Escrevo, mas você não está … outras vezes eu podia escrever e saber que você estava perto muito perto chegando ao escritório, ao jornal. Escrevendo uma carta, assinando um texto … Em Buenos Aires, São Paulo ou na Suíça e perto. Sempre estava comigo. Atravesso o portão, e já na calçada sonho com o outro lado. Estou em casa depois de um dia de bastante trabalho, trago suas cartas. Enquanto leio estou ao seu lado, escuto a voz, e sinto o cheiro … Assim eu me agarro de carta em carta. Espero pela manhã a carta da noite, e encontro na volta, a carta da manhã. Teus enormes telegramas. Não raro leio de pé antes de subir a rua, e muito me escapa porque caminho, tropeço, e também porque leio com avidez. Leio sem tirar o casaco para não perder tempo algum. E muito me escapa, há que reler, e no fim há duas cartas, uma primeira que soa como música, e uma segunda que é feita de palavras. Não vais chegar na hora nem no dia marcado. Houve outro contratempo. Vais telefonar. Não atendo ao telefone porque engasgo com tantas datas prometidas e adiadas. Uma carta olhos azuis, outra a magreza, e já na outra o dia incerto a espera …E leio o que se passa do outro lado do mundo, imagino como você se movimenta, o que faz, ou se está com medo. Talvez você sinta medo. O medo está nas ruas. Bandidos engravatados. Esperando … Respiram este medo, e tecem macabros assassinatos, ou sinistros desvios. Medo é o sentimento chave do momento. Também esperar. Crimes e tantos acidentes inexplicáveis!
Lamber a faca numa refeição, ou depois dela é no mínimo solitário, esquisito, mas sempre proibido, interditado. De guerra o gesto porque nela existe a liberdade de tudo poder. Até comer batatas cruas. Mas não estamos exatamente em guerra, e a mesa para o chá está posta. Empurrar o prato é um gesto de enfado e impaciência. Esticar as pernas, mais enfado. Eu me escandalizo, não reconheço você. E penso que pode ser descuido de envelhecer … Será que eu também estou/ sou assim largada gulosa glutona, voraz? Engasgo. Lamber não pode acontecer. Equívoco? Não te reconheço.
Penso. Você esqueceu de me levar para o nosso mundo, e me largou a esperar por você … Vou brincar no banco da praça, e depois reler as cartas diurnas as notívagas, as cartas insones mais tarde enquanto penso que me pensas.
De relance, vi uma menina esperando pela mãe… fugaz…