no espelho

Não consigo te tocar porque não lês o que escrevo. Já não importa. Conto/vivo/entendo o tempo como um dia após o outro. …, antes eu queria ser etérea espírito, palavra / escrita e me escondia. Palavra reinventa menospreza a imagem. Ninguém deveria ter rosto, mas apenas ser. Agora quero/desejo ser pessoa / gente de carne e osso. Tão tarde! E me surpreendo com a transparência, o invisível. Estou naquele tempo de agarrar/retomar a memória. Segurar/agarrar o vento e engolir aos poucos o sabor da palavra. A indiferença de uma pessoa se espatifa na memória, e nem um gole de café resolve. No caminho de buscar sei do limite, da indiferença sem memória. Temos que nos prender uns aos outros, ou deixar passar … E pensar com Orhan Pamuk, ainda nO Livro Negro. “Se me der seu endereço […] vou explicar […] impossível ficar irremediavelmente só, porque mesmo em nossos momentos de maior solidão temos a companhia das mulheres com que sonhamos acordados; e não só isso, as mulheres das nossas fantasias conseguem de algum modo ler nossos pensamentos, de maneira que sempre dão um jeito de estar à nossa espera, nos procuram, e ás vezes, até nos encontram. Se você me der o seu endereço, vou lembrar– lhe de todas as coisas de que se esqueceu, pois, o Céu e o Inferno que você viveu e sonhou […] (p.412)

Também idealizo. Também vivo Céu e Inferno. Também idealizo e te penso, e te visito, espio e sinto prazer no teu corpo. E, absolutamente, sozinha. Ninguém vai chegar, ou bater ou abrir a porta, ou ligar o meu número (porque nunca atendo telefone), nunca estou em casa, embora queira / deseje/ imagine estar e receber abraço e sorriso. Nunca estou no quarto, na cozinha ou em alguma peça específica da casa. Não existo. Escondida numa imagem presa no espelho, atrás da porta. Talvez seja isso. Estou no espelho. “ -, o espelho se estilhaçou em mil pedaços, fazendo você perceber que não é por acaso que em turco, a palavra que descreve o processo que transforma um vidro em espelho é a mesma que designa ‘segredo’. […]   Ler é olhar num espelho; os que conhecem o segredo por trás do espelho são capazes de transitar para o outro lado; mas aqueles que ignoram o segredo das letras só irão descobrir neste mundo o desbotamento, a banalidade dos seus próprios rostos. ” (p.407)

Estou presa nesta banalidade. Estou amarrada nesta saudade. Converso em voz alta comigo mesma, nada substitui as nossas conversas confidentes. E não é engraçado. É patético. Quero a beleza de volta, a risada, a festa. Quero os corredores e as lajotas vermelhas. Quero ser menina e mulher aos teus olhos, sem tropeçar na barra do vestido. Elizabeth M.B. Mattos – novembro de 2018 – Torres

SOFISTICAçÂO do Rio casamento de uma ARANHA no RJ.jpg

 

 

 

 

2 comentários sobre “no espelho

  1. Somos espelho e janela… sempre… para nós e para os outros… olhamo-nos em espelhos portáteis que carregamos na alma… e também nos outros, em seus olhares e palavras… e silêncios…

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