Sempre a retocar a autobiografia, a história deles, delas, a minha. Encontrar os amados. Redefinir e acrescentar ao currículo os livros lidos, os possíveis. Ninguém quer saber de confissões arrancadas de dentro, aos pedaços. Há que ser apenas a verdade. Dos maridos infiéis ou desastrados. Das separações ou injustiças. A linha deve ser luminosa, redefinimos. Mãe inteligente, pai provedor, carinhoso e gentil. Avós presentes. Tios generosos. Irmãos atentos, prestativos, acolhedores. Sobrinhos gentis, netos encantadores. Primos e primas bem sucedidos. E um quintal, um jardim. Aquela poderosa bicicleta. Amigos, e todas as festas. Brinquedos. Música. Quero lembrar dos bailes, das aulas de francês, dos bons professores, da melhor escola de inglês. Do colégio escolhido. Dos inumeráveis amigos. Do bom lugar de viver. Ruas com jacarandás floridos, e calçadas iluminadas, brincadeiras incansáveis e noites de verão. E da beleza, naturalmente. Ao escrever as cartas aflitas na madrugada, removo a tristeza e…
Inúmeras vezes, repetidas vezes, reescrevemos o amor. Aqueles que terminaram porque se esgotaram. Os arrancados do amor porque já morreram. Os sonhados. Revisamos amigos: antigos e velhos amigos, e namoramos o novo. Aquele que não se aproxima, e está tão perto! Misterioso motivo apertado na esperança de que o presente, o dia de hoje importa mais. Nós nos iludimos e corremos, interrompemos qualquer alegria na imaginação do impossível. Somos o que não podemos. Somos eternos. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2019 – Torres