foto de menino

1.

Nublado quente e esquisito. Sem governador, nem presidente. Tensão do mal-estar. Apequenar, encolho. Fico a pensar, a imaginar como será amanhã …, um depois de amanhã. Já tenho sulcos no rosto, chamam de rugas. Em volta da boca também. Apenas os olhos se espantam, esquisito esta coisa de envelhecer. E devagar. Um dia depois do outro, tanto envelhecer! O corpo se encolhe. Um ano, ou dez meses, ou uma hora que tentei estar contigo para ganhar esta aventura de rejuvenescer na memória. Nestas memórias recentes de ventania. Nas ondas de mar. Invasão de luz, descobertas. E depois, uma insatisfação calma que talvez seja apropriado definir como tristeza. Fecho a porta com cuidado, volto para mim. O alvoroçado me deixa exigente, tu gritas/ sussurras: “não posso, não quero, não devo”… Sonho o sono tranquilo da porta fechada no delírio. Imagino sem permanência. Se me afasto, mais fundo mergulho, não compreendo. Para o amor vou me despindo. Tiro a roupa devagar, sem pudor, exercito. Outras vezes enrubesço e faço tudo às pressas, já no escuro. Quero ver, mas tenho medo de ver. Não é timidez, mas covardia mesmo. Elizabeth M.B. Mattos

Sempre, imaginar será mais que viver.

O trabalho do segredo vai infinitamente do ser que esconde ao ser que se esconde. O cofre é um cárcere de objetos. E eis que o sonhador se sente no cárcere de seu segredo. Gostaríamos de abrir e gostaríamos de nos abrir. […]

Quem enterra um tesouro se enterra com ele. O segredo é um túmulo. […] Joë Bousquet escreve: ‘Ninguém me vê mudar. Mas quem me vê? Eu sou meu esconderijo’. ” Gaston Bachelard A Poética do Espaço

Quando o tempo tem este gosto de quero mais, por favor, espera por mim -,  como posso te explicar o que eu sinto sem olhar no teu olhar e, então te deixar porque queres me deixar, vai ser assim, nós vamos nos largar … Esquisitices da vida. Recorte estranho …, mas não imaginas o gosto do prazer que foi te encontrar neste acaso de uma foto de menino. Não consigo. Não consigo te esquecer. Beth Mattos

amor ardido

Acontece uma coisa estranha quando se escreve sobre si mesmo. Isto é, o eu direto da pessoa, não o eu projetado. O resultado é frio, implacável, crítico.” (p.542) Doris Lessing  O Carnê Dourado

Comecei a ler os livros de Doris Lessing em Santa Cruz do Sul, 1983. O Carnê Dourado: história de mulheres livres – mulheres sem maridos em consequência de fracassos matrimoniais.  Nada importa. E se contar parece uma bobagem. Estranha inclinação. Livros se cruzam.  Memórias de Salman Rushdie , sigo devagar, lenta. Registro a conversa DORIS LESSING..

Doris Lessing estava escrevendo suas memórias e foi discutir o livro com ele. A maneira de Rousseau, ela disse, era a única maneira; você tinha de dizer a verdade, contar o máximo de verdade possível. Mas escrúpulos e hesitações eram inevitáveis.’ Naquela época, Salman, eu era uma mulher bonita e havia nesse fato implicações que você talvez não tenha levado em conta. As pessoas com quem eu tive, ou quase tive, romances … muitos eram famosos e vários ainda estão vivos. Eu penso mesmo em Rousseau’, ela acrescentou, e espero que este livro seja um trabalho emocionalmente honesto, mas será justo ser honesto com as emoções dos outros? […] Ele queria dizer, mas não disse, que estava de novo imaginando uma vida sem ser escritor, pensando na paz e tranquilidade, talvez mesmo na alegria, dessa vida.”(p.367)

… estou covarde, e volto a pensar. Sobre caminhos internos / interiores quase tudo  foi dito. Nunca me senti tão … Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018

SALMANNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNN

DORIS LESSING LIVROSSSSSSS

teus olhos veem

Ao espelho olho meus olhos. Vejo o verde que teus olhos veem sem me ver… O vento (venta tanto!), se mistura ao pensamento. Agitação estranhada. Sobressalto ventoso quando teus olhos descrevem os meus olhos. Rejuvenesço. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018

FOTO PARA HÉLIO daquele tempo

transformação e o mesmo

“Nada pode ser mais espantoso do que a vida. Exceto a literatura”. Ibn Zerhani

Abro um livro ansiosa, outro Orhan Pamuk -, o livro que ainda não abracei O livro negro, reconheço as outras leituras,  a retomada, o cenário, a Turquia, o Bósforo …, e as intenções sérias do meu dia seria arrumar, limpar, fazer, conservar, ouvir música. É tudo repetidamente o mesmo. Amanhã vou até a beira do rio Mampituba almoçar : vou pedir um camarão, uma cerveja , talvez batatas … e vou ficar quieta esperando o prazer. … eu me sinto impotente, oscilando,  e … não passou, ainda não esqueci tudo que pretendo conversar contigo. E. M.B. Mattos 2018 – outubro – Torres.

desordem mesa preta tudo

 

 

conhecer sem ver, intimidade possível

…, a bibliografia derrama e esparrama sombra -, teu traço. O processo intelectual,  o desenho definitivo de uma pessoa abraça sentimento e fazer. Pensar junto é estar com alguém / compartilhar, dividir. Contar seria / ou pode ser viver com alguém. Quando nos apercebemos/ ou nos damos conta da importância intelectual de um vida aceitamos/ entendemos que viver é, essencialmente, pensar: não há vida sem a trajetória da reflexão. Não se pode agir e abandonar o essencial -, a interioridade, o vigor da inteligência, a inquietude. Abandonar o universo interior – o EU. Assim a descrição deste mundo que passa, permanece …, caso contrário, tudo será apenas a I L U S Ã O de conhecer alguém que se apoia num agora, efêmero, quase sombra, apenas ilusão … Conhecer alguém não é compartilhar a cama, o almoço, ou ver / olhar para alguém. Não é apenas estar, no espaço e no tempo, com alguém. Não basta descrever o momento, escutar a lágrima, presenciar o fato, ou ver televisão juntos. Para nos avizinharmos, realmente, de alguém,  é preciso descobrir a alma, e caminhar pelos mesmos caminhos internos. Pensar este alguém, entender uma pessoa no seu fazer pode ser descortinar o trajeto intelectual …, este caminho é o mais importante de todos. É ver através de. Aquela estória do espelho, reflexo e imagem, transparência no vazio que pode ser o outro em mim, e eu no outro já foi repetida, explorada …, sei lá. Na verdade não preciso conviver no sentido literal da palavra, mas trilhar a bibliografia intelectual, e assim, mergulhar no outro. Pensando! Confuso, difícil, mas esta me parece a única intimidade possível. Ou a carnal / a intimidade de corpo / sexual, – esta também é um conhecimento sagrado. Comunhão carnal, ou espiritual, através delas chegamos ao outro. Ou dividimos espaço / casa e tempo e experiência, ou a mesma cela sem nos determos no fio condutor da inteligência / sensibilidade. Ou somos estrangeiro ao outro, se terminar o espaço, nada mais saberemos do outro, até o rosto esquecemos, fica a superfície, um reflexo … conhecer é reconhecer sem ver, mesmo no escuro, no silêncio, sabemos da voz do olhar e sentimos o corpo sem tocar. Saber na intimidade absoluta na leitura completa da outra pessoa pressupõe conhecer a narrativa intelectual desta pessoa. Assim, ser no outro, e o outro ser um pedaço de nós mesmos pode ser literal, ou apenas uma metáfora, bem, se for literal é completo. Elizabeth M.B. Mattos – outubro de 2018

O mundo dos velhos, de todos os velhos, é, de modo mais ou menos intenso, o mundo da memória. Dizemos: afinal, somos aquilo que pensamos, amamos, realizamos. E eu acrescentaria: somos aquilo que lembramos. Além dos afetos que alimentamos, a nossa riqueza são os pensamentos que pensamos e não deixamos apagar e das quais somos o único guardião. Que nos seja permitido viver enquanto as lembranças não  nos abandonarem e enquanto, de nossa parte, pudermos nos entregar a elas. […]  O relembrar é uma atividade mental que não exercitamos com frequência porque é desgastante e embaraçosa. Mas é uma atividade salutar. Na rememoração reencontramos a nós mesmos e a nossa identidade, não obstante os muitos anos transcorridos, os mil fatos vividos.” (p.30-31)  Norberto BOBBIO in  O Tempo da Memória 

Norberto Bobbio nasceu em 1909 no Piomonte. Sua formação inicial foi em filosofia política e jurisprudência na Universidade de Turim. Figura de notável significado moral, tornou – se um dos mais influentes teóricos da esquerda italiana e um dos mais importantes políticos contemporâneos da Europa. Em O TEMPO DA MEMÓRIA, Bobbio traça um irônico e honesto auto – retrato. Editora Campus – 1997 – Rio de Janeiro

O honesto e a ironia e esta intensa, desenfreada e nostálgica necessidade cresce e me alimenta. Este livro, e todos os que li de BOBBIO, é boa sombra. Reencontrar amigos da juventude, adolescência e mocidade -, um desejo de permanência. Percorro a memória, e volto a me apaixonar e encantar pelos jovens que um dia nós fomos. O incrível destas memórias e desejos é o efeito. Vibrações alegres e adolescentes em relação ao amor.  Há sempre um novo amor e amado, e porque não foi dito tudo / nem sentido / nem compartilhado, sigo até o fim, a esperar.  Alguém pode entrar, e pisar no meu gramado. Atenção! Que não pises nos meus sonhos / nem destruas meus sonhos.  Caminhe com cuidado, não esqueça, estamos juntos nesta memória. Beth Mattos

P.S. Certeza de que os amores findos, terminaram com serenidade, e sem sofrimento, apenas terminaram com tristeza, e ainda posso pensar (1997 – Torres)

o sono

…. madrugada, e não estás onde eu te penso. Que o sono te abrace!

 

E.M.B.Mattos …, chegou a ficar perfeito. Quase nada, apenas o que sinto. Sigo seguindo e não perdoei. 2018 – outubro

peregrinações de amor

Já foi dito já foi escrito já foi pensado já aconteceu. Já terminou já voltou. Já não sei… Já não falo nem digo, nem vejo. Tudo misturado. Ela sabia.  E.M.B. Mattos – outubro de 2018

“Um caos interior, semelhante àqueles vulcões secretos que, de repente, erguem os sulcos nítidos de um campo pacificamente arado, aguardava, aguardava , por trás de todas as desordens do rosto, cabelo e roupa, uma fissura por onde explodir.” (p.13)

Nas múltiplas peregrinações de amor, Sabine era ágil em reconhecer os ecos dos desejos e amores maiores. Os grandes, especialmente se não tivessem tido morte natural, jamais morriam por completo e deixavam reverberações. Uma vez interrompidos, rompidos de maneira artificial, sufocados acidentalmente, eles continuavam a existir em fragmentos separados e infinitos ecos menores.”

Tudo que tivesse sido arrancado do corpo, assim como da terra, extirpado violentamente, cortado, deixava debaixo da superfície raízes muito ilusórias, muito vivas, todas prontas para medrar de novo sob uma associação artificial, por meio de um enxerto de sensações, dando nova vida a esse transplante de memória.” (p.100 – 101) Anaïs Nin Uma Espiã na Casa do Amor

Anaïs Nin nasceu na França, em 1903. Viveu durante anos em Nova York mas retornou à Europa na década de 30. Foi discípula das descobertas psicanalíticas e precursora do feminismo e da revolução sexual. Faleceu em 1977

melhorzinha

liberdade

“[…], a liberdade não diz respeito essencialmente ao que as pessoas podem fazer, ao que são capazes de fazer …, mas a responsabilidade de cada pessoa pelo que faz ou pelo que não faz em qualquer circunstância. […]  A liberdade não é livre de responsabilidade, liberdade é fazer escolhas e, por conseguinte, assumir responsabilidade.” Gary Cox

pinacotecaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa

cães

se eu tivesse uma casa/jardim/quintal recolheria cães perdidos, os chamados sem raça definida: maltratados, e sofridos andarilhos

se eu pudesse eu resolveria o problema destes cavalos escravizados atrelados em carroças que correm ao chicote sem saber o por quê

o bicho homem pode ser tão cruel! Indefinidamente cruel

E.M.B.Mattos – outubro de 2018

na fazenda com os cães