“E, como em todas as vezes que eu via ou vivenciava uma coisa bonita, pensei em Ingvild. Ingvild era uma pessoa viva que existia no mundo, tinha uma vivência própria de mundo, memórias e experiências próprias, tinha o pai e a mãe dela, as irmãs e os amigos, o cenário onde havia crescido e pelo qual havia caminhado, e tudo aquilo estava nela, toda essa complexidade enorme que é uma outra pessoa, da qual vemos tão pouco, mas assim mesmo o suficiente para simpatizarmos com elas, para amá- las, porque não é preciso mais nada, um par de olhos sérios que de repente são tomados pela alegria, um par de olhos brincalhões e provocadores que de repente se tornam inseguros e introspectivos, que tateiam no escuro, uma pessoa que tateia no escuro, existe coisa mais bela no mundo? Com toda aquela riqueza interior, mas assim mesmo tateando no escuro? Vemos isso tudo, nos apaixonamos por isso tudo, e é pouco, talvez digam que é pouco, mas é sempre certo.
O coração nunca erra.
O coração nunca erra. Nunca, jamais o coração erra.”
(p.65-69) Karl Ove Knausgard – Minha Luta 5 / A descoberta da Escrita – tradução do norueguês de Guilherme da Silva Braga – Primeira edição – São Paulo : Companhia das Letras, 2017.