A leitura pesou. Engasguei. Não gostei da italiana… Num momento, o texto, o jeito de dizer agradou, depois o tema, nem sei dizer agora, a forma como se agarrou a descrever e a fazer sofrer! Não gostei da Elena Ferrante.
Mês: agosto 2019
o mínimo
bolsa vermelha
O luxo escandaliza. Vertiginosa corrida. Não penso. Nem perco tempo. Esqueço o estar ou não estar. Tenho.
Vestígio evidente: sou planta, enraizada. Terreno difere / altera floração, perfume. Dar ou não dar frutos? Detalhe. Sem terra vou morrer, devagar, todos os dias um pouquinho. Murcho. Cuidar importa. Podar alimentar e pacientar, nunca descuidar. O fruto pode ser o prazer máximo: sou eu e me recolho / ou encolho, sinto. Gosto de maçã, bergamotas, pêssegos e tâmaras, bergamotas, bananas, maracujás. Gosto do movimento inquieto do vento, do sol a secar e colorir. Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2019 – Torres: brilho cinzento do inverno e o frio atravessa o vidro.

Fora do Corpo
FORA DO CORPO: fragmento
Tenho aquela ideia de que todos estão perfeitamente perfeitos nos lugares onde estão: alimentados, sem sono, aquecidos, sorrindo. Não quero ser necessária, quero ser transparente, mas no fundo, lá dentro a questão é mais séria: gostaria de poder me enxergar no centro, mas não sou o eixo, sou o galho que começa a vergar porque não consigo seguir o fluxo. Perde-se o hábito de querer o amor. Desisto de desistir para desviar, terminar para encontrar, recomeçar, a solidão chega como o fim do papel, com a ponta do lápis quebrada, o livro com ponto final, o copo vazio. A solidão pesa com o próprio peso do corpo. Fica tudo invertido. Nem um cálice de vinho, depois outro, pode resolver. Nem o banho de mar, nem o sol. Nem ressuscitar o amigo, a coragem, nada modifica este estranho vazio. Elizabeth M.B. Mattos – 2012 – Torres
MAGDA FRANCIOSI – “E com o passar dos anos esquece de dizer que as mulheres, principalmente, se tornam invisíveis para os olhares masculinos e até aos femininos também… Isso no começo, incomoda, depois se acomoda…”
Eu: – Será? As pessoas não ficaram invisíveis aos olhares, não. Os olhares, cansados, deixaram/esqueceram de se olhar, não só para as mulheres, ou das mulheres, ou dos homens… Acho / penso que desapareceu este tempo / tempo de parar no olhar, ver passar. Nem mesmo para ler! Ou pensar. Quem está na janela vendo o tempo passar? Chico Buarque? As pessoas perdem tempo ao espelho… O Império da BELEZA é exigente. E as meninas todas se parecem, e os jovens todos se parecem, e os velhos, os velhos que agora vivem mais se esquecem de ser velhos. Não há doçura em nenhum olhar. E.M.B. Mattos
maio 2016 – Paulo Hecker Filho
A XÍCARA
“ Segure a xícara, que eu não estou me sentindo bem. ” Últimas palavras de Mário de Andrade
Vivo não te encontrei, mas foi em ti que mais eu dei por mim no livro brasileiro. As tuas opções me anteciparam, ouvi tua fala como se a soubesse, elegi tua razão como juiz. Não importa se fui digno, eu quis.
Do esforço e da alegria de estar vivo, do amor que os dois tivemos pelo mundo e o resgate do mundo pela arte, da recusa do erro e da injustiça, da dor pela miséria brasileira, minha mão se estende e pega a tua xícara.
CÉU LÚCIDO
Viver é chegar ao céu. O resto é esperar por ele. E nunca vem, nos aguarda. Não é fácil dar com a meta de tudo o que viveu, saber porque se nasceu. Aponto o céu na amizade, mas isso às vezes não passa de outro grito de socorro. Hoje, particularmente, entrei no céu mais à mão com dois artigos inéditos do nosso Mário de Andrade. Paulo Hecker Filho
Poemas se somam prazerosos, ganchos em ganchos. Correntes sustentam o pensamento do poeta, do escritor. Conversa que não termina. Água que salva. Alívio! Livro nas mãos. Minha memória. Beth Mattos
“coisas” de 2009
“Escrever já é um desvio favorável ao esconderijo” escreve Patrícia Galvão. Também penoso, difícil, perigoso! Palavra deslocada, desfocada.
Pelas janelas abertas a Lagoa do Violão cheia de luz. Chuva miúda. Antes, e depois da descoberta? Referência esquecida. A história antes, e depois, agora tua presença escondida, mas não imaginas o quanto te quero, penso!
O que verdadeiramente importa? Afetos. Mesmo escondidos, apenas eles importam. Chorar importa. A alma se esvazia na lágrima. Escorre dor, e medo. A chuva continua. ElizaBETH M.B. Mattos – 13/05/2009 00:32 – Porto Alegre –
depois: MEMÓRIA (29/04/2009)
Música recupera sentimento. A alma segue a luz da melodia. No silêncio, escuto com o olhar… A memória agarrou uma xícara, este livro, aquela cadeira, depois a tela com tintas escorridas de Jean Lehmens. A carta, este caderno. A caixa das fitas, as pérolas descascadas. O bule branco. Objetos. Não sinto o cheiro dos eucaliptos, nem das magnólias. Dos jasmins. Esqueci o jardim dos jacarandás. Vou construindo a memória com fitas, vidros, caixas, cartões e fotos. Guardados escondidos no porão. Elas caminham, estas coisas. Não ficam a espera… Elizabet M.B. Mattos – agosto de 2019 – revendo/mergulhando nos velhos textos, talvez já enfiados no Amoras, não sei mais. O que aconteceu / o que era / como foi, não sei. E a pensar! Tudo muito igual! Os círculos, as dúvidas, e as completas e perfeitas certezas estão amarradas neste hoje: estás às voltas das panelas, gostas de cozinhar / inventar. A vida é assim mesmo, invenção, e o mesmo. Roubar a namorada, faz parte! Encontrar um amor também. Elizabeth M.B. Mattos outra vez
aventura suficiente
Dia de vento e chuva. Tranca-se a porta, fecha-se a janela. Abre-se ao sol, ao suor. As horas gargalham, acham graça delas mesmas. Os fenômenos exageram nos ventos furiosos. Granito. Destelham, afogam, e hoje, o dito tempo, se abre ensolarado, irônico. O mundo gigante de nuvens como me contou a pequena: enormes, entre cores, brancas, brancas, e o preto, o azul, azul… Ausência e presença. O livro é igual. Qual é a guerra mais eficiente? A cada boa linha, ideia, nova suspeita. Debate intenso que nos violenta. Acorda. Esmurra. Entristece, não vitaliza. Adormeço. O Jantar Herman Koch: incompreensível como o dia. Como a insistência de correr, de parar, de estar perto e longe. Amar um dia, desprezar no outro. Apaixonar-se pela luz de um olhar, modificar-se, apaziguar-se. Adoecer. Adoecer porque dói a dor de não ser tudo. Ser inteiro! Não o mundo está ao contrário, ao teu contrário, ao teu avesso. Vamos costurar estes livros. Lançamentos perdidos, esgotados, uns sobre os outros, a se contradizerem! Guerra de futilidades, de exigências, cicatrizes, internas. E risadas de escárnio! Bolsos recheados de injúrias! Afirmar o que sou assim, aquilo, exijo isso ou aquilo? Não leiam O Jantar de Herman Koch. Aliás! Parem de ler! Não leiam nada, olhem as fotos. As fotos. Ou fiquem apenas olhando, pela janela, o tempo acaba passando mesmo. E olhar já é aventura suficiente. Elizabeth M.B. Mattos – agosto de 2019 – Torres texto escrito em Porto Alegre, retomo, o mesmo. O livro se perdeu. Quero reler. Escrever e ler. Obsessão!
amorosidade generosa
Mundo e vida, revoada boa. Dia azul. O frio gelado, beira mar no arvoredo verde da lagoa: maresia gaúcha. Chocolates Praliné depuis 1845 presente festivo / delicado / mimoso. Amorosidade generosa da amiga. Tanto a dizer e a lembrar como rosário: pérola, cristal, ametistas redondas. Perfeito: “ajuntamento das palavras por quem sabe conduzir por meandros mal-acostumados…” E eu já fico a pensar que acostumar dizer e saborear tem gosto de agora no gosto doce chocolate do chocolate. Penso vinho e revoadas. Sinto o gosto gasoso da água. Escorrego feliz… Deixo sentada, na melhor poltrona, aquela angustia aflita de ontem! Sigo limpando os livros e revirando o passado, gostando deste hoje ventoso. Elizabeth M. B. Mattos – agosto de 2019 – Torres
LINÉIA no Jardim de Monet : Texto de Christina Bjõrk – Ilustrações de Lena Anderson e Tradução de Ana Maria Machado

Aqui te amo
[…] “Às vezes amanheço e minha alma está úmida.
Soa, ressoa o mar distante.
Isto é um porto.
Aqui eu te amo.
Aqui eu te amo e em vão te oculta o horizonte.
Estou a amar – te ainda entre estas frias coisas.
Às vezes vão meus beijos nesses pesados barcos
que correm pelo mar rumo a onde não chegam”(p.59)

Pablo Neruda 20 POEMAS de AMOR e Uma canção desesperada / om texto original e a tradução de Domingos Carvalho da Silva e ilustrações de CARIBÉ
A veces amanezco, y hasta mi alma está húmeda.
Suena, resuena el mar lejano.
Este es un puerto.
Aquí te amo.
Aquí te amo y en vano te oculta el horizonte.
Te estoy amando aún entre estas frías cosas.
A veces van mis besos em essos barcos graves,
que corren por el mar hacia donde no llegan.
