Insônia. Mais do que falta de sono, falta de energia, falta de sentido. O amor neste tom confidencial que empresto à vida. Fico a contar a falta, o desejo. Faço projetos que parecem tão próximos do possível. Com o passar dos anos o sentimento de reconhecimento desaparece. Sou estrangeira de um mundo esquisito, o meu. De repente, isolada! Uma voz sem continuidade. Queixas cheiros indesejáveis, o movimento de ir e vir das pessoas, inúteis! O corpo dói: costas pernas pés. As mão, até os dedos doem. Qualquer movimento, pedalar, andar, dançar, nadar, experimentar parece sem sentido. A pessoa que importa não está mais aqui, não existe. Sinto medo. Sentimento da insônia, ou a própria e seca insônia no comando? Sem fome, sem sede, mas desperta, ataca. Nada que não possa se resolver com um comprimido. Nada que possa desaparecer. Amanhã de manhã estarei igual. Desânimo! Enquanto escrevo escuto as vozes dos vizinhos praianos. O mar murmura. Carros buzinam, não importa que seja noite e tão tarde. Cães ladram assustados. Paradoxalmente o isolamento se impõe. É preciso permanecer na caverna: esconderijo certo.
Tenho aquela ideia de que todos estão perfeitamente perfeitos nos lugares onde estão: alimentados, sem sono, aquecidos, sorrindo. Não queremos ser necessários, queremos ser transparentes, mas no fundo, lá dentro a questão é mais séria: gostaria de poder me enxergar no centro, mas não sou o eixo, sou o galho que começa a vergar porque não consigo seguir o fluxo. Perde-se o hábito de querer o amor. Desistimos de desistir para desviar, terminar para encontrar, recomeçar, a solidão chega como o fim do papel, com a ponta do lápis quebrada, o livro com ponto final, o copo vazio. A solidão pesa com o próprio peso do corpo. Fica tudo invertido. Nem um cálice de vinho, depois outro, pode resolver. Nem o banho de mar, nem o sol. Nem ressuscitar o amigo, a coragem, nada modifica este estranho vazio. E estranheza vem do tempo que perdi a casa, o centro, a segurança; quando resolvi deixar para traz a vontade de alguma coisa, apenas seguir… Do tempo de casar porque era preciso casar. Vem do tempo de largar o casamento. Aquele vazio do fracasso afetivo. Do amor sem amor. Vem do tempo que me deixei ficar no Rio de Janeiro. Do tempo de voltar para o Rio Grande do Sul. Vem do tempo de apagar incêndios. Vem do tempo de sucumbir aos tropeços, e se deixar levar… Enfrentar o trabalho. Largar os livros, e estudar. Deixar de estudar. Esquecer a menina. Largar o trabalho, a escola. Vem do tempo que me apaixonei por um amontoado de palavras, pelo virtual. E depois entender que nos apaixonamos por um personagem, não por um homem. Ou se chegamos a amar um homem, ele se transforma subitamente em personagem. Ou num desconhecido. Um estranho que mora na mesma casa que moramos. Depositei tanto sentimento, tanta força, tanta energia num sentimento que desapareceu como desaparece um saco de areia na beira do mar. Claro que existem os filhos, os irmãos, o amigo, o amante, o desconhecido que atravessou a rua, os cães, as crianças, os netos, os tios, os primos, os conhecidos, os sorrisos, as perguntas, os sobrinhos. Mas na insônia ninguém existe. Existe a sombra da angústia de uma noite interminável e solitária. Bom! A pensar, mas é apenas ela, uma noite insone, depois o dia fica cheio de janelas. Elizabeth M.B. Mattos – Porto Alegre – 2012
E com o passar dos anos esqueceu de dizer q as mulheres principalmente se tornam invisiveis para os olhares masculinos e ate aos femininos tbm….isso no comeco incomoda, depois se acomoda…..
Será? As pessoas não ficaram invisíveis aos olhares, não. Os olhares é que deixaram de olhar … Não só para as mulheres, ou das mulheres, ou dos homens … Acho/ penso que desapareceu este tempo / tempo tempo para olhar, ver passar … Nem mesmo para ler! Ou pensar … Quem está na janela vendo o tempo passar? Chico Buarque? As pessoas perdem tempo ao espelho … O Império da BELEZA é exigente. E as meninas todas se parecem, e os jovens todos se parecem, e os velhos, os velhos que agora vivem mais se esquecem de ser velhos … Não há doçura em nenhum olhar.