rosto / face / expressão

1.

o rosto quadrado / marcado, quase severo.

o rosto que mora em corpo desfeito / aberto / inquieto.

procura, este rosto, quando se olha.

procura no espelho a moça menina

a menina-moça retraída, ingênua, criança, esta mulher menina!

crescer no olhar doeu tanto / e segue a doer a velha criança-menina, no espelho a se olhar…

2.

tem um pedaço de pêssego /ou de maçã

tem um gosto de morango , ou talvez seja mesmo de abacaxi maduro,

escorrendo, sem vergonha,

todas as frutas presas na minha garganta, e,

e, e eu usufruo o gosto do gozo. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022- Torres

a impressora carimba, o jornalista fala

Lembram dos códices? Pois é, essa máquina pega a folhona de papel. dobra no lugar certinho, fazendo o que a gente chama de caderno, depois pega todos os cadernos, cola e costura bem bonitinho e corta. Até só colocar a capa e o livro está pronto pra todo o mundo ler, ou pra todo mundo escutar!

Tenho a sensação esquisita, uma vontade enorme de acordar o FT e a velha guarda / aqueles…e perguntar se é mesmo assim que se faz. Os jornalistas não dão a notícia, fotografam alguma coisa e se divertem na interpretação, constantes eu penso,/ eu acho, / eu imagino, ou deve ser assim, talvez , quem sabe, vamos aguardar. Bem, mós vamos todos aguardar, o temporal, a seca, os raios, os trovões, aquela voz do fundo do porão, deve dizer mesmo alguma coisa, por enquanto não escutei nada…ah! vamos aguardar! Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – Torres / bem cinzento por aqui.

conversas memória de leitura e dúvida

Afinal, não encontramos a resposta – há um vento de inverno – há uma distração e há um /o desejo de voltar ao começo: não se pode apenas seguir -, estarei cega, outra vez sem enxergar… Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – Torres (ler pode ser voar, e lá em cima, não saber voltar – ou voltar, e cair)

G.D.: Se se considera a situação atual, o poder possui forçosamente uma visão total ou global. Quero dizer que todas as formas atuais de repressão, que são múltiplas, se totalizam facilmente do ponto de vista do poder […]

M.F.:E Max e Freud talvez não sejam suficientes para nos ajudar a conhecer esta coisa tão enigmática, ao mesmo tempo visível e invisível, presente e oculta, investida em toda a parte, que se chama poder. […] Existe atualmente um grande desconhecido: quem exerce o poder? Onde o exerce? Atualmente se sabe, mais ou menos, quem explora, para onde vai o lucro, por que mãos ele passa e onde ele se reinveste, mas o poder… Sabe – se muito bem que não são os governantes que o detêm. Mas a noção de ‘classe dirigente’, nem é muito clara nem muito elaborada. ‘Dominar, ‘dirigir’, ‘governar’, ‘grupo de poder’, ‘aparelho de Estado’, etc… é todo um conjunto de noções que exige análise. […] Ninguém é, propriamente falando, seu titular; e, no entanto, ele sempre se exerce em determinada direção, com uns de um lado e outros do outro; não se sabe ao certo quem o detém; mas se sabe quem não o possui.” (p.74-75) in Microfísica do Poder Conversa entre Michel Faucault e Gilles Deleuze

luxo

ser feliz pode ser mesmo um luxo! e as escolhas? sem escolhas, apenas seguir e recomeçar! esquisito isso, recomeçar e olhar / ver / enxergar, sem ilusão, o real! Elizabeth M.B. Mattos – ainda não terminou setembro, apenas começo. Outra vida. 2022 – Torres

d e v a g a r

lento, lento…,a tarde e a noite, toda a manhã devagar: espero, não sei o que espero. ironia não saber. não posso explicar a explosão, pode ser apenas ausência. devagar. uma dor não definida se espalha, deve ser medo, ou a visão, ou o desânimo. percepção, encantos e espantos para rimar, e deixar passar, devagar… Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – Torres

Foto – Marina Pfeifer

segredinhos espalhados

tem uma beleza, uma plenitude plena / uma beleza perdida, florindo e achada no olhar da felicidade desavisada / um domingo com todo o sol que tem direito, e todas as flores que já explodiram, e toda a calidez possível….

felicidade alegria que salta da vontade; e se manifesta enfeitada com as amoras e as pitangas, aos punhados: com todas as possibilidades possíveis: os segredinhos apertados nas mãos . A vida respinga por todos os lados: predisposição / encantos e espantos… vamos festejar! Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – Torres

e preciso acompanhar os tempos

” O que era mesmo que eles queriam mandar para o diabo? A experiência. Aquela experiência pessoal, por cujo calor da terra, por cujo realismo, o Impressionismo se apaixonara há quinze anos, como se fosse uma planta miraculosa. Agora diziam que o Impressionismo era lânguido e confuso. Pediam controle da sensualidade, a síntese intelectual!

Síntese para eles seria o contrário de ceticismo, psicologia, análise e dissecação, em suma, das tendência literárias dos seus pais? Até onde se podia entender, não falavam num sentido filosófico: o que compreendiam por ‘síntese’ era antes o anseio de seus jovens ossos e músculos desejosos de movimento livre, saltar e dançar, recusando qualquer estorvo de crítica. Quando lhe servia, não hesitavam em também mandar a síntese ao diabo, junto com a análise e toda a reflexão. Então afirmavam que o espírito tinha de ser estimulado pela seiva da vida. Habitualmente eram membros de outro grupo que afirmavam isso; mas às vezes, naquele fervor, eram os mesmos.

Que palavras fantásticas usavam! Exigiam o temperamento intelectual. O estilo de pensamento rápido, que salta ao peito da vida. O cérebro do homem cósmico. O que mais ele escutara?

A reformulação do homem dentro do plano de trabalho mundial americano, através da força mecanizada.

O lirismo aliado à mais intensa dramaticidade da vida.

O tecnicismo, espírito da era da máquina.

Blériot – exclama um deles – estava naquele momento flutuando sobre o Canal da Mancha numa velocidade de cinquenta quilômetros horários! Era preciso escrever esse poema-dos-cinquenta-quilômetros, e jogar no lixo toda a literatura mofada.

Exigiam o acelerismo, o aumento máximo da velocidade das experiências de vida através da biomecânica esportiva e da precisão acrobática!

A renovação fotogênica através do cinema.

Depois, um deles dissera que o homem era um misterioso espaço interior,[…]Alguém disse que era preciso olhar para dentro da alma humana, para fixá-la em três dimensões. E alguém fez a pergunta agressiva e de muito efeito: afinal, o que era mais importante – dez mil homens famintos ou uma obra de arte?” (p.287-288) Robert Musil O Homem sem Qualidades

É preciso mesmo olhar para trás / é preciso apressar o passo para não sermos atropelados pelas vaidades pululantes e exacerbadas, é preciso atenção porque ainda existem lobos, e nossas defesas nem sempre estão atentas, e somos devorados por falta de de energia – é preciso recuar para poder dar o golpe final. Cuidado com vaidade doente porque camufla essencialidades, é preciso paciência para entender, argumentar e ampliar, dar lugar para…, ceder o espaço, não por hierarquia, mas por serenidade. Vou atropelando a história, secando as feridas, tapando os olhos, sorrindo, sem sarcasmo, abrindo espaço os reis que se coroam eles mesmo, como Napoleão! pobre Imperador! Esqueceu do inferno gelado que a Russia guardava para recebê-lo! Não é um duelo, é a própria história que define os vitoriosos. Assim, meus filhos, lutem, todos os dias, durmam durante a noite e ao acordar, estejam vigilantes. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – Torres – sábado de muito sol, muita luz, uma primavera colorida se prepara – que venha!

coisas q Flaubert pode dizer

Afinal os sentimentos são assim mesmo, exasperados, enroscados no momento – hora marcada; por mais que possa me esconder ou fingir coragem, sou absurdamente apavorada, e, medrosa e inquieta: resposta? As costas, os braços, as pernas doem, reclamam… Dúvidas e perturbações e raiva da impotência. Com certeza. Preciso chegar, mas não sei exatamente aonde, nem em qual momento eu me sentirei, outra vez, apenas alegre… Estes sentimentos importam, e a confrontação não é um bom ringue…, preciso do lugar certo para ser desafiada? Ah! do calor cálido do azul, ao cinzento gelado e conturbado! A fragilidade de ser pessoa vai se cristalizando. Elizabeth M. B. Mattos – setembro de 2022 – Torres

“Croisset, terça

17 de junho, 1856

“[…] Comportei – me como um tolo o fazer ao fazer como os outros, indo morar em Paris, querendo publicar. Vivia numa serenidade de arte perfeita quando escrevia só para mim. Agora estou cheio de dúvidas e perturbações, e estou experimentando uma coisa nova: escrever me aborrece! Sinto contra a literatura o ódio da impotência.”(p.159) Gustave Flaubert Cartas Exemplares

o feio e a beleza

A beleza se esconde na doçura e na bondade – onde a paz acalma e os olhos enxergam / veem…, Conceitos complicados, inadequados. E o feio? A injustiça é feia. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2022 – vou plantar letras arredondadas, nomes sonoros, e me embalar nas teclas do piano, nas cordas do violão, na comida feita em casa, e na alegria da primeira infância quando os primeiros passos, a primeira palavra ilumina a casa –