
A vida se desorganiza. As horas se sacodem pequenas… Pequenas lembranças, anotações do passado-presente no papel rabiscado… Uso amoras azuis, bebo o suco, como frutinhas do pote chinês. Alguém do outro lado. Palavra! ‘Gostei, não entendi, não sei o porquê, talvez esteja certa… ’Interlocução. Virtual, impreciso. E se a angustia aperta, e se fico impotente fecho os olhos. Hoje amanheceu frio, cinzento, úmido. Escuro! Velhas cartas cinzentas!
Lembrança extravagante. Cinzas engraçadas? Ou só passado? Ou apenas uma carta?
Querida Elizabeth:
Recebi a tua carta. Vejo-te a beira do mar. Enche, pois, as tuas mãos de mar, enche os teus olhos de luz. Na minha lembrança, tu és uma presença. Eu perdi o jeito de correr pelas praias e de me misturar com os peixes. Faz isso por mim. De Torres guardo este fragmento, por certo o mais agreste, o mais autêntico. (aqui tem um desenho) Ao pé do penhasco, o mar enrola-se como uma grande cobra verde. Ao longe ele é sereno. A distância dá placidez as coisas. Tenho produzido pouco ou nada. Espero melhores dias. Mando-te a minha saudade que é muita.
Afetuosamente, o Iberê
Rio, 28 – 1 – 75.

