verão de excesso

Madrugada silenciosa e completa. Não, não completo o silêncio, a geladeira resmunga. Cães latem, vozes na calçada. A chuva refresca verão, outono.  Excesso! Luz calor chuva e sombra. Frio, também faz frio. E o cinzento. A luz se esconde. Ah! Poderia ser apenas isso: longo esticado e lento começo de tudo. A cada estímulo uma linha.  E dizer que desde sempre eu me preparo para escrever! Uma palavra ideia inteira. Um olhar, uma história. E agora, agora travado. Interrompo. O fato se esconde / se confunde.  E logo dia, ou o telefone toca, ou a voz chega, ou a urgência aparece e o fio desaparece. Agora, hoje, neste momento, ano, dia, mês: o futuro, o amanhã, o depois, ou … sei lá se existe depois! Se vou mesmo nascer outra vez para viver tudo azul. Perco hora, tarde  a pensar. O começo não importa, já terminou… Não quero. Desejo. Eu me entrego todas as manhãs a tua fantasia. 

Ler jogar explicar repetir, voltar… E me parece inútil escrever, ou contar. Vidas iguais. Muito,muito muito, apenas, o jeito de dizer a mesma coisa.

Gostar apaixonar desaparece no amor de amar. Ansioso beijo. O de sempre. Na boca da palavra.  Se repito se penso,  eu me entrego. Toda e qualquer lembrança…, ah!, mentirosa atormentada e fantasiada. Escandalosamente recriada. Sentimento descolado, remendado, e posto ali na vitrine, na vontade. Eu me apaixono, perco a medida. Louca! De magia, de feitiço no círculo. Por um momento imóvel quieta a sentir. A querer apenas o corpo… Herói erótico. Responde, por favor. Dedos pernas pescoço olhos cabelos e braços se farão abraço. E nada, nada vai ser dito explicado pensado, repetido: um enorme silêncio. Eliza /Elisa Liza/Lisa Beth Elizabeth M.B.Mattos –  Torres janeiro 2018 livros mulheres

 

 

livros

…, não sei explicar a leitura, a cada parágrafo, …bem, uma revirada. Avanço meio cega, em choque, ou feliz, ou insatisfeita. Termino a página. Guardo o livro, volto.  …, o estranho são as pausas, os textos transcritos, sublinhados. Alguma coisa volta, ou surpreende. Nada vai me surpreender, eu digo. Philip Roth trava, ainda não consegui terminar O teatro de Sabbath: engasgo. Herman Hesse doçura, enfim, sentimentos se alternam…  Estou no quarto volume dO Quarteto de Alexandria. Amor paixão envolvimento namoro sonho, desejo se mistura. Na pele lembrança. Guardo, apalpo, salta de uma memória para outra memória, se renova. E tanto e muito, e fica tudo lembrança. E o novo? O que posso fazer com o agora…  Medo, terror do amor. A leitura perturba. De repente não é mais… O que foi se transforma.  Certeza de que ainda é apenas enquanto é /sendo / em tempo… Não se pode deixar de ver/estar/alimentar. Morre, e se transforma termina… Vira prisão horror, ou será que não foi? Um frio passa pela espinha. A leitura paralisa.  Elizabeth M. B. Mattos – janeiro 2018

A imagem outrora magnífica do meu amor repousava na curva do meu braço, indefesa como um paciente na mesa de operação. Mal respirava, não adiantava nem repetir seu nome; um nome que antigamente evocava uma magia intensa, capaz de congelar o sangue em minhas veias. Tornara -se, enfim, uma mulher. Asquerosa e gasta, deitada, como um pássaro morto na sarjeta, mãos em forma de garra. Um enorme portão de ferro parecia ter se fechado para sempre em meu coração. Mal conseguia esperar que a vagarosa aurora me libertasse. Mal podia esperar para não estar mais ali.” (p.51) Lawrence DurrellClea – O Quarteto de Alexandria

seu retorno

Seu retorno deixou-me um tanto perturbada:   desfiz -me em vários pedaços e ainda não consegui recobrar todos eles. Confesso que estou desconcertada. Vivi tanto tempo com você em minha imaginação  –   é um lugar solitário  –  que agora creio ser preciso reinventá -lo para  trazê – lo de volta à vida. Talvez eu tenha passado todos esses anos deformando você, pintando seu retrato para mim mesma. Talvez agora você seja apenas uma invenção  minha, e não um dignatário de carne e osso, que circula entre pessoas, luzes e políticas. Ainda não reuni coragem suficiente para confrontar a verdade com a realidade; tenho medo. Tenha paciência com esta mulher boba e teimosa, que parece nunca saber o que deseja. É claro, deveríamos ter nos encontrado há muito tempo,  –  mas eu fugi como um animal assustado. Quando soube que você vinha, fiquei tão irritada que chorei de puro ódio. Ou teria sido pânico? Creio que realmente consegui esquecer – me de … meu próprio rosto, no decorrer de tantos anos. Agora ele voltou  de repente para me assombrar, como o homem de máscara de ferro. Bah! Logo minha coragem voltará, acredite. Mais cedo ou mais tarde precisaremos nos ver e sofrer o golpe desse encontro. Quando? Ainda não sei. Não sei.” (p.124) Lawewnce Durrell – Mountolive – Quarteto de Alexandriasofá ótima

longa

Oficina Francisco Brennand 2017 / Recife / Pernambuco

FALANDO no restaurante

1.

despedida  sombria, ou triste = envelhecer

p r o  longa  d a

Prolongada pausa. Tem ponto, ou asas, ou desvio, ….

Esperançamos, tu e eu = eu e tu, nós.

2.

Agarra minha mão, sou eu sorrindo / sou eu,  … tenho pressa. Esta lágrima escorrega, molha… Está frio neste verão.

3.

Escrevo penso, penso: eu eu eu tu tu tu você você  nós você que veio ao meu encontro, ou fui eu que me lancei nos teus braço, abraços, beijos, sem pejo?

Mar, areia, céu:  lista de amar o amor que nos ama : abraçar apertar aquietar, ou consolar. …

Envelheço, –  m  a  i  s  vagar devagar divagando … Envelheço inquieta …, e te peço amigo amor amado: segura minha mão, não consigo ver nada. Então, tu me abraças. Elizabeth M.B. Mattos – janeiro 2018 –

Sou eu a menina no jardim da casa Vitor Hugo, 229 e, a moça Joaquina, morava conosco em Petrópolis.

Joaquina e eu pequena

perdi

Perdi e encontrei os óculos, isso me alegrou tanto e tanto! Um dia que tudo deu / dá certo / ou fiz certo, inclusive conversei uma hora com minha irmã. Estive com a Ana.  Abri o livro de Durrell e leio: “As curvas e tangentes vagarosas do rio castanho jaziam lá embaixo, pontilhadas de pequenas embarcações. Estuários vazios e bancos de areia – as regiões desabitadas do interior, onde peixes e aves se reúnem em segredo. […] – a leveza das palmeiras deixando marcas sobre a paisagem plana e exaurida, com sua atmosfera sufocante, suas miragens, seus silêncios úmidos. Quadrados de terrenos cultivados à custa de muito esforço deixavam o cenário parecido com cobertor gasto de tecido xadrez; alternavam -se com segmentos de pântanos betuminosos abraçados pelos contornos lentos da água castanha. Aqui e acolá viam-se também  as marcas rosadas do calcário.”(p.112) Mountolive – Quarteto de Alexandria Lawrence.Durrell

Cada palavra, cada silêncio úmido, reuniões em segredo, curvas tangentes e vagarosas do rio castanho, – prazer! Merecemos o perfeito. Tormento assistir televisão! Vale um bom texto. A completa alienação. Afinal encontrei os óculos perdidos. Fiz as compras, fui ao banco, emagreci um quilo: ótimo! Sou feliz, sou comprometida. Então agradeço. Viver é bom. Amanhã um dia mais rosado, ou mais azul. Elizabeth M.B. Mattos – janeiro de 2018 – Torres -, e o João está no Japão. Lucas em Recife, e eu no mar.

tu eu você e nós

Da ilha ao farol. Chuva pesada trovoando. Sem ansiedade em silenciosa manhã. Preguiça no corpo. Presa, amarrada, e tanta agitação na despedida. Não sei se volto, é preciso, teu sorriso afirmou: ‘descansa cuida e te aquieta’. Sol no corpo, tua presença. Antes do agora eu te escrevo para dizer da falta que sinto deste tu e eu, nós dois. Apego ao vazio povoado / avoado, tu sabes. Fico a pensar que este encontro / desencontro pode ser o que melhor nos acontece no entardecer envelhecido. Eu me demoro no espelho. Rugas na testa, nos olhos, em cima da boca: um mapa. É a vida. Corpo abraçado na vontade empurrada enlaçada que resguarda o sonho. Silêncio na ausência que se pensa amor. E, palavra, rabisco que se imagina sentimento. Tu e tu, tantas vezes nós. Você e você, eu, outra vez nós.  Experiência azul verde rosada amarela e violeta. Experiência do corpo com memória. A lembrança flutua. Imagem que volta… Nós: a pensar um no outro, tu sabes, eu sei. Somos azuis. Elizabeth M.B. Mattos que se quer floresta.  Liza no bosque, ou no mar…, sim, no mar. Elizabeth M. B.  Mattos – janeiro de 2018 – Torres

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…,vou contigo no espanto.

se eu pudesse

se eu pudesse estaria do outro lado

se eu pudesse seria nuvem;

se eu pudesse estaria no Japão

se eu pudesse seria magra magra, magérrima,

e o neto me levaria nas costas (ou na mala).

Creio que para o artista, assim como para o público, arte é uma coisa que não existe; ela existe apenas para os críticos e para quem é dominado pelo cérebro anterior. Artistas e público são como sismógrafos, limitam-se a registrar uma descarga eletromagnética que não pode ser racionalizada. Tudo o que sabemos é que alguma transmissão acontece, verdadeira ou falsa, bem ou malsucedida, ao sabor do acaso. Não adianta tentar decompor e analisar seus elementos – não se chega a lugar nenhum. (Suspeito de que essa abordagem da arte é comum àqueles que são incapazes de render-se a ela!) Um paradoxo. Enfim.” (p.89)  Lawrence Durrell Mountolive terceiro volume do Quarteto de Alexandria

E.M.B.Mattos – janeiro 2018

cerejeirassssssssssssssssssssssssssssssssslindas

Foto:  Japão 2018 Julho in Yugawara – Nanique Kok  Instagram: naniinnihon

 

 

 

palavra não substitue vida

Fantasmas existem. Os mortos voltam, e os vivos não entendem nada. E, se queixam escorregam, …enquanto lotam aviões trens e barcos. E cansam em reuniões! … e, são felizes! Este mundo segue, não estou nele.

Pensando no vazio deste dia: …,  uma certa angustia  transborda (inexplicável): com que olhos diferentes vejo a vida aos dez anos, aos vinte, aos trita, aos setenta anos!  O solitário tem consciência dessa metamorfose psicológica. Causa admiração a necessidade de esconder tristeza esquecer sofrimento doença  e a morte. Sufocar queixas. Esquecer ontem. Passar um pincel por cima das tintas daquele quadro, e pintar outro sol outra ventura, … estranho! Como esconder em poucas horas o sentimento dolorido de tanto tempo? Nada substitui a perda, nem  o novo agora / ou novo encontro.  Ilusão, não verdade … Palavras não substituem vida. Sou eu exatamente eu na fantasia. Amanhã quero amanhecer silenciosa, inteira. Não tenho nada para dizer. Estou cansada. Amanhã vou contar histórias. Elizabeth M.B. Mattos – janeiro de 2018 –

 

felicidade

muro na lagoa

Entrega sem volta nem resposta ou pergunta: aos poucos, com vagar, lento e constante a vida dentro do outro. Amálgamas alimentam  velhos amores, e doces esperas. Sonho acorda o passado: voz sorriso, … há qualquer coisa de trágico na separação, e na desejada liberdade. Uma espera constante. Um depois para depois, e o tempo da espera se esgota. É preciso preencher a ruptura. Reconhecer premência. Nesta madrugada sinto um vazio maior. Sem socorro. Uma vontade de parar …

Não se pode improvisar a felicidade. É preciso esperar, ficar de tocaia, como se ela fosse uma codorna ou uma garota de asas cansadas. Entre a arte e o ofício está posto um abismo.” (p.55)  Lawrence Durrell Monuntolivre – 3 volume – Quarteto de Alexandria