“tudo corre e chega tão ligeiro / se sonha, já se fez…”

“tudo corre e chega tão ligeiro / se sonha, já se fez…”

Não vai terminar nunca este prazer da palavra. Desatino amuada, aborrecida, quase furiosa de tão esquisita…

Com raiva, com dor, com jeito esquisito de ser. Abro um livro, não. Não quero. Bebo Coca-Cola, mastigo um pedaço de pão com manteiga. Olho pela janela. O telefone? Não ligo. Volto atrás. Reclamo. Eu me aborreço do beijo, do desejo. Depois abro Grande Sertão: Veredas, vou acalmando, riscando. Céus! Que coleção incrível, já usada, eu sei que se despenca em beleza. Transcrevo.

 

Sua companhia me dá altos prazeres.

Em termos, gostava que morasse aqui, ou perto, era uma ajuda.

Tempos foram, os costumes desmudaram. Quase que, de legítimo leal, pouco sobra, nem não sobra mais nada.

Uma tristeza que até alegra. Mas, então, para uma safra razoável de bizarrices, reconselho de o senhor entestar viagem mais dilatada.

Quando o senhor sonhar, sonhe com aquilo. Cheiro de campo com flores, forte, em abril:

Depois dali tem uma terra quase azul. Que não que o céu: esse é céu-azul vivoso

Ventos de não deixar se formar orvalho… Um punhado quente de vento, passante entre duas palmas de palmeira… Lembro, deslembro.

Por esses longes todos eu passei, com pessoa minha no meu lado, a gente se querendo bem. O senhor sabe? Já tenteou sofrido o ar que é saudade? Diz – se que tem saudade de ideia e saudade de coração… (p.51-52) Guimarães Rosa

Cada recorte um recado. Tenho mesmo a sensação do silêncio sussurrante destes sentires que sinto porque te desejo e soluço. Eu me despeço porque não largo canto / lugar seguro de ser eu comigo em linha reta. Mas, tu sabes, tudo te falo, tudo te conto, tudo sussurro. Podia ter sido acaso de morares aqui, e não ali, mesmo longe…

Seria um perto possível visto que o tempo de viver se apequena e a coragem de ir também. Podia ser vizinho. Eu atravessava a rua, pedia uma xícara de açúcar, uma colher pequena de sal e eu te olhava. Tu tocavas minha mão, desenhavas meus pés e oferecias um copo de café, e eu ficava sentada na beira da escada com os pés na grama do teu jardim…Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2019 – Torres

 

70 anos, os teus

1. carta

Saudade nostálgica (é claro) maior do que a idade, a minha, envelheço, já a tua, tão jovem em produção e vida! Acho que este foi um dia dos primeiros, entre outros, de certo, que não lembrei/não lembrarei teu aniversário… Preciso olhar e anotar em todos os calendários o que não pretendo esquecer, assim mesmo! Deve existir um elo, um fio, alguma coisa invisível, mas certa/ justa que une as pessoas, gruda para sempre uma a outra mesmo em tempo distante ou vida apartada/separada/ ou sei lá eu o que acontece…

No dia do teu aniversário eu estava a ler desorganizada e dispersiva, como sou, o livro que traz tua presença… Ri de mim mesma. É preciso rir em algum momento já que estamos a tropeçar em tantas coisas esquisitas!

O carinho nos amarrou, que bom! Tão raro te ver!

Tempo de apostar que amanhã seria sempre fantástico!  Manhãs apressadas, o trabalhar! Que a vida não volta que o tempo também não, e que envelhecemos! Ternura carinho e desencontro! Nada perdido nem esquecido. O carretel… A criança joga o carretel e o fio se estica, quer que a mãe volte e olhe e… , sim, Além do Princípio do Prazer, a reler Freud. Tenho ansiosa inquietação no/sobre o tempo. Pura nostalgia e memória.  Estou rindo! Leio, leio, leio muito. Atrasada comecei a tomar jeito com Guimarães Rosa. O Grande Sertão: Veredas:

“Ah! vai vir um tempo, em que não se usa mais matar gente…Eu já estou velho.

Bom, ia falando: questão, isso que me sovaca… Ah, formei aquela pergunta, para compadre meu Quelemém. Que me respondeu: que por perto do Céu, a gente se alimpou tanto, que todos os feios passados se exalaram de não ser – feito sem-modez de tempo de criança, más-artes. Como a gente não carece de ter remorso do que divulgou no latejo de seus pesadelos de uma noite. Assim que: tosou-se, floreou-se! Ahã. Por isso dito, é que ida para o Céu é demorada. ” (p.47)

Ou

“ […] o mais importante e bonito, do mundo, é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando” (p.48) Tudo na/da 20 Edição Nova Fronteira, 2001 – RJ

Lembro quando o mencionavas, e o desvendavas! Os atrasos! Eu enfiada nos franceses e maravilhada com Gide, Maupassant e Monthertand, Exupéry, lendo Proust aos pedaços, esquecendo os nossos autores. Vês, meu amigo, de tudo tenho saudade! Salada de tantas frutas! E não terminei de escrever. Nunca vou terminar. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2019 – Torres,  Balonismo

canibalismo

Histórias de amor se sobrepõem, se reeditam e se realimentam com outras histórias, também de amor. Canibalismo amoroso. Todas importam!  Não fuja,  não desperdiça paixão de amor e encontro!

Viveria tudo outra vez…

Repetiria, de certo, os mesmos erros! O aborrecido se chama envelhecer, e assim mesmo, tão bom estar viva/vivo. Beth Mattos

Rosa fazia-se obedecer e amar sem estardalhaço nem sentimentalidades.” (p.248)  Affonso Romano de Sant’Anna O Canibalismo Amoroso – O desejo e a interdição em nossa cultura através da poesia –  Edição do Círculo do Livro

cacho de banana

Nem um beijo ou carinho, nenhuma palavra. Perde -se na polêmica idiota um sem, sem e sem fim de vezes… Se fosse possível e fácil fazer as coisas serem/terem/ ou parecerem ao menos lógicas e melhores nos surpreenderíamos, negativamente, porque todos querem mesmo é o complicador, e o difícil.  Complicado e difícil é quem queira mesmo melhorar alguma coisa… Não há saída. República de Bananas… As maduras, devoradas pelos passarinhos. Os políticos pensam/desenham. O cacho de banana vai se multiplicando… Lágrima precisa correr. Pequenas risadinhas acertam tudo. E o tempo,  não podemos agarrar e fazer parar,  segue a nos surpreender. Uma voz resolve,  duas verdades, e juventude. Coragem também.  Dizer sim ou não pode ajudar,  mas é a solução?  Envelhecemos. Medo = manto de justificativas. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2019 – Torres

força vital

Posso ficar pelas beiradas, e fico, sem domínio nenhum. Posso saber um pouco ou muito, mas quanto mais sei o horizonte se afasta… Evoluída (sorrindo) num mar de forças desafio a insignificante inteligência, nada sei. (Já foi repetido tantas vezes!). Tenho que aceitar o mistério, caso contrário, nada aprenderei. E.M.B. Mattos

brincadeira

Escrever tem qualquer coisa de lúdico. Intenso e paradoxal!

Desenho devagar, mas logo, num átimo, o sentimento escorrega e termina na ponta do lápis…

Lágrima lava a alma, e o sol seca. Dourado, o mundo. E.M.B. Mattos – maio de 2019 – Torres 

Aqui te deixo meu coração. A alma já a tens. O corpo sempre o tiveste, até mesmo quando não o tiveste.”

Ama – se tanto e muito! Sem dimensão do que o outro sente, somos um. E não estás mais lá… Paixão/encontro, depois ausência. Sou eu comigo. Onde andarás, eu me pergunto…

G de gorda A de amada A de alegre e L de linda: meu poeta.