horas mortas

“As horas devem ser mortas. Enquanto você está esperando. As horas perfeitas são as que passo nesta máquina. Mas você tem que ter horas imperfeitas para para ter as perfeitas. Você tem que matar dez horas para que duas vivam. O que você tem que cuidar é para não matar TODAS as horas, TODOS os anos.”(p.100) Charles Bukowski  O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio LPM

Horas mortas e, … também, uma tristeza comprida. Inexplicável neste caminho.E.M.B.Mattos

artimanha

Não preciso tocar. Já és meu nesta forma imprecisa. Precisa certeira. Atravesso teu corpo. Atravessas o meu. Sedução: veneno mortal. Nem perfume nem peso nem gosto, nem tato. Silenciosa ausência amorosa,  presença constante.

Se o tempo voltasse e me despejasse no colo arrependimento dor e tristeza. Mágoa e perda, mas também encantamento alegria juvenil, ou apenas o teu amor, apenas bondade. O que eu diria se o tempo voltasse? Eu responderia: quero tudo igual, tudo igual e o mesmo, eu quero apenas mais tempo senhor tempo. Elizabeth M.B. Mattos – maio de 2018, ainda Torres.

egoísmo

Há quem diga (e também já li em alguma parte) que o mais alto amor sentido pelo próximo não passa no fundo de mero egoísmo. Não que seja bom ou ruim o egoismo. O altruísmo é destrutivo, uma bandeira  chamada desespero. No egoismo a defesa. E sempre há uma desculpa presa na ponta do fio. SE sou valente, forte e decidida …, bem só posso ser assim comigo mesma, e com minha nominada solidão. Reclusa e aberta, paradoxal. Como sou apenas eu comigo estou sempre pronta ao primeiro passo, ao único passo, a todos os passos. Na história sucessivas perdas e o constante excesso de amor derramado cego, estúpido. O espanto da covardia, e a defesa da generosidade permissiva: respeitar a vontade do outro. Quem é o outro que não está em nós? Sou o teu olhar, flexível a tua vontade. Eu me materializo na tua voz, na tua palavra, na tua vontade e na tua covardia. Sim, natural que eu me sinta esvaziada. Vou reagir. Vou soltar a ponta do fio. Aquela palavra confidencial que me deste num momento de fraqueza, a tua e a minha voz misturadas, o nosso egoismo. Agora, as cartas não tem mais endereço: colocarei a mensagem na garrafa vazia do vinho que bebi, e lançarei ao mar. Histórias de amor e desencontros, o estúpido e maléfico acaso. Fiquei dias e dias com a porta aberta para o jardim … Elizabeth M.B. Mattos – junho de 2018 – Torres

derramado despudor azul

Não me perdoo dos beijos que não dei, do corpo inteiro que não senti. Azul da imaginação. Cada vez que eu me esforço para te reter, invento, eu te perco… Tens asas no sorriso, nos teus passos. Não te esqueço. Derramado despudor deste meu amor amado, amando. Beth Mattos – maio de 2018 – Torres

 

depois talvez quem sabe, morrer de vergonha

…, pode ser aquietar e voltar. Como ainda nem consegui sair, abri outro livro de Orhan Pamuk – O Livro Negro.  Tempo de viver escondido, interrompo a leitura, eu penso. E volto. Embora desatinada, sem saber bem o motivo de voltar, volto. Que eu consiga chegar! É assim mesmo. Depois de cair e depois de esfolar joelhos e cotovelos, não desistir. Chegar. “Como gostaria de caminhar ao sol por entre os salgueiros, as acácias e as roseiras do jardim secreto protegido por muros altos em que Rüya, fechando cuidadosamente as portas atrás de si, mergulhava toda vez que adormecia serena.  Mas sentia um medo constrangido dos rostos que lá poderia encontrar: […]” (p.12) Também eu tenho medo de entrar no sonho errado. De falar com a pessoa errada. De dizer errando e equivocada. Bem! Depois, talvez, quem sabe,  morrer de vergonha! Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2018

amor e amizade

Está nos livros. Ou potencializado dentro da pessoa, ou na música, este jogo ensaiado do amor, e repetido e o único que importa. A espera de. Penso que é para sempre, para sempre… E não é. Eu quero sentar e conversar. Beber chá, café, Comer pão com geleia vermelha, e manteiga. Quero estar contigo, uma meia hora, ou duas horas. Sugestão. Vamos ler  As Brasas de Sándor Márai em voz alta, ouvindo nossas vozes. “O sentido do amor e da amizade estava todo ali. A amizade deles era séria e silenciosa como todos ali. A Amizade deles era séria e silenciosa como todos os grandes sentimentos destinados a durar uma vida inteira. E como todos os grandes sentimentos, continha certa dose de pudor e de culpa. Ninguém pode se apropriar impunemente de uma pessoa, subtraindo -a de todas as outras.” Sándor Márai

Estou respirando… Raios e chuva forte, a música. O cinzento londrino. O tempo, o meu tempo de ser e voltar: aquietar, usufruir. Tempo de absorver. Elizabeth M.B.Mattos — setembro – Torres

e namorar

“A passagem do tempo exaspera e condensa qualquer tormenta, embora no princípio não houvesse uma só nuvem minúscula no horizonte. Não sabemos o que o tempo fará de nós com suas camadas finas que se super – põem indistintas, em que é capaz de nos transformar.”(p.266)

Este tempo que Javier  Marías descreve passando eu sinto / toco / invoco desde sempre. Como criança/menina tardes infindáveis monótonas entre bonecas e o nada. Jovem/ moça a nostalgia de ser criança sem nada fazer eu me pensava/ imaginava  independente / livre. Surpreendentemente, mulher,  já era mãe, e sendo mãe, – já estou blindada, impossibilitada de avançar / voltear / recomeçar ou refazer. Não me permito, não te permites. Então, não estou / não faço / não vejo. Imagino. Invento. Escondo, depois eu te conto…

“Não sabemos o que o tempo fará de nós  […]. Avança discretamente, dia a dia e hora a hora e passo a passo envenenado, não se faz notar em seu sub – reptício labor, tão respeitoso e comedido que nunca nos dá um tranco nem um sobressalto.  Toda manhã aparece com seu semblante tranquilizador e invariável, e nos assevera o contrário do que está acontecendo: que está tudo bem e nada mudou, que tudo é como ontem – o equilíbrio de forças -, que nada se ganha e nada se perde, que nosso rosto é o mesmo e também nosso cabelo e nosso contorno, que quem nos odiava continua nos odiando, e quem  nos amava continua nos amando. E, de fato, é o exato contrário, só que nos permite avistá lo com seus traiçoeiros minutos  e seus enganadores segundos, até que chega um dia estranho, impensável, em que nada é como sempre foi: […] ” (p.266-267) Javier Marías  Os enamoramentos

Tudo tão menor, tão apertado, desolado! E agora? Como vai ser amanhã? Igual. Vou fazer café. Arrumar as camas. Ler jornais. Pensar no almoço. Acertar as contas.  Podar os galhos, colher flores e frutos.

Todas as vozes do mundo atropeladas, pausadas. Histórias risonhas,  chorosas.  E algumas tão silenciosas! Sonhos dobrados se esticam preguiçosos. Sonhados, abertos como lençóis perfumados. Arrumo as roupas extraviadas/achadas, dobro, estico. Lavo as xícaras, dois pratos, os copos preguiçosos que esperam, desmaiado ânimo. E, num desavisado momento, o espelho. Nada mais como antes. E  posso não escolher o presidente, não votar (que angústia!), nenhum político para olhar este lugar de mar e beleza e sol e tanta chuva. O tempo se arrasta. Envelheço mansa e quieta. Ou agitada. Mulher mãe avó tia irmã. Amiga rabugenta. Ansiosa, inquieta , e aqueles sentimentos todos de plenitude e completitude e enamoramento escorregam. Fico fechada nas páginas de outro livro enquanto penso Valentina João Lucas José Antônio Celso Geraldo Ana Maria Cristina Marina Guilherme Laura Jorge  Roberto Anita Tânia Suzana André Joana Luiza Lucia de luz, e Luisa e Pedro Stella Eduardo Ricardo e prima e primo, irmão e irmã, mãe e pai e tio e tia: madrinha e mar.

“Enamoramento pode suplantar o amor […]  O que é muito raro é sentir um fraco, verdadeiro fraco por alguém, que esse alguém produza em nós essa fraqueza, que nos torne fracos.”

E a vida fica / ou se explica neste enamoramento inexplicável. Nestas conexões equivocadas. Nestes blindados conceitos do que é certo ou errado porque a vida assim o determinou, e porque podemos ser apenas uma pessoa. Não posso deixar de ser eu para ser você ou nós. Uma vida, não tantas, …mas, eu acho/penso/imagino que não temos apenas um amor azul. Também temos os verdes os castanhos.  O limite. Somos apenas um. Ser muitos não podemos, há um círculo. Não podemos sair dele. Ou eu posso? Ser criança e mãe e moça e estudante e artista e operária. Não posso. Não ao mesmo tempo. Quero sair do borralho, dormir no sótão, conhecer o porão e dançar no baile com o príncipe. Claro, deixar um sapato de cristal  ao descer as escadas do palácio. E depois, rolar, rolar no gramado, sentir o sol, e o sal. Fazer amor no teu amor. Elizabeth M.B. Mattos – setembro de 2018 – Torres

desordem mesa preta tudo

Consegui escutar o mar: o silêncio da noite o trouxe para perto.

eu

Eu me perco…, estranho abraço proibido. Falta indefinida, contida e grande. Não sei …, um desejo sem desenho. Se eu nunca soubesse! Se não tivesses dito nem pensado!

Gosto do cheiro destes jasmins escabelados, castigados pelo vento … Perfumados. Elizabeth M.B.Mattos – setembro de 2018 – uma tristeza pequena, bem pequena.

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cheiro de terra

Cansada e a cabeça se agita inquieta: vou tentar dormir. Bom que a chuva veio forte cheia de trovões e vozes e … este jeito de cair  tão audível fica visível e me acalma, ou  conta estórias. Como criança sei que não posso sair nem fazer. Estou segura atrás do vidro. A chuva derrubou o calor. Que venham as pitangas, porque as amoreiras estão carregadas e coloridas naquela transição do verde vermelho e pretas : e os galhos se sacodem ao gosto das pessoas. Uma festa movimentada, e agora a chuva. Tudo mais verde. Elizabeth M.B.Mattos – setembro de 2018 – o cheiro da terra molhada já  perfuma o apartamento.