empurra o tempo

Loucura, loucura. Um brinquedo de rodar ou de tocar, de pensar. Inverter a loucura. Cristalizar. Nada do que era ANTES importa, ou faz sentido. Presa na ansiedade e no silêncio absoluto e inquieto do possível, estou a te pensar: teu jeito real de dizer me faz falta…Beth Mattos – maio de 2020 – Torres

Chega a ventania quente, a chuva forte vai desabar no Rio Grande do Sul. Os campos ficarão, outra vez, verdes. Deves estar preocupado! Estamos tensos, ansiosos. Sabes o que vou te pedir? Segura os anos, empurra, e estaremos outra vez em Torres.

colar do marco

infindável

mesa um linda

Escuto rádio. Gosto. Notícia e música. Logo eu me irrito. As cações deveriam ser poemas musicais, não são. Lamúrias. E eu  me pergunto, por que amar quem não nos quer? Parece apenas incoerência!  Saudade infindável. Lamento o beijo esquecido no topo da escada…
Esquisito pensar tempo. Dois anos nos dividem: anos cheios de resiliência. Acumulei palavra. Sentimento dependente, o meu, do teu. Provei tua sólida decisão. Perdi rumo e desviei devaneio. Estacionei no teu poder. “Saudável e inteligente”. Céus! Como sou frágil! Teu magnetismo se acomoda, justamente, nesta economia de voltas. És direto. Eu posso, ainda, ficar encabulada do outro lado da tela, da mesa, do travesseiro. Entrei em todos os teus devaneios e fantasias. De olhos fechados. Num prazer grandão. Minhas pequenas lembranças amorosas se espicaçaram… Rimos juntos, desvendamos o prazer pelo prazer, cheio de palavras, também com enorme silêncio e um amontoado de segredos. Claro, atravessamos as conveniências. Nunca estive tão abraçada e consciente. Vamos precisar de umas duas vidas, ou três para que eu possa passear livre pelos teus sonhos e  tu possas aprisionar os meus entre canteiros de rosas e  jasmineiros. Vou me embriagar nas tuas qualidades de fazer. Perfumada casa de alegria esta morada de amor. Pelo gramado, descalços, estaremos  exaustos e felizes. Todas as luas serão nossas. Será que uma noite nos basta?  Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2020 – Torres

assustada

Paulo Sérgio: um sonho tão bom! Encontro, ao acaso: colocaste a mão nos meus ombros como se fosse um abraço, e a doçura me envolveu. Voltei no tempo, e me senti protegida. Afinal, não vieste mesmo ao Sul.

Sonhei outro sonho: com os meninos e o genro, no perigo, em alto mar. Assustada perguntei o porquê desta estratégia de saltar, mas logo o neto se adiantou nadando, e eu vi um porto. Afogados?

Escrevo às pressas porque os sonhos vieram nítidos.Beth Mattos – maio de 2020 – Torres

utopia da vida exata (Robert Musil)

Pode ser um comportamento rude acomodar-se a uma coisa dessas, mas os meios de comunicação rápidos de hoje exigem mais vítimas do que todos os tigres da Índia juntos, e sem dúvida a inescrupulosidade, inconsequência e negligencia com que toleramos isso nos traz por outro lado sucessos inegáveis.” […]

Poderíamos dividir as atividades humanas segundo a quantidade de palavras de que precisam; quanto mais palavras, tanto pior o caráter das atividades. Todos os conhecimentos através dos quais nossa espécie passou, das roupas de pele de animais até a aviação, não ocupariam, com suas provas acabadas, mais do que uma biblioteca de bolso; mas um armário de livros do tamanho da Terra não bastaria nem de longe para conter todo o resto, sem falar naquele discussão vastíssima que não se realizou com a pena mas com espadas e correntes. É de se pensar que conduzimos muito irracionalmente nossos assuntos humanos, se não os atacamos conforme a ciência, que teve um progresso exemplar.” (p.177-178) Robert Musil O Homem Sem Qualidades

E não me perguntes porque faço a citação sem contexto, desgarrada. É uma pedra. A cada um sua leitura criando/imaginando/escrevendo um começo, um porquê, e um fim, ou nenhum sentido. Uma pedra encerra/possui a história: ela é o completo. Uma trajetória desvendável, apenas, por especialistas, filósofos ou curiosos. Ou apenas um mistério. E, sei lá, estamos assim a rolar de um lado para outro e a repetir o indizível, a julgar, a colorir e projetar cada um na sua quadra, a sua própria sombra. Da janela vejo outra janela, e novas sombras. De um passo na calçada outros tantos pelas ruas/estradas: distanciamento até do olhar. Não consigo ficar apenas silenciosa dentro de mim mesma. E ninguém imóvel. Agonia, o movimento curador. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2020

maio

Lua linda! Temperatura de amar: dia rosado amarelo como deve ser o dia, alegre, entardecer majestoso, avança. Clima convida com vida: depois de uma sesta de tarde comprida o espelho mostra mulher bonita, bonita: a beleza se avizinha ao amor. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2020 – Torres

filhos

Agitado sim. Quero aproveitar tudo. As gostosuras e as desavenças… Escavar no passado, recordar agita…, tu sabes. Acertos da memória, fogos cruzados. Cada um tem lembrança particular e diferente julgamento: reunião de família. Os pais muitas/tantas vezes se sentem culpados. As escolhas feitas determinam / desenham / forçam, e depois, soltam… Estas conversas parecem acertos de contas…  Os pais têm compromisso com os filhos: educar ou manter!  Discutimos a responsabilidade econômica dos pais sobre os filhos, por exemplo… Será para sempre a dependência? Há um momento em que a responsabilidade termina… Parece. Eu acho que estamos sempre envolvidos com os filhos… Acho que nós temos SEMPRE compromissos com os filhos, mesmo não tendo mais por lei / oficialmente.  Não podemos/conseguimos apenas usufruir um egoísta fazer quando temos condições de ajudá-los. Responsabilidades em família são permanentes. Enfim! Sei lá! Beth Mattos

 

 

 

no mercado

” – Aqui parecemos estar além das seis ondas da fome e da sede, da velhice e da mortes, do sofrimento e da ilusão – disse Shidartan – Que paz imensa!  É como se fossemos removidos incessante redemoinho da vida para o centro imóvel onde se pode respirar profundamente. Escuta, como é quieto aqui! Digo“quieto” porque exclamamos ” quieto”! quando queremos escutar e só se pode escutar onde há quietude. Pois esta nos permite ouvir tudo que não seja inteiramente mudo, de modo que o silêncio nos fala como no sonho e nós o escutamos também como se estivéssemos sonhando.”(p,23)  Thomas Mann  Cabeças Trocadas

E tudo que eu possa pensar ou dizer não faz nenhum sentido porque tudo o que sinto e o que digo é para que eu mesma possa entender.  OU será para que recebas uma palavra e te aquietes como eu faço. ( Não faço, eu me agito.) Vamos explodir em alegria quando nos encontrarmos: abraço bom. É apenas um fio André, uma mágica que Fernando e Ricardo e a Magda proporcionaram: caridade que florida esplendorosa. O silencio, mas  teremos as palavras também. Eu não não fui  cuidar do cabelo, das unhas, da boa forma para te agradar, mas faz tantos anos que te espero! Que tenhas paciência para brincar /descobrir/ fazer acontecer pequenas alegrias… Faremos um castelo. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2020 Torres

rotina empurra

Não posso parar, interromper a rotina: Ônix exige: isso ou aquilo. Posso deixar um dia de fazer a limpeza, ou a comida, ou não dobrar as roupas,  não ligar o celular, mas ela  exige intrigada, estupefata, e se movimenta: pede para caminhar/passear, ir e voltar e a comida e abrir a janela e o afago. A rotina me empurra para a música, o passo necessário, molhar as plantas e limpar. Não ligar a televisão, entrar nas nuvens. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2020 – Torres

cozinha e flor e bananas

a casa

Talvez a casa fosse do melhor tamanho, sem escadas, com aquelas porta-janelas festivas abrindo para duas fantásticas varandas e o pequeno gramado. As flores se acomodam bem ao longo do muro. E o silêncio quieto, como convém ser. No amanhecer muita piação chega dos cinamomos. Um despertar de luz pela fresta da janela. O café com leite, o pão dormido, um pouco de geleia e o dia já pergunta: Então? Vamos fazer? O quê? Isabel e a vontade inquieta de revirar o mundo.  Sem saber o motivo de tanta energia  começa a listar deveres…Beth Mattos – maio de 2020 – Torres

narrar

A loucura de voltar, ou de sentir o mesmo depois de remexer em tudo, e perder a letra e o som, a vontade. Apagar o horror, com agulha fina livra o nó, seguir a malha. Que jeito que não tenho de dizer, mas rodear…sou eu. Voltei para O Grande Sertão: Veredas que só título vai pedir explicação, mas dizer Guimarães Rosa ajuda.

Para que referir tudo no narrarjeito, por menos e menor? Aquele encontro nosso se deu sem o razoável comum, sobrefalseando, como do que só  jornal e livro é que se lê. Mesmo o que estou contando, depois é que eu pude reunir relembrando e verdadeiramente entendo – porque, enquanto coisa assim se ata, a gente sente mais é o que o corpo a próprio é: coração bem batendo.Do que o que: o real roda e põe diante. – Estas são as horas da gente.[…] Por que?Diz – que – direi ao senhor o que nem tanto é sabido: sempre que se começa a ter  amor a alguém, no ramerrão, o amor pega e cresce é porque, de certo jeito, a gente quer que isso seja, e vai, na ideia, querendo e ajudando, mas quando é destino dado , maior do que o miúdo, a gente ama interiço fatal, carecendo de querer, e é um só facear de surpresas. Amor desses cresce primeiro, brota depois. (p.186-187) 

E jeito de dizer /dito se joga e não explico. É amor  e PONTO. E o amor explicado se mistura e confunde, mas fica. É isso. Vou explicar. Beth Mattos