Sentei para escrever. Senti muito frio. Um gole de uísque. O sol entrou pelas duas janelas abertas, assim mesmo senti frio. Pensei em caminhar. Desisti. Planejei/preparei um banho. Gosto de dormir bem cedo, e gosto dos demorados, ou rápidos banhos de chuveiro. Demorado, perfumado. Quente. O banho de banheira. Depois uma ducha para lavar os cabelos. Não sei se foi toda uma hora, mas foi demorado. Completo. O prazer sobe devagar, e se apossa do corpo, amolece o pensamento. Toca o sentimento perfeito de sentir. Enrolada na toalha recebendo o quente do sol. Direto no corpo. E me estiquei na cama sentindo o cheiro de alfazema, vendo as flores azuis, miúdas. Escutando o vento na conversa. Quase adormeci. E a presença da minha mãe encheu o quarto de alegria, e como se pudéssemos ainda ficar juntas ela me disse: um banho quente e demorado pode cansar! Olhei para ela, não respondi.
Um banho quente e demorado dá prazer, luxúria, quase um pecado. Lassidão. O sensual do creme, do óleo entre as pernas, nos seios, no pescoço. Nos pés, entre os dedos, e já queremos dormir. Um banho demorado… E, significativamente, o prazeroso ficou cansativo. Ela tem razão. Quando fazemos setenta anos cansamos se o banho é demorado. Estou envelhecendo.
Depois do banho, perfumada, preparada, pronta, adormeço. Não olhei para o pé de louro do jardim. As duas amoreiras. Nem escutei os passarinhos. Ou as vozes. Puxei o lençol. Escondi o corpo fechei os olhos. Envelheci. E logo estava dormindo. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2016 -Torres
“ Finalmente, entretanto, fez uma pausa. Estava descrevendo, como fazem sempre todos os jovens poetas, a natureza, e para acertar com precisão o matiz de verde olhou (e aqui revelava mais audácia que a maioria) para a própria coisa, que por acaso era um pé de louro que crescia debaixo da janela. Depois disso, é claro, não conseguiu escrever mais nada. O verde da natureza é uma coisa, o verde na literatura , outra. A natureza e as letras parecem nutrir uma mútua e instintiva antipatia; junte-as e uma destruirá a outra.”(p.13)
Orlando uma biografia, Virginia Wolff
Gostei da sensualidade que colocaste no texto, bem descrito e saboroso de ler.
A dureza do envelhecer também sutil e bem colocada
Ótimo!
Dado: relendo teu comentário. Senti saudade.