Li e reli várias vezes teu bilhete: lembrança, afazer, trabalho, distância, e uma remota saudade do jovem sonhador que passou voando por Porto Alegre, rumo ao futuro. O amigo americano.
Agregou o gosto pelo superlativo, o possível impossível da nação americana. Inteligência potencializada: natural que nosso entendimento, emoções se desencontrem… , no entanto, meu amigo, estamos presentes no imaginário juvenil um do outro. Sabemos pouco, assim mesmo, histórias enfeitam o caderno da memória. Basta. Explicações não aproximam, nem afastam. Equívocos deslumbrados… Lembrei-me da coleção de sapatos da tua namorada brasileira. E do impossível daquela relação em curso. A vida é assim sinuosa, surpreendente. Pecados mansos cometidos em nome do prazeroso agora.
Escolheste nova identidade com o melhor em arte, morada, qualidade, diversão. Transitas pela beleza narcisa, sabes bem disso. Mulheres bonitas, casas sofisticadas, carros, atores e atrizes a bordejarem refletidos nos teus olhos. Bonito, consciente e lúcido.
Não sofras. O espetáculo tem bastidores: cordas, celofane, lâmpadas de projeção, cenários de papel. Doença, amarras, e solidão.
O que mais importa das cartas, das conversas entre amigos, entre nós dois? A juventude, a memória, e estarmos, assim, plantados um na vida do outro. Também sinto saudade dos envelopes azuis e brancos que chegavam da Província de Buenos Aires, dos sonhos americanos, do que poderia ter sido… Acabei num exílio diferente do teu. O meu tem contorno e limite palpável. Na verdade, nunca sai de dentro de mim mesma, ao contrário de ti que rasgaste o céu, a terra, outra cidadania…