ISABELA FIGUEIREDO

“O prazer de ler um livro amortecia humilhações, e era muito maior do que o de brincar sozinha com os bichos ou imaginando guerras com as roseiras do jardim. Um livro trazia um mundo diferente dentro do qual eu podia entrar. Um livro era uma terra justa. Entre o mundo dos livros e a realidade ia uma colossal distância. Os livros podiam conter sordidez, malevolência, miséria extrema, mas, a um certo ponto, havia uma redenção qualquer. Alguém se revoltava, lutava, e morria, ou salvava-se. Os livros mostravam-me que na terra onde vivia não existia redenção alguma. Que aquele paraíso de interminável pôr-do-sol salmão e odor a caril e terra vermelha era um enorme campo de concentração de negros sem identidade, sem a propriedade do seu corpo, logo, sem existência. Nada nos meus livros, que recorde, estava escrito desta exata forma, mas foi o que li!” (p45-46) Isabela Figueiredo Caderno de Memórias Coloniais

Isabela Figueiredo nasceu em 1963 em Maputo, Moçambique, e mudou-se para Portugal em 1975. Professora e escritora, é uma das vozes mais poderosas da literatura portuguesa contemporânea.

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