“Quando tudo estiver definido, vai ser tarde demais. O momento é sempre agora. Não existe passado, é o que a gente descobre. Tudo que é real é uma espécie de agora.”
John UPDIKE – BUSCA o meu ROSTO
“Quando tudo estiver definido, vai ser tarde demais. O momento é sempre agora. Não existe passado, é o que a gente descobre. Tudo que é real é uma espécie de agora.”
John UPDIKE – BUSCA o meu ROSTO
Vida e fantasia. Nós dois a sonhar amarrados no avesso do dia, aquele em que nós dois não estamos. Na fantasia da fantasia nos debruçamos. Sinto trepidar o que antes chamei de amor ou paixão. Não somos nada que possa ser desenhado por um modelo daquilo que já vivemos. Estamos a brincar. Do outro lado a vida comum, lisa, arranha estreitos conceitos de cotidiano. Posso cantar …, ou dedilhar o piano. Quero que dances comigo corpo colado no corpo. Transpor a barreira, o avesso. Eu te toco, sou a menina de treze anos. Feitiçaria e mágica nestes gestos repetidos. Lembranças: o cheiro da casa, cantos escondidos de brincar. Digo do amontoado da alma. Selo diabólico e insano desejo de ser aquela que decodifica, desarruma a casa.
Será a convivência a contínua dor dos casais? O que de fato angustia e agita? O que nos faz permanecer imóveis? Enquanto dormes solto e pesado escrevo ansiosa. Eu te quero tanto! Neste caminho os pés não sangram. Morno acarinhar que tanto necessitamos! Elizabeth M.B. Mattos – junho de 2018 – Torres
Quando olho caixa de dentifrício sabonete vejo o trem apitando: do papelão janelas rodinhas portas e até chaminé. Se coleciono vidros de perfume, potes de cremes ah! É a loja de quinquilharias. Quanto aos livros livraria de alugar. Cafeteria confeitaria ou bar. Brinco de fazer. Ócio esquisito de vida parada. Atropelo. Carruagem de abóbora: reconstrução emocional. Pago a prenda, e me liberto do convencional. Do desastre de perder noivo. Liberdade cigana. Catecismo gaúcho desaparece. Do convento ao casamento. Da ruptura à liberdade.
Caminho verde. Flores cheiros: mar música risada carioca. Limite da tristeza. O sangue muda a química interna de menina, acordo mulher. Aceito confissão e amor. E a fada traz o homem com quem eu viria a ter filhos. Conversas de amanhecer naquele Rio de Janeiro de 1966 -1967. Ditadura acalma calçada. Silêncio na cidade. Automóvel janela aberta descansados… Beira mar. Cheiro de terror e gosto de amor. Ditadura militar anos de ferro: arranca liberdade assassina gente jovem, escandaliza e emporcalha quartéis. Palco da liberdade. Eu não volto para casa. Neste Rio de Janeiro caminho pela noite e me deixo ficar. Se o medo no Brasil se alastra, o meu desaparece. Na maresia música salina coloco emplastro na ferida. Calor de agosto, amoleço o amanhecer que entra na pele. Já em dezembro, noiva outra vez, reconstruo a estrada de Petrópolis em passeios. Novos amigos saias mais curtas mínimos biquínis.
Balaio e Sacha´s para dançar. Bistrôs nas ruas de Copacabana. Ipanema jantar com velas. Memória de festa flor permanência e encantamento. Anestesiada vivo o primeiro conto de fadas carioca. Tudo devido e permitido, inclusive o prazer. Nenhuma regra nenhum poder. Experimentar sem passado. Na cidade luz mar e amor do Brasil, no Rio de Janeiro. Elizabeth M.B. Mattos – junho de 2018 – Torres
Ser o que somos por dentro, desejar sempre por inteiro. Rir na hora de rir. Cozinhar ou limpar. Embalar os bebês. Ter filhos. Amar animais e sorrir. Dar uma gargalhada. Chorar com lágrimas por dentro e por fora. Enternecer, fazer amor e amar o amor e falar de amor sem nada saber. Ser natural. Andar de meias de lã pela casa. Ter camisola de flanela e ficar o dia inteiro, assim, nos pijamas. No verão camisola de alças. Nada apertado. Ter cabelos compridos até envelhecer, e trançar. Andar de pés descalços. Poder lavar o rosto sem maquiagem, ser perfumada. Colocar batom e ficar mais bonita. Usar brincos e colar de pérolas. Beleza importa, mas nem tanto! Alegria mais. Tomar muitos, muitos, banhos durante o dia e antes de dormir, um estupidamente quente e outro ao amanhecer e voltar para a cama. Usar no mínimo cinco travesseiros. Lençóis de algodão passados, e com milhões de fios. Nunca cetim. Beber café preto e comer pão com manteiga. Gosto de pastel, sonho e camarão e berinjela e carne de panela. Ler em voz alta para a filha, para o amigo, para o amado, ou para o neto. Conversar até cansar e enfiar um assunto no outro sem sentindo e ninguém reparar. Exaustão e envelhecer descartei ( sorrindo). Entender o que o outro diz. Não entender porque foi embora sem se despedir. Rir. Brigar. Implicar. Ter amigos e amar todos com desejo, e também distância. Não ter proibições e assim mesmo obedecer. Assustar e aproximar. Colocar as mãos na terra. Cavar. Plantar e molhar. Ter flores nos vasos. Perfume na casa. Ter um cachorro, ou um gato. Nunca pássaros em gaiolas. Tapetes fofos e limpos. Poder caminhar sem roupa pela casa. Ter as janelas abertas e sentir a maresia entrando.
…ficar arrependida. Caminhar na praia. Nas calçadas. Caminhar, caminhar. Nunca fazer exercício aeróbico ou querer ser mais bonita do que se é. Não ficar doente. Morrer fechando os olhos sem estardalhaço. Não morrer é melhor. Gostar de massagem. De comida italiana e vinho tinto encorpado. Nenhuma bebida doce. Sucos de todas as frutas. Água. Mar e serra, campo e sol. Lareira com fogo. Se encolher nas cobertas. Amanhecer no dia. Noite com estrela ou noite chegando, entardecer. Estar viva. Ser beijada na hora certa com o amor certo. Deixar ir para sentir saudade. Dormir a qualquer hora. Acordar no meio da noite para namorar. Ter filhos. E abraçar estes bebês. Escrever, escrever, escrever sem saber o porquê, e sempre. Encerar e fazer brilhar o chão. Sentir o cheiro do mato. Fazer amor de manhã cedo com o corpo aberto para o prazer. Ter água por perto. Rio ou mar ou lago ou lagoa, nunca piscina. Gramados. Cheiro de terra. Um abraço inesperado, uma voz desconhecida. Uma palavra gentil. Sentir medo. Chorar. Poder sair tantas vezes que tiver vontade para poder voltar. Comer laranjas e bergamotas, morangos e maçãs. Mamão com limão. Falar francês. Entender espanhol. Viajar na imaginação. Lamentar não ter ido a Itália nem conhecer Nova York nem a Noruega, nem Londres, nem o Brasil. Andar de navio. Ir a Buenos Aires. Fazer tricô. Bordar florzinha amontoada nos jeans rasgados. Ter filhos e ter cães. Ser livre e rir. Ser alegre e triste. Sentir saudade de amor. Não morrer. Viver para sempre. Descobrir. Fazer amigos. Chorar porque eles se foram. Esquecer. Amar outra vez. Escrever. Apagar. Se surpreender. Ler livros muitos livros. Ir ao cinema, ao teatro. Fechar as janelas. Sopa de ervilhas com pedacinhos de pão tostados na manteiga. Dançar. Escutar o piano e ser invadida. Comer frango assado com as mãos. Rock e futebol: ver jogos, torcer, gritar e dormir exausta. Fazer amor devagar, sentir o corpo, o olhar e então ficar apaixonada pela paixão de ser dois. Esquecer. Estar viva. Banho quente. Banho frio. Não morrer, não te esquecer. Espiar o amor chegando, dar as mãos, sorrir um para outro. Baixar os olhos. Ir ao encontro. Não ter medo de errar nem de sofrer nem de chorar nem de chegar. Nunca atender ao telefone. Escutar ele tocar. Escutar música todos os dias. Qualquer música. Ligar o rádio. Receber cartas. Fechar bem a porta. Estar feliz e alegre. Não saber o que acontece no mundo. Ter os filhos por perto. Ter netos. Ter amigos. Ser alegre. Rir. Eu já disse. E chorar quando rejeitada, empurrada, esquecida. Intimidade num repente. Ser arredia e vulnerável. Descoberta e desejada. Preguiçosa e distraída. Sentir o verão e o inverno. Não morrer. Elizabeth M.B. Mattos – junho de 2018 – Torres

Valentina

Joana e Valentina

Joana na casa de Santa Cruz do Sul

Foto de Ana Maria Vianna Moog em junho de 2018 – Torres

“ Mas, minha querida, talvez a questão seja justamente esta: não é para ter enredo nenhum, porque não existem mais enredos; os filmes, tal como a pintura, segundo você, ou segundo o A., foram obrigados a parar de contar histórias. […] Uma história pressupõe um autor, que manipula os personagens lá do alto, que manipula a nós lá do alto, com algum objetivo moralmente inteligível, e ninguém acreditava mais nisso, depois do Holocausto, da bomba atômica…” (p.247) Jonh Uodike Busca o meu rosto
…, e tem o livro da francesa que já citei no Amoras e não estou encontrando agora O sal da VIDA o que faz a vida valer a pena. É o título que FRANÇOISE HÉRITIER dá ao seu livro. Ela sugere que todos façam suas listas e se libertem. Muito bom de fazer, pode ser mais completa a lista, indefinida, sem finitude. Estou a me lembrar de várias coisas que não escrevi. Dormir sem sonhos. Sonhar acordada. Desejar. Esquecer. Dançar. Pensar e pensar e pensar. Acreditar. Elizabeth M.B. Mattos – junho de 2018 – Torres
Françoise Héritier, 1933, antropóloga e etnóloga. Obra: Deux soeurs et leur mère e Masculin/ Féminan, é professora honorária do Collège de France, onde dirigiu o Laboratório de antropologia Social ( criando a cátedra de estudos Comparados das Sociedades africanas) sucedeu Claude Lévi-Strauss (a pedido do próprio).
O SAL DA VIDA foi publicado, entre outros países , na Alemanha, Inglaterra, Japão, Portugal, Espanha, Itália (onde, assim como na França, se tornou best-seller).
Carta papel, pequena referência, escrito fragmentado: material de construção. Paciência trabalho braçal. Criar escrever ou pintar pressupõe crítica revisão, e a última pincelada, o esforço. Consciência da tela acabada. Sempre a me propor começo. Inovar. Estou a me esvaziar da obsessão de te pensar. Sinto tua falta. Beth Mattos – junho de 2018 – Torres

Reduzir no espaço tua lembrança. Transformar o tempo. Chegar outra vez no começo de ver/sentir e esperar, … não encontro motivação. Vazio o espelho (sem reflexo). Experiência bagagem sem caminho. Desconfio estremeço volto atrás.. Não completo o círculo. Eu me apaixonei, e tu sabes. E.M.B. Mattos Torres, junho de 2018.
Desta insônia do frio escrevo. Do sono à vigília. Se houvesse resposta … se eu pudesse fazer a mágica seria covarde risonha sem ambição. Esconderia esta orgia. Não posso/ não consigo voltar para mim. Enfeitiçada: sempre que me visto imagino que estás a me olhar. Mar agitado perigoso no meu corpo. Desejo ardente estranho. Que linhas coloridas se estendam neste carnaval de amar. Elizabeth M. B. Mattos – junho de 2018 – Torres

“Com base na sua própria experiência de vida, você acha que uma pessoa seduz a outra? Não será que as duas pessoas emitem sinais – se cercam de auras atômicas – tem o efeito de fazer com que uma se aproxime da outra? As pessoas se juntam guiadas pelo instinto que lhes diz que sua vida pode se beneficiar, que haverá um ganho líquido – como é mesmo que dizem os físicos? um ganho líquido de ordem.” (p.210 – 211)
John Updike – Busca o meu Rosto
Avança segue sai da rotina. Olha o desconhecido (o novo). Avança amigo. Eu te quero bem. Tantos os possíveis caminhos! Não desconfia, nem tenhas medo. Não espera , avança. Verás flores e perfume ao alcance da tua mão e um mundo aberto iluminado a te esperar. Beth Mattos – Se me ouves – Junho de 2018 – Torres

Foto de Ana Maria Vianna Moog – junho de 2018 – Torres
Tempo de novos ventos. Digo que este final de 2013 foi tumultuado desde a minha volta do Rio. Espero me sentir melhor para te visitar. O que será sentir-se melhor? Socializar. No momento tenho dificuldade de conversar. Estou entre caixas e caixas, e malas o que me deixa inquieta, nada agradável. Sair de casa, nem pensar. Enfim amiga, sigo escondida, escondidíssima. Tento controlar ansiedade. Aquieto a alma. Numa destas noites de exaustão, peguei o celular na gaveta, e num gesto estabanado apaguei TODA, mas TODA agenda, estou, como se diz, incomunicável. Está sou eu. Elizabeth M.B. Mattos