento a esbofetear. Uma avó louca. Não, não era louca. Um dia sofreu transtornada. Internaram. Esqueceram dela, simples assim. Morrer é desaparecer da vida das pessoas. Esquecer e ser esquecida. Todos de costas. Já não lembro em qual igreja… Elizabeth M.B. Mattos – março de 2014 – Porto Alegre

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